Se depender da corneta, o Gre-Nal deste domingo (25), às 18h, no Beira-Rio, válido pela primeira fase do Gauchão, vai terminar empatado. Pelo menos essa é a impressão que se tem ao visitar as duas casas mais famosas de Curumim, no Litoral Norte do RS. As cores de Grêmio e Inter convivem lado a lado e separadas apenas por um muro.
— É bom ele segurar a bandeira, porque a taça está do nosso lado — cutuca o empresário gremista Marcelo de Oliveira, de 42 anos, dirigindo-se ao vizinho.
A resposta do aposentado colorado Osmar Müller, 75, vem de bate-pronto:
— Gostaria de perguntar ao Marcelo se ele lembra quantas vezes o Grêmio foi campeão gaúcho e quantas o Inter foi.
— No último Gauchão, nem na final vocês chegaram — prossegue Marcelo.
— Quando éramos campeões de tudo, tivemos a infelicidade de jogar a Série B, que era a área deles. Campeão da Série B é com eles — devolve Osmar.
A rivalidade vira uma brincadeira saudável nessas casas situadas na Avenida Aimoré e separadas apenas por um muro, quase na beira da praia de Curumim. Os dois amigos inclusive já foram tema de reportagem de GZH antes pela mesma razão.
Morador de Capão da Canoa, Marcelo recebeu a equipe de reportagem em Curumim ao lado do filho Matheus, 16, e da sogra e proprietária da casa Eli Medeiros da Silva, 77. Pouco depois, juntou-se ao grupo a aposentada uruguaia Elida Viana, 82. Todos estavam devidamente uniformizados, inclusive a amiga estrangeira da família.
Em seguida, ele trouxe uma réplica da taça Libertadores para exibir perto do muro. Uma garrafa térmica para a água do chimarrão também continha as cores gremistas.
— Quando o vizinho fez a casa dele, minha sogra recém havia reformado a dela e já tínhamos a cor para pintar de azul. E ele estava pintando de vermelho. Foi uma coincidência — relata, situando a época por volta de 2014.
Como o colorado começou a colocar bandeira do Inter, o gremista também se puxou nesse quesito. Em pouco tempo, o endereço virou atração turística.
— As pessoas vêm aqui e perguntam se somos inimigos, irmãos ou se dá briga. Mas o que dá é uma boa corneta — explica o gremista.
É bom ele segurar a bandeira, porque a taça está do nosso lado
MARCELO DE OLIVEIRA
Empresário gremista
A situação rende histórias saborosas. Conforme Marcelo narra, gremistas chegam para tirar fotos na frente da casa com as cores do clube, mas não pisam no chão do vizinho colorado. E o mesmo ocorre quando os colorados fazem selfies na casa do time do coração. Não se aproximam da outra. Importante mencionar que até as calçadas possuem as cores de cada equipe.
Em relação ao clássico, Marcelo reflete que a partida não será fácil, mas aposta em vitória por 2 a 1 na casa do adversário.
— Gre-Nal é Gre-Nal. O time deles está mais consolidado e jogando junto há mais tempo, mas quando entra para dentro de campo, a rivalidade pega e o que tiver mais fome vai ganhar. Eles estão na pressão, porque não ganham o Gauchão desde 2016 — afirma.
Do outro lado do muro e assando um galeto, o colorado Osmar não se intimida. Na companhia da esposa e cabeleireira Raquel Dias, 48, e dos amigos Luiz Carlos, conhecido como Vica, 66, Cristiano Salvatori, 57, e João de Bastiani, 79, o aposentado sorri o tempo inteiro.
Morador de Canela, ele exibe orgulhoso fotos da casa na Serra também pintada com as cores do Inter. E o fanatismo é tão grande que ele tem uma terceira residência em vermelho e branco — em Caldas Novas, em Goiás.
Ex-proprietário do Chopão, que ficava próximo ao mesmo terreno onde hoje está sua casa na praia, Osmar acompanhou o Inter na conquista do Mundial de Clubes de 2006, quando viajou para Yokohama, no Japão. Seu palpite é vitória vermelha por 3 a 1 no Beira-Rio.
Ele também conta sobre as cenas inusitadas que passa por ter uma casa tão identificada com o clube.
— Muitos vêm aqui e perguntam se é preciso pagar para tirar foto. Digo que a pessoa pode entrar e fazer fotos — diz.
A torcida adversária também tem participação nessa história.
— Às vezes, se o Inter joga mal, torcedores rivais passam aqui de noite e gritam se vamos aparecer. Estamos sempre felizes, não é um jogo que vai nos entristecer — diverte-se.
O colorado está tão otimista que espera vencer, além do Gauchão, o título do Campeonato Brasileiro. E recorda outro vínculo com o clube do coração:
Quando éramos campeões de tudo, tivemos a infelicidade de jogar a Série B, que era a área deles. Campeão da Série B é com eles
OSMAR MÜLLER
Aposentado colorado
— Eu tinha a empresa Canela Tur. Quando o Inter ia para a cidade, eu emprestava o ônibus para o time treinar no campo do Serrano. E o Taffarel era o motorista — compartilha, salientando que o então goleiro o convidou certa vez para tomar um café da manhã junto dele no Hotel Laje de Pedra.
Na fachada da casa gremista, além das bandeiras, está escrita a frase "sirvam nossas façanhas de modelo a toda Terra". Enquanto na residência colorada, se lê: "Aqui mora um colorado feliz".