O argentino Gustavo Roldan, de 64 anos, parece tão exótico quanto os itens vendidos em seu antiquário em Capão da Canoa, no Litoral Norte. Costuma apresentar as novidades em divertidos vídeos nas redes sociais do estabelecimento. Nesses momentos, recorre a criatividade e veste uniformes ou fantasias.
Percorrer os corredores e espaços do Trato Feito, inspirado no nome do conhecido reality show norte-americano do History Channel, é dar de cara com aquela máquina de costura da vovó, placas antigas de carros, tambos de leite de fazendas, moedas, vitrolas, balanças e variados equipamentos e utensílios do passado.
— Eles fazem o Trato Feito em Las Vegas, e eu faço em Capão da Canoa — diverte-se o proprietário, com o sotaque em espanhol bastante carregado.
Roldan já foi palhaço de circo, participou como militar do conflito do Canal de Beagle e atua ainda como pastor de igreja. O episódio que quase levou argentinos e chilenos a uma guerra envolveu uma região que divide os dois países na Terra do Fogo, o Estreito de Beagle. Na ocasião, até o Papa João Paulo II precisou intervir para evitar o pior.
O antiquário possui 600 metros quadrados e sete salas. Foi aberto há 15 anos. Toda a família coloca a mão na massa: a esposa Luciana de Roldan, 48, e os filhos Franco, 23, e as gêmeas Ruth e Abigail, ambas de 13.
— Anos antes da pandemia, nós calculamos que tínhamos 10 mil peças. Mas o que mais temos são relíquias e tesouros difíceis de encontrar — comenta o argentino nascido na província de Chaco, no norte do país vizinho.
Para colecionar e decorar
No antiquário, Roldan tem uma oficina onde conserta e restaura peças antigas. Na sala ao lado, vitrolas tocam músicas de vinis raros. Os clientes mais jovens, aliás, buscam por cantores e grupos de outras épocas nesse canto.
Encontram-se no lugar desde artigos procurados para decoração em materiais como bronze, prata e porcelana, até itens rústicos em madeira.
— Os clientes procuram coisas para colecionar. Querem balanças, garrafas antigas de Coca-Cola, artigos náuticos, facas, garruchas. O Brasil é maravilhoso porque tem colecionadores de tudo — menciona.
O comerciante conta que muitas peças são encontradas no interior do Brasil, mas uma parte vem de veranistas que trazem itens para negociar. Até placas de antigas bicicletas estão à venda para quem procura algo diferenciado para colocar na parede de casa ou na estante do quarto.
— Tenho um farol a gás de mil oitocentos e pouco de quando chegou o gás ao Rio de Janeiro. Acho difícil que alguém tenha um igual — afirma, dizendo que sua missão é "dar e receber amor às pessoas".
Questionado o porquê de escolher abrir um antiquário em Capão da Canoa e não em Porto Alegre, Roldam compartilha como isso ocorreu.
— Fui enviado por uma associação religiosa argentina como missionário de igreja para me estabelecer em Capão da Canoa. Tinha muita coisa guardada, porque eu era um acumulador — reconhece.
Para explicar sua popularidade por meio dos vídeos no Instagram, ele ressalta a experiência de mais de duas décadas como palhaço de circo, onde fazer qualquer tipo de travessura era bastante corriqueiro.
— Não tenho medo e vergonha. Posso me fantasiar todos os dias de marinheiro, de soldado e de nordestino. Meus filhos me filmam. Sempre tenho algo na cabeça e uma alegria no coração — assegura, exibindo sua felicidade pela formação do filho no curso de enfermagem pela Universidade Feevale.
A esposa Luciana, que também é argentina, revela que jamais imaginou que iria viver em uma praia gaúcha e administrar um antiquário com o marido. Ela demonstra felicidade com a rotina do dia a dia.
— A gente se apaixona pela história. Tu começa a pesquisar as coisas. Às vezes, chegam aqui peças que nem sabemos de onde vêm — conclui.
No Trato Feito de Capão da Canoa, o tempo parou para o visitante poder apreciar objetos carregados de história.