Recentemente, em uma manhã sufocante por aqui, clientes do mundo todo lotaram os corredores do mercado na Piazza Vittorio Emanuele perto da estação de trem central de Roma, comprando tudo desde rechonchudos tomates e pêssegos italianos até manjericão tailandês, arroz basmati e carne halal.
- Ciao, capo! - gritou um vendedor sul-asiático para um colega em italiano coloquial, dizendo "fala, chefe!". Não muito longe, duas freiras indianas, usando vestes brancas forradas de azul, inspecionaram alguns produtos. Uma africana falava ao telefone, carregando uma criança pequena em um pano colorido amarrado às costas.
Antes um mercado de bairro comum que atendia italianos de classe média, o empório na Piazza Vittorio, formalmente conhecido como o Novo Mercado Esquilino, tornou-se o coração da Roma multiétnica. Em um país que ainda luta contra a imigração - nas últimas semanas, a primeira ministra negra da Itália tem enfrentado insultos racistas - o mercado representa uma visão diferente, a de um país que está envelhecendo e terá como futuro ser uma terra de imigrantes, marcada por uma coexistência mais fácil no comércio.
- O mercado mudou muito com a imigração - disse Fausto Bonanni, de 64 anos, que trabalhou na barraca de legumes orgânicos da família durante 40 anos.
- Primeiro era imigração interna, imigrantes do sul, de Calábria, Puglia e Sicília. Então vieram os poloneses atrás de Wojtyla - disse ele, referindo-se ao Papa João Paulo II.
Nos anos 90, bengalis, indianos e sul-americanos chegaram aqui, assim como imigrantes da China. O bairro se tornou um centro de atacadistas de lembrancinhas de fabricação chinesa vendidas em lojas para turistas por toda a Roma.
Em 2001, o mercado mudou-se da praça para um espaço coberto e, nos últimos anos, muitos dos comerciantes italianos venderam ou alugaram suas barracas para novos vendedores e se aposentaram. Entretanto, não Bonanni.
- Meu pai deixou para mim, e eu vou deixar para o meu filho - disse ele parado em frente a uma variedade de produtos de verão que a família planta em um lote no Appian Way, no solo rico em potássio que realça o sabor dos legumes.
- Eu disse aos meus filhos: 'Mantenham o negócio vivo porque é a única coisa que dará algum dinheiro' - completou.
A variedade oferecida nas barracas do mercado refletem o novo rosto da Itália. Há cogumelos chineses desidratados, abóboras enrugadas, erva-cidreira, pimenta, batatas doces e especiarias. As barracas sul-americanas vendem suco de manga e Inca-cola em tons tecnicolor. Um açougueiro polonês carrega uma variedade de linguiças. Em uma das barracas, uma propaganda de leite em pó Nestlé diz "Ramadan Mubarak", ou Feliz Ramadan.
- Os imigrantes querem trabalhar e não têm medo de fazer o trabalho que os outros não querem - Bonanni disse.
Nesse corredor, Boshir Odin, de 29 anos, de Bangladesh, disse que ele tem trabalhado no mercado há um ano, vendendo mercadorias que ele diz terem sido plantadas na Sicília ou na Latina, fora de Roma. "Eu falo um pouquinho de italiano, inglês, bengali", disse ele com um sorriso largo, antes de imitar um chinês.
O número de moradores nascidos fora do país vivendo legalmente na Itália triplicou na última década, para cerca de 4.3 milhões em uma população de 59 milhões. Os maiores grupos são da Romênia, Albânia, Marrocos e China, mas outras etnias estão crescendo. O número de bengalis na Itália cresceu para mais de 82.000 em 2011, dos 20.000 em 2003, último ano disponível para consulta de dados.
A Itália ainda está lutando com o racismo. Os jogadores de futebol de ascendência africana foram insultados durante alguns jogos. Desde que assumiu o cargo nesta primavera, a primeira ministra negra da Itália, Cécile Kyenge, foi recebida com bananas, atiradas a ela. Em julho, um ex-ministro do partido anti-imigrantes Liga Norte, Roberto Calderoli, disse que Kyenge o fazia lembrar um orangotango e que ela deveria voltar a trabalhar "no país dela".
A Itália seguiu os passos da França e Alemanha em relação à imigração e integração.
- É difícil quantificar, mas acho que 20 anos atrás é uma boa estimativa - disse Riccardo Staglianò, autor de "Thanks: Why We'd Be Lost Without Immigrants" ("Obrigado: Por que Estaríamos Perdidos Sem os Imigrantes") que fala sobre imigrantes terem se tornado essenciais na Itália em campos tão diversos quanto construção civil e cuidados médicos para a crescente população de idosos.
- Mas em nenhum desses dois países seria imaginável que um ex-ministro dissesse para o atual ministro o que Calderoli disse a Kyenge - completou ele sobre a França e a Alemanha.
De volta ao mercado, a qualidade superou a política.
- A Piazza Vittorio se tornou uma Chinatown, mas eu não ligo - disse Isabella Fontana, de 65 anos, uma enfermeira aposentada que estava comprando peixes.
- Se o produto é bom, pode ser chinês, japonês, francês, não importa - ela disse.
Mostafa Abdel-Wahab, de 52 anos, um açougueiro halal, explicou que ele estudou ciências políticas em seu país natal, o Egito, mas aprendeu a ser açougueiro em Roma, depois de chegar em 1982. Logo depois, ele comprou sua própria barraca.
- Quando eu cheguei, havia pratos que eu sentia saudades e não conseguia achar - Abdel-Wahab disse, destacando a massa árabe com kunafa, um emaranhado de filamentos finos e açúcar. Agora, é mais fácil, completou, fatiando carne com uma faca enorme enquanto conversávamos.
A romancista Jhumpa Lahiri, que atualmente mora em Roma, recentemente escreveu no jornal italiano La Repubblica que, em contraste com os ítalo-americanos com os quais ela cresceu em Rhode Island, que subiram social e economicamente na vida, os bengalis que ela conheceu em Roma, frequentemente, viveram uma experiência oposta.
- Eles dizem achar difícil criar uma nova vida aqui - escreveu Lahiri.
- Mesmo que eles estejam aqui há muitos anos, eles ainda sentem como se estivessem às margens, não mais do que tolerados, desconectados do resto da sociedade. Seus filhos, nascidos e criados na Itália, não são cidadãos italianos - Pela lei italiana, as crianças nascidas no país têm a nacionalidade dos pais.
Outra comerciante, Jane Eke, uma nigeriana de 48 anos, que vendia batatas doces e sacos de arroz em uma barraca no mercado, disse que ela foi desencorajada pela Itália e que nunca sentiu-se aceita aqui.
- Eu não gosto deste país. Mas pelos meus filhos, eu não posso voltar - ela disse, buscando um saco de arroz para um cliente das Filipinas.
Eke disse que seu marido veio para estudar em uma universidade italiana. Ele conseguiu a barraca no mercado há 20 anos e a família se estabeleceu, criando os três filhos aqui. O filho mais novo deles, Ugo, de 17 anos, com um celular bluetooth em uma orelha, estava ajudando. Ele fala italiano, mas não a língua Igbo, nativa de Eke.
A filha mais velha do casal estava se formando no colégio, em Roma.
- Mas depois de estudarem, eles não conseguem empregos - Eke disse, referindo-se à crise de desemprego entre os jovens na Itália.
Uma geração depois, ela não tem certeza se seus filhos terão um futuro na Itália.
- Nós estamos tentando direcioná-los para o Reino Unido - ela disse.