A caminho da praia, no final da manhã desta terça-feira (12), a vendedora Simone da Costa, 48 anos, decidiu seguir pela Avenida Poti, no centro de Capão da Canoa. O trajeto não foi escolhido ao acaso: a uma quadra do mar, encomendou um pão caseiro da Kombi Lucimar, uma padaria sobre rodas estacionada ao lado da calçada.
— A gente desce pra praia e volta com fome. E se não encomendar, às vezes ele vende tudo. Esse vai ser o meu almoço-café — contou à reportagem, por volta das 15h, quando voltava para casa.
A padaria itinerante teve os bancos traseiros removidos, e prateleiras foram colocadas para expor os produtos. Uma cortina estilo mosquiteiro foi instalada para evitar a invasão de insetos. Roscas de polvilho, pastéis, mil-folhas, cucas e outros doces chamam atenção de quem chega ou sai da areia. Os sonhos, segundo o proprietário da Kombi da Avenida Poti, são o carro-chefe.
— Sonho tem tudo a ver com praia. O pessoal olha a Kombi, pede pra tirar foto, os mais velhos lembram da infância, e quando veem o sonho, parece que junta tudo que eles queriam — afirma o comerciante Átila Luis Feliberto, 37 anos, proprietário de um dos veículos.
A história da empresa familiar começou em 1990, quando o catarinense Jorge Luis Felisberto, 59 — pai de Átila —, decidiu empreender, e trocou o Estado vizinho pelo litoral norte gaúcho.
— Eu trabalhava em confeitaria desde criança, mas resolvi colocar um negócio próprio — afirma o sócio da empresa.
As Kombis foram batizadas de Lucimar pela combinação dos nomes das esposas dos sócios: Maria Lúcia e Marlene. Funcionam como padaria itinerante apenas no verão. Nos outros meses do ano, ficam estacionadas em uma propriedade da família, natural de Sombrio, em Santa Catarina.
Os alimentos são produzidos logo cedo, às 5h, em uma cozinha industrial própria. Às 11h, são levados às três Kombis da empresa. Cada uma vai até um ponto, próximo à areia, onde a freguesia já as espera, garantem os trabalhadores. Tem até venda fiada, no caderninho, opção escolhida pelo professor de educação física Cristiano Oliveira, 53.
— É muito tradicional aqui. Se tu desce sem dinheiro pra praia, eles te vendem. É um serviço pro veranista — conta o educador, enquanto acertava a dívida do dia anterior.
Dois dos três veículos circulam pelo Centro, e os clientes são chamados com buzinadas — tudo, segundo Jorge Luis, controlado conforme o horário de sesta: após o almoço, os carros permanecem parados, uma lei do silêncio nunca posta no papel.
Movimento afetado pela pandemia
A temporada atual de vendas começou no Natal de 2020 e se estenderá até perto de março. Com a pandemia, o movimento foi afetado por um clima permanente de "fim de temporada", segundo os ambulantes. A baixa circulação foi constatada pela reportagem de GZH, com poucos guarda-sóis em frente ao mar e vias tranquilas em um dos mais movimentados balneários do RS.
A aparência dos produtos agrada, e o público disse aprovar os doces e salgados. No entanto, o segredo do negócio, que resiste há 30 anos na praia, é facilmente identificado.
— É a Kombi. Eu já tive mais de 10. Esta aqui, fabricada em 1984, está comigo há quatro anos. De tempo em tempo precisa trocar, né, na praia nada dura — afirma Átila, ao lado do veículo que tem quase a sua idade.
O filho de Átila, João Vitor Tomé, 20, ajudou no comércio por 11 temporadas. Este é o primeiro ano em que não está na Kombi. O afastamento, afirma, pode ser temporário, e ele inflama um desejo do pai.
— Quem sabe, né, eu assumo, para seguir o negócio da família — cogita o jovem.