Confesso que estou constrangida em dizer que, antes de 2017, nunca havia viajado ao Nordeste do Brasil. Repleta de atrações e belezas naturais, a Rota das Emoções trouxe-me a oportunidade de conhecer da melhor forma possível alguns dos mais famosos pontos turísticos de três Estados da região. Eleito pelo Ministério do Turismo o roteiro mais bonito do país em 2009, o percurso inclui a magnificência dos Lençóis Maranhenses, o quase intocado Delta do Parnaíba e a badalada Jericoacoara — localizados no Maranhão, no Piauí e no Ceará, respectivamente.
Nosso roteiro durou sete dias, teve início em São Luís e terminou em Fortaleza, mas também poderia ser o contrário, começando em Jericoacoara e terminando pela capital do Maranhão. Especialmente porque o destino cearense, que tem acesso complicado e longo (cerca de cinco horas de estrada) a partir de Fortaleza, ganhou um aeroporto neste ano, com voos de Gol e Azul saindo de São Paulo.
Agentes de viagem sugerem tempo maior para aproveitar melhor o percurso, formado por 14 municípios. Além do contato com a natureza, o visitante tem à disposição restaurantes que servem a culinária típica do Nordeste, à base de frutos do mar, além de atrações culturais e artesanato.
Barreirinhas (MA), onde o nosso passeio começou, é uma das entradas ao Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses. Surpreendeu-me o fato de que, na imensidão tomada por areia, em novembro, houvesse lagoas naturais formadas pela chuva de junho. O oásis diminuiu minha sensação de estar em um deserto, apesar do clima um pouco seco.
Os 155 mil hectares de dunas, algumas com até 40 metros de altura, passam pelos municípios de Humberto de Campos, Primeira Cruz, Santo Amaro e Barreirinhas. As 10 maiores lagoas têm água límpida, quente e, às vezes, sem peixes. Quando entrei na dos Toyoteiros, a primeira que avistamos, a sensação foi de estar em uma piscina natural, acolhida por uma água aquecida pelo sol característico da época.
O protetor solar é essencial. Mesmo quando há nuvens, é possível sentir o mormaço agindo contra a pele. Para enfrentar a caminhada pelas dunas, também é preciso fôlego. São horas de caminhada, de descida, de subida que, no fim das contas, valem a pena pela paisagem. Além das lagoas, por volta das 18h, o pôr do sol transforma qualquer cansaço em êxtase devido à beleza.
As pessoas que cruzaram o nosso caminho são as mais simples que já conheci. Por viverem do turismo, tentam preservar ao máximo as belezas locais. O guia que nos acompanhou na caminhada pelos Lençóis, enquanto nos direcionava, procurava por qualquer resquício de sujeira deixada pelo homem. O Rio Preguiças, o qual atravessamos de balsa para chegar ao Parque dos Lençóis, também tem suas águas preservadas graças à população, que faz mutirões para arrecadar qualquer tipo de lixo encontrado em suas margens.
Lençóis Maranhenses, Maranhão
No segundo dia de nossa viagem pela Rota das Emoções, entramos na imensidão de areia por Atins, povoado que pertence a Barreirinhas. Fomos transportados até lá por uma lancha que atravessou o Rio Preguiças.
Durante o percurso, paramos em Vassouras, vilarejo de pescadores e ponto de parada de turistas que descem na Praia do Caburé e Mandacaru Farol. Por lá, vimos macacos soltos na natureza, vigilantes à espera de comida trazida pelos viajantes. Aqui, fica um alerta: curiosos, os macaquinhos agarram e levam para dentro do mangue qualquer objeto ou comida que esteja à disposição deles. Meu grupo ficou atento à estratégia de três "meliantes" que roubaram um pacote de biscoitos dentro da bolsa transparente de uma turista que chegava ao local.
Finalmente em Atins, entrada alternativa do Parque dos Lençóis, deparamos com um vilarejo rústico, onde não há asfalto e muito menos sinal no celular. A rua principal é de areia, e as casas mais imponentes foram construídas por estrangeiros que se apaixonaram pelo lugar. Fomos de caminhonete até as dunas, em um percurso que durou cerca de 45 minutos. Avistamos outras lagoas intactas formadas pelas águas da chuva do meio do ano.
Se a intenção é contemplar o sol e o momento na natureza com mais tranquilidade, a entrada por Atins é a mais indicada. Em Barreirinhas, encontramos mais turistas do que no vilarejo mais ao norte do Maranhão.
Uma gaúcha radicada
Para acompanhar o pai em uma transferência de trabalho, a gaúcha Silvana Shimuk, 49 anos, saiu de Canoas em 1982 rumo a São Luís, no Maranhão. Desde lá, não quis saber de voltar para a terra que nasceu. Hoje dona do restaurante Cabana do Peixe, na Praia do Caburé (Barreirinhas), Silvana credita a realização do empreendimento a uma viagem como turista que fez há 17 anos:
— Vim para passear no Caburé, conheci um nativo e fiquei. Hoje é o meu marido, ele é nascido aqui de Atins.
José de Ribamar, conhecido na região por Bebé, ajudou a mulher a arrendar uma pousada, primeiro negócio do casal. O restaurante veio mais tarde, em 2013.
Delta do Parnaíba, Piauí
No quarto dia de rota, nosso grupo saiu de Atins para um percurso de cerca de três horas feito com veículo 4x4. Trocamos a areia dos Lençóis pela imensidão verde do Delta do Parnaíba.
Localizado entre os Estados do Maranhão e do Piauí, o delta é resultado de um raro fenômeno da natureza que ocorre também no Rio Nilo, na África, e em Mekong, no sudeste asiático. Seu desenho se assemelha a uma mão aberta, onde os dedos representam as barras de Tutoia, do Caju, do Igaraçu, das Canárias e da Melancieira. Saímos de lancha do Porto dos Tatus, no município de Ilha Grande, para conhecer o santuário ecológico. Suas margens são formadas por manguezais, hábitat de caranguejos de diversas espécies, além de outros animais.
Aportamos em um espaço de mangue e fomos encorajados a descer e colocar o pé na lama. A sensação é de estar afundando em areia movediça e, por isso, todo cuidado é pouco. Comigo não aconteceu, mas é possível que você acerte uma toca de cobra ou receba um beliscão de um caranguejo. O local, formado por raízes longas e externas de árvores, é infestado por mosquitos — é inevitável o uso de repelente.
O que tornou inesquecível a viagem foi assistir à revoada dos guarás em uma das ilhas do delta. É indispensável a presença de um guia, já que o voo dessas aves ocorre em um lado específico do rio e em horário preciso, pouco antes do pôr do sol. Chegamos por volta das 18h e ficamos a alguns metros de uma ilha intocada pelo homem, em lanchas ancoradas no Rio Parnaíba.
A revoada se caracteriza pela volta dos guarás ao local em que dormem à noite. Aos poucos, árvores e céu ficam pintados de vermelho. A cor dos guarás vem da cataxantina, substância derivada do caroteno, encontrada em abundância na casca dos caranguejos que vivem ali.
Apesar de ser o menor do Brasil, o litoral do Piauí é caracterizado pelas boas condições para esportes ao ar livre, como o kitesurfe. Barra Grande, a cerca de uma hora de Parnaíba, por exemplo, é muito frequentada por estrangeiros que buscam uma aventura em alto-mar. As ruas do vilarejo, localizado no município de Cajueiro da Praia, são parecidas com Atins e Jericoacoara, o último destino da Rota das Emoções. Nesses locais, não há asfalto ou paralelepípedo nas ruas, apenas areia. Devido ao tamanho da vila, o deslocamento interno é facilmente feito a pé, e os poucos veículos que notei circulando tinham tração 4x4.
Em Barra Grande, vi um cavalo marinho, uma das atrações do roteiro. O peixe é muito frágil e, por isso, nosso guia colheu com muito cuidado uma fêmea da espécie próximo ao mar. São os próprios moradores da vila que cuidam da preservação do animal na região.
Jericoacoara, Ceará
Um das praias mais badaladas do Nordeste foi o destino final da nossa viagem. Até ser escolhida uma das 10 praias mais bonitas do mundo pela Washington Post Magazine, em 1984, Jericoacoara, localizada no município de Jijoca de Jericoacoara, era uma isolada vila de pescadores. Foi sua localização privilegiada e as condições climáticas que levaram para lá turistas do mundo inteiro.
Nossa primeira parada, a Lagoa do Paraíso tem redes de descanso dentro da água morna característica da região. Bangalôs são estrategicamente localizados dentro e fora da água por restaurantes que servem a culinária local. É um lugar perfeito para quem quer relaxar.
Para acessar a lagoa, é necessário deixar o carro do lado de fora da estrutura que guarda o local. Há banheiros e funcionários que garantem a limpeza e a administração do ponto turístico. Jericoacoara, a cerca de 30 minutos da lagoa, é cercada por morros e dunas, além de estruturas rochosas. A mais famosa é a Pedra Furada, esculpida pelas ondas do mar e símbolo da praia cearense.
Já a Vila de Jericoacoara, a poucos metros do mar, é formada por lojinhas e restaurantes, além de bares e pousadas. Para entrar, circular ou até mesmo se hospedar no local, é necessário pagar uma taxa de R$ 5 por dia por pessoa. O ideal é emitir o boleto e pagar antes de desembarcar na vila, mas, se deixar para a última hora, há dois postos que recebem o valor. A entrada e a saída da vila são controladas por guardas atentos à movimentação e fiscais das diárias pagas.
Como Jeri é tomada pela areia, inclusive as ruas principais, não pense em levar na mala saltos ou roupas que destoem do estilo praiano. Turistas, moradores e lojistas têm apenas um dress code além dos chinelos: o conforto.
Planeje-se
Barreirinhas (MA)
-O que fazer: visitar os Lençóis Maranhenses e as lojinhas de artesanato no centro da cidade.
-Onde comer: Restaurante Bambaê, às margens do Rio Preguiças. Disponibiliza redes para descanso após o almoço e um parquinho para as crianças.
Mandacaru Farol e Praia do Caburé (Barreirinhas, MA)
-O que fazer: são paradas antes de chegar a Atins. Em Mandacaru, subir até o cume do farol e curtir a vista para a praia. No Caburé, visitar a beira da praia.
-Onde comer: no Caburé, restaurante Cabana do Peixe, entre o Rio Preguiças e o mar da praia do Caburé. Também dá aos turistas a oportunidade de descansar nas redes após o almoço.
Atins (Barreirinhas, MA)
-O que fazer: entrada alternativa aos Lençóis Maranhenses.
-Onde comer: Restaurante Canto do Atins.
Ilha Grande e Parnaíba (PI)
-O que fazer: apreciar as belezas naturais do Delta do Parnaíba. O turista pode visitar os manguezais e assistir à revoada dos Guarás. Durante o percurso pelas águas do Rio Parnaíba, é possível parar em Vassouras para ver os macacos soltos na natureza.
-Onde comer: Casa de Caboclo, às margens do Rio Parnaíba, na Ilha das Canárias, no caminho de quem faz o percurso pelo delta.
Barra Grande (Cajueiro da Praia, PI)
-O que fazer: visitar o litoral do Piauí, praticar o kitesurfe e ver os cavalos marinhos da região.
-Onde comer: Restaurante La Cozinha e Pousada BGK.
Jericoacoara (Jijoca de Jericoacoara, CE)
-O que fazer: ver a Pedra Furada e ir até a Lagoa do Paraíso. Na pequena Vila de Jeri, conhecer o artesanato local e as pequenas lojinhas.
-Onde comer: Alchymist Beach Club, na Lagoa do Paraíso. Na Vila de Jeri, Restaurante Serafim.
*A repórter viajou a convite do trade turístico da Rota das Emoções