Próximo a zona urbana de Torres, uma área de mil hectares guarda um patrimônio natural praticamente intocado e quase desconhecido pelos turistas. A área do Parque Estadual de Itapeva preserva as características originais do Litoral Norte gaúcho junto ao único remanescente que conserva a fisionomia nativa da costa.
A opção de lazer ecológico oferece três trilhas. GZH percorreu uma delas na última semana, em meio a caneleiras centenárias, cipós, pegadas de animais e um caminho que percorre a mata fechada e revela a vista para o mar, do alto das dunas.
Dentro do bioma Mata Atlântica, o local tem uma sequência de ambientes originais com dunas da beira da praia, áreas úmidas de lagos temporários, grandes campos de dunas e mata fechada com solo encharcado.
— Esse é o último fragmento do Litoral Norte que conserva essa sucessão de ambientes: desde duna inicial, baixada úmida, dunas altas, seguidas como uma mata sobre um ambiente banhado, úmido em um ecossistema extremamente rico. Essa sucessão era comum no Litoral, hoje a urbanização está em todo resto, com a ocupação imobiliária e o parcelamento do solo. Por isso, a importância de continuar preservando a fauna e a flora do Parque Itapeva — afirma o biólogo responsável pelo parque Paulo Grübler.
Com proteção especial desde 1971, quando se criou o complexo turístico de Torres _ do Parque da Guarita até a Lagoa de Itapeva _ o parque se tornou unidade de conservação integral aliada ao turismo sustentável apenas em 2002. Em 2020, ficou fechado para visitação entre o final de março e outubro devido à pandemia, mas manteve ininterrupta as atividades de conservação e fiscalização para evitar crimes ambientais, ocupação irregular, extração vegetal e caça predatória. Também seguiram os projetos de monitoramento de fauna com dois servidores percorrendo a área uma vez por semana. O trabalho é executado com idas a campo e armadilhas fotográficas – uma espécie de forma de captar imagens sem a presença de um fotógrafo e sem espantar o animal.
— Fizemos análise do local onde se imagina que o animal vai passar. Montamos a armadilha numa árvore ou galho, e quando o bicho passa, o sensor de calor e movimento da câmera registra, com configuração de tempo e filmagem. Colocamos de forma discreta para camuflar na paisagem e o animal não repara, com exceção do graxaim, que é curioso, vem, chega perto e cheira — explica a bióloga e analista ambiental Danubia Pereira do Nascimento.
Atualmente, há cinco armadilhas montadas e mais 29 serão instaladas a partir de fevereiro, que auxiliarão em um levantamento completo da fauna no Itapeva. O parque tem, catalogados no plano de manejo, 177 espécies de aves. Grübler alerta que esse número é subamostrado. A estimativa é de que há pelo menos mais 50 espécies que faltam ter seus registros oficializados:
Em uma cidade que tem o metro quadrado tão caro, temos essa dificuldade de manter os objetivos de criação do parque, que é a conservação aliada ao turismo sustentável. Torres é um município turístico que vive da paisagem e o Parque Itapeva exerce uma função na conservação dessa paisagem do Litoral, somando-se ao Parque da Guarita. É esse conjunto de paisagem que torna Torres diferente de outras praias mais para o Sul.
PAULO GRÜBLER
Biólogo gestor do Parque Estadual de Itapeva
— Seguramente são mais de 200 espécies de aves. Estamos em uma região de sobreposição de ambientes, com influência das aves que vêm da mata atlântica da Serra, de outras que vivem embaixo da Serra na região de banhado e das aves que vêm do Litoral. É uma espécie de mosaico de ambientes que se sobrepõem e, por isso, essa riqueza toda.
O parque também abriga várias espécies ameaçadas de extinção, entre elas o sapinho-da-barriga-vermelha, o gato-do-mato-pequeno, o tamanduá-mirim e o tuco-tuco (roedor que vive nas dunas). Ao longo do tempo, o próprio ecossistema do Itapeva foi capaz de promover movimentos que chamam atenção dos especialistas. Um exemplo foi o retorno da capivara, que em 2006 foi dada como extinta em toda região do parque e atualmente aparece em todas as áreas do local.
— Ela achou um meio de acessar o parque. Quando temos uma área de preservação, a natureza resolve e o ecossistema viabiliza a própria regeneração, inclusive da fauna — afirma Paulo.
A paisagem e o farto ecossistema da área já atraíram visitantes de cinco continentes em uma única temporada e é fonte de estudo para pesquisadores da academia. No momento, há 10 pesquisas científicas sendo executadas no parque.
— Os pesquisadores submetem projetos de pesquisas específicas, o projeto é cadastrado, analisado, verifica-se se o objeto é planta, bicho, se está ameaçado, a quantidade que será retirada de amostra, quantas vezes pretende visitar e como isso vai impactar o bioma — explica Danubia.
Desafios para a preservação e qualificação turística
Em meio a tanta riqueza ambiental, o parque enfrenta desafios. O principal deles, na avaliação do biólogo gestor, é defender a política de conservação do local numa área tão próximo ao perímetro urbano _ e tão valorizada economicamente. O outro é qualificar a infraestrutura do local, para atrair mais visitantes. Neste verão, a procura pelas trilhas ainda é tímida:
— Em uma cidade que tem o metro quadrado tão caro, temos essa dificuldade de manter os objetivos de criação do parque, que é a conservação aliada ao turismo sustentável. Torres é um município turístico que vive da paisagem e o Parque Itapeva exerce uma função na conservação dessa paisagem do Litoral, somando-se ao Parque da Guarita. É esse conjunto de paisagem que torna Torres diferente de outras praias mais para o Sul. O parque tem uma capacidade de atração muito maior. Mas não tem infraestrutura necessária para atrair o público — avalia Grübler.
Em uma tentativa de fazer o turismo sustentável deslanchar, há um plano de uso público com projeto de concessão de serviços para a inciativa privada como trilhas monitoradas, passeios ciclísticos, centro de visitantes, cobrança de ingresso e construção de um mirante. Nesse modelo, seria mantida com o Estado a gestão e conservação do parque.
— Isso só falta ser implementado. O Estado está na fase administrativa de fazer as concessões.
Um desafio já vencido é a regularização fundiária. Com indenização dos proprietários, 97% da área do parque está sob domínio e posse pública do Estado. Os outros 3% dependem de decisões judiciais.
Como visitar
- Entrada somente com agendamento prévio pelo e-mail agendamentotrilhapeva@sema.rs.gov.br ou peitapeva@sema.rs.gov.br e pelo telefone (51) 3626-3561 (também WhatsApp)
- O número de participantes é limitado devido à pandemia
- Obrigatório o uso de máscara no local
- Leve água, repelente e álcool em gel
- Ir de tênis e calça é um pré-requisito
- Está localizado a 191 quilômetros de Porto Alegre, via Estrada do Mar, no município de Torres, Litoral Norte, a 10 quilômetros do centro da cidade.
- O acesso ao Parque pode ser feito pelo trevo de acesso ao balneário de Itapeva ou pelo km 85 da Estrada do Mar. São 2 quilômetros de estrada de chão até a entrada do parque.