Corria o mês de setembro de 2010. De Paris, após as visitas de praxe aos principais pontos turísticos - túmulo de Napoleão, Torre Eiffel, Louvre, Champs Elisées - viajávamos eu, a esposa Ivone e filho Eduardo, inicialmente com destino a Milão, ponto de partida do nosso roteiro pelo interior da Itália. O carro era um Citroën preto alugado, o filho seguia as instruções do GPS e uma voz feminina, nossa secretária eletrônica, indicava as direções previamente programadas.
E as cidades iam desfilando e ficando para trás. Roma, o Vaticano e seus pontos, antes religiosos e hoje turísticos na maioria. Veneza, o Palácio dos Doges, a Ponte dos Suspiros, as pombas de São Marcos. Verona e o balcão de Julieta, foto obrigatória para as turistas. Logo, a pequena e medieval Bérgamo, na Lombardia e Bolonha, famosa pelos seus vinhos.
Noutro determinado dia, corríamos velozmente pelo interior italiano, na bela região da Toscana. Súbito, a voz feminina informava estar recalculando o trajeto e o filho concluiu que estávamos em lugar incerto, encostando o veículo para os devidos ajustes. Enquanto isso eu já preparava a máquina fotográfica para algumas fotos, pois a região da Toscana é lindíssima, um verdadeiro éden terrestre. Minha atenção estava na paisagem.
Eu fotografava rolos de feno, comuns nos campos europeus, previsão para alimento do gado nos rigorosos invernos. O filho concentrado no GPS. E os olhos de minha mulher pregados num enorme cartaz, com foto de Andréa Bocelli, cantor italiano que, cego aos 12 anos de idade, jogou para trás o infortúnio e tornou-se um vencedor através da música.
Numa plaqueta os dizeres: "TEATRO DEL SILENZIO. PROPRIETÁ PRIVATA. DIVIETO DI ACCESSO. PRIVATE PROPRIETY. NO ENTRY." Sim! Estávamos às portas de propriedade rural particular, ponto em que aquele magistral cantor italiano costuma reunir artistas em espetáculos imperdíveis. Um local ermo, em cima de um morro que, num momento mágico enche os ares de sons maviosos e vozes divinas. E, apesar das proibições em maiúsculas, subimos a encosta, para uma visão rápida.
E, no terreno, enorme armação metálica em forma de estrela, refletindo-se no lago adornado de juncos. Muros formados por pedras enormes, encimados por estátuas coloridas. E nós, que já tivéramos ocasião de assistir a um dos espetáculos de Bocelli, na magia do DVD, sentimos nossa imaginação povoar aquele local com artistas de todos os cantos do mundo, suas belas vozes, acompanhados de temas musicais inesquecíveis.
E até hoje, agradecemos a pequenas falha da nossa secretária eletrônica, nos proporcionando uma visita inesperada e que veio enriquecer sobremaneira nossos conhecimentos de viagens.
*Escritor, de Porto Alegre