Mais de três anos se passaram desde que Milão sediou a Exposição Mundial de 2015 – a extravagância que durou seis meses, gerou mais de vinte milhões de visitantes, inquéritos de denúncia de corrupção e gastos que bateram em dois bilhões de euros (ou mais). Mas será que valeu a pena? Além de repaginar a infraestrutura, a Prefeitura usou o evento para posicionar a cidade como porta de entrada da Itália, um destino que vai além da moda, do design e dos negócios. Quem a visita hoje encontra canais limpos, monumentos restaurados e uma infinidade de projetos nas zonas industriais periféricas, que ampliaram seu perímetro urbano. Arte e design continuam sendo os grandes atrativos da segunda cidade italiana, mas agora o passe ilimitado do transporte público talvez seja um investimento mais inteligente do que um par de sapatos de grife.
Sexta, 16h00
Começando pela arte
A Fondazione Prada, prédio de cinco andares recoberto de folhas de ouro, dá as boas-vindas aos visitantes do novo complexo de artes, tão chamativo pelas mostras de categoria internacional que realiza como pela arquitetura dramática. A inauguração, no ano passado, de uma torre de nove andares marcou a conclusão da obra – uma antiga destilaria reprojetada pela OMA, firma de arquitetura de que Rem Koolhaas é um dos sócios. Vale a pena explorar as obras de larga escala – as tulipas de Jeff Koons, o Bel Airs brilhante de Walter De Maria, as moscas pretas perturbadoras de Damien Hirst –, além das mostras temporárias, incluindo a instalação multimídia dos artistas norte-americanos Lizzie Fitch e Ryan Trecartin (até cinco de agosto). Até o café, chamado Bar Luce, vale uma espiada, se não pelo menos pela decoração em estilo retrô do diretor Wes Anderson, que inclui detalhes peculiares como o pebolim no tema Steve Zissou. Ingresso a 15 euros, ou US$16,70.
18h30
Aperitivo alternativo
A hora do aperitivo é o momento de estimular (mas não saciar) o apetite antes do jantar. Para provar a versão pouco convencional dessa tradição, vá ao Birrificio Italiano Milano, primeiro bar de uma microcervejaria prestigiada, inaugurada em 2017, com bela decoração e uma dúzia de opções nas torneiras. Experimente a Flos Alba, sour wheat envelhecida em barril, combinada com cicchetti (tapas venezianas) como os brioches minúsculos recheados de mortadela. Se preferir, engrosse a muvuca do Lacerba – bar que incorpora o Futurismo, movimento que ganhou espaço na Itália no início do século XX, na decoração audaciosa, com pôsteres antigos de Campari cobrindo as paredes, miniaturas de ônibus e minigarrafas de bebida pendurados no teto –, para provar coquetéis criativos como o Spicy Negroni (mescal, Campari, gim, vermute e bitter de pimenta habanero a 9 euros).
20h00
Trocando em miúdos
Bucho, carne de cavalo, escargot, baço e tutano grelhado raspado do osso: essa é a fórmula do sucesso do Trippa, uma trattoria extraordinária inaugurada em 2015. Os garçons, simpáticos, fazem sugestões das especialidades da casa, como bucho frito – crocante, generosamente salgado e polvilhado com alecrim fresco –, mas outros destaques incluem o steak tartare piemontês, de lascas grossas, e o tortelli recheado de abóbora. Faça reserva on-line para garantir uma mesa no salão, cujas paredes amarelas e mobília de madeira escura dão um clima sóbrio e acolhedor. O jantar para duas pessoas sai por volta de 80 euros.
22h00
Noite cultural
Vale conferir a música ao vivo que, nos meses mais quentes, ocupa o pátio interno e vai desde jam sessions de jazz e hip-hop italiano até apresentações de música e prosa teatral conhecidas como "teatro-canzone".
Encerre a noite na Zona Tortona, uma antiga área industrial onde as fábricas em ruínas foram apropriadas pelos milaneses mais criativos. À noite, o público se reúne no Base, complexo cultural multifuncional, inaugurado em 2016, com galerias de arte, espaços de coworking, programa de residência de artistas, espaços para apresentações e eventos de arte, música e cinema. Vale conferir a música ao vivo que, nos meses mais quentes, ocupa o pátio interno e vai desde jam sessions de jazz e hip-hop italiano até apresentações de música e prosa teatral conhecidas como "teatro-canzone".
Sábado, 10h00
Manhã no museu
O que não falta em Milão são museus excelentes, dede a Pinacoteca di Brera ao Triennale Design Museum, e as opções culturais não param de crescer. O Museo delle Culture, ou Mudec, inaugurado em 2015 em outro complexo industrial da Zona Tortona, foi reprojetado pelo britânico David Chipperfield. Lá dentro, exposições temporárias sobre os mais variados temas – arte maori, Miró, Barbie e Banksy – exploram a intersecção de arte, história e cultura. Suba a escadaria de pedra escura para chegar ao átrio iluminado do segundo andar e explorar a mostra "Storie in Movimento", sobre as experiências de peruanos em Milão e italianos no Peru (até 14 de julho; 14 euros).
13h00
Almoço no Posti
A história do inovador 28 Posti começa com os presos de uma penitenciária próxima, que fizeram à mão os armários e as mesas de madeira. Esse bistrô socialmente consciente é também digno de nota pelos vinhos naturais excelentes que oferece e a cozinha criativa de Marco Ambrosino, um chef jovem de Procida. No almoço, acomode-se em um dos 28 lugares disponíveis para saborear um menu degustação surpresa de três pratos (35 euros) que, quando estive lá, incluiu bolinhas de abobrinha em caldo de orzo; nabo em formato de flor com ervas aromáticas e trufa negra; uma nova versão da pizza turca, com recheio de miúdos e carne de cordeiro sob o pão grelhado e polvilhado com estragão.
15h00
Momento histórico
O tour pelo centro histórico pode até começar na Piazza del Duomo, mas não deve terminar lá. Siga para oeste, rumo a Cinque Vie, um cruzamento de cinco ruas desde os tempos romanos, para explorar o labirinto de vielas sinuosas e labirínticas que parecem mais florentinas que milanesas. O bairro, que já abrigou ateliês de artesãos e artífices, recentemente evoluiu para se tornar um núcleo de pequenas galerias, ateliês de estilistas e boutiques independentes. Um que vale a pena conferir é a Wait and See, loja exuberante de Uberta Zambeletti, stylist com queda para grifes desconhecidas e tecidos coloridos – de casacos de pele falsa rosa-choque a saias de lantejoulas em tons do arco-íris, passando por uma calça de estampa de onça brilhante.
17h30
Decoração dramática
Mesmo quem não conhece Parisi e Ponti vai ficar impressionado com o showroom de decoração Nilufar Depot. A intenção de Nina Yashar – antes de ser uma galerista famosa e comerciante de móveis – era usar o espaço industrial para armazenamento, mas hoje ele abriga uma coleção digna de museu de raridades dos anos 50 e 60 e tesouros contemporâneos. Em um átrio dramático, cercado por três níveis de sacadas de aço preto, a mobília se revela disposta cuidadosamente, como nas poltronas impecáveis de Paolo Buffa, dos anos 50, as luminárias modernas de cobre de Simone Fanciullacci, as mesas forradas de veludo e as peças de madeira brasileira rara da arquiteta modernista Lina Bo Bardi.
20h00
Jantar e dança
Nem tudo em Milão é descolado e chique; a prova é La Balera dell'Ortica, um salão de baile imenso no extremo leste da cidade e que atrai um grande público por unir jantar, baile e jogo de bocha. O clima de camaradagem e a refeição – três pratos mais sobremesa, vinho e água por 25 euros – são resquício dos festivais rurais conhecidos como "sagre". Vá esperando cortinas de veludo vermelho bem kitsch, globo estroboscópio de neon e mesas comunais longas que lotam rapidamente com famílias multigeracionais, aniversariantes e casais de todas as idades. Não demora para a banda começar com o "Volare, oh oh", que leva os hipsters e os aposentados a disputar espaço nas quadras de bocha adjacentes. Não tente resistir à melodia da "ballo liscio" que, no verão, atrai os casais para a pista de dança externa.
23h30
Diversão na orla
Para tomar a saideira em Navigli não é preciso fazer a maratona pelos bares e cafés lotados que se encontram às margens dos canais históricos; a uma quadra do buchicho fica o Iter, um bar de coquetéis tranquilo que se reinventa a cada seis meses com decoração e drinques inspirados nas viagens da equipe de funcionários pelo mundo. O destino mais recente foi o Panamá – basta observar os chapéus na parede – e, para combinar, nada como um coquetel refrescante e frutado como o Sipu (gim, milho roxo, abacaxi e limão; 8 euros). Prefere a bebida para viagem? Então a sua praia é o Backdoor 43, bar com menos de 4m² onde um bartender mascarado serve drinques para viagem, como Il Conte Lucano (amaro, vinho branco, gim, chá e bitter; 6 euros) através de uma portinhola ao lado do canal.
Domingo, 10h00
Grãos e videiras
Prepare-se para o dia na Orsonero Coffee, uma cafeteria de esquina, inaugurada em 2016, que serve cappuccini aveludados feitos a partir de grãos da Gardelli, uma das melhores torrefações italianas. De lá, vá para La Vigna di Leonardo, o novo museu de frente para a Santa Maria delle Grazie (que abriga "A Última Ceia") que revela o interesse de Leonardo da Vinci na viticultura. Aberto em 2015, a instituição convida o visitante para a Casa Atellani, palazzo residencial do século XV que foi cuidadosamente restaurado pelo arquiteto Piero Portaluppi. O audioguia começa em um pátio coberto por afrescos esmaecidos, e segue por corredores decorados até chegar ao jardim gramado onde os pés de Malvasia foram replantados em um terreno que já fez parte do vinhedo do próprio Vinci, presente de seu patrono, o Duque de Milão, em 1498. Ingresso a 10 euros.
13h00
Forças de mercado
Domingo é dia de compras para caçadores de antiguidades e coisas antigas – e o melhor lugar para descobrir esses tesouros é o East Market, que funciona em uma antiga fábrica aeronáutica onde centenas de colecionadores, decoradores, artistas e artesãos se reúnem regularmente. Entre as ofertas, discos de vinil, videogames, roupas usadas, antiguidades italianas, arte moderna e até caixas raras de Lego. O bar, a presença do DJ e as barraquinhas de comida seguram a animação a tarde inteira. As datas variam, então é preciso ficar de olho no calendário; dependendo do fim de semana, a East Market Shop, aberta em novembro passado, oferece uma seleção editada do que se vê nos quiosques da feira.
Onde ficar
Pertinho da Catedral, o Room Mate Giulia tem 85 quartos; inaugurado em 2016, tem interior bem divertido, criado pela arquiteta espanhola Patricia Urquiola. A preocupação com a decoração fica evidente na mistura alegre de cores e padrões presente no saguão, forrado de obras de artistas locais, e nos quartos mobiliados com peças da Cassina (Via Silvio Pellico 4; room-matehotels.com/giulia; diária dos quartos duplos a partir de 250 euros).
Ao lado do "distrito da moda", o Senato é um hotel boutique elegante, de 43 quartos, inaugurado em 2015 em um palacete neoclássico que já foi uma residência particular. O arquiteto Alessandro Bianchi é o responsável pelos interiores chiques, em preto e branco, onde há móveis customizados, banheiros de mármore de Carrara e luminárias douradas em forma de folha de gingko do estúdio Bottega Gadda (Via Senato 22; senatohotelmilano.it; diárias a partir de 221 euros).
O animado bairro de Navigli é uma boa opção se você prefere alugar um apartamento. As diárias mínimas saem por US$70 no Airbnb. Outra alternativa é o Ostello Bello, albergue com 50 camas perto da Cinque Vie, com quartos privativos, bastante comida de graça e atividades sociais (Via Medici 4; ostellobello.com; diárias a partir de 50 euros).
Por Ingrid K. Williams