A menos de cem metros da orla do mar de Itapeva, em Torres, uma riqueza permanece praticamente desconhecida por quem passa pela região. São mil hectares da única área que conserva o ambiente original do Litoral Norte gaúcho, dentro do bioma Mata Atlântica. As terras ficam no Parque Estadual de Itapeva, criado em 2002 com foco na conservação da fauna e da flora local.
Caminhar entre a mata fechada, repleta de samambaias, árvores canela, cipós, flores e borboletas é quase uma terapia. O canto do aracuã e o som das cigarras acompanham o caminhante. Se der sorte, ele cruzará a trilha com macacos-prego. Mas o parque não tem apenas florestas. Boa parte dele também contempla as últimas dunas costeiras do Estado, onde há espécies de animais que só vivem nelas e estão ameaçados, como a lagartixa das dunas e o tuco-tuco.

Sem condições de infraestrutura, o parque ficou fechado para visitação durante quase uma década. Apenas pesquisadores podiam desenvolver estudos no local. Há três anos, porém, a área foi reaberta. Três trilhas podem ser visitadas com agendamento prévio. O visitante é acompanhado por um especialista. Nos caminhos, cada um com cerca de um quilômetro e nível diferenciado de dificuldade, os visitantes conhecerão um ambiente diversificado, com dunas, mata nativa, butiazeiros centenários e árvores com mais de 300 anos. São aceitos grupos de até 25 pessoas.

No ano passado, por exemplo, o gestor do parque, o biólogo Paulo Grübler, conta ter recebido turistas da Alemanha, da China, dos Estados Uinidos e da Inglaterra:
— Itapeva atrai pelo completo ecossistema litorâneo que tem, com mar, dunas móveis, dunas fixadas por restinga, banhados, áreas alagáveis, mata paludosa e matas de restinga.
A singularidade do parque é comprovada pelo líquens espalhados entre os galhos das árvores. Os organismos formados a partir da simbiose entre um fungo e uma alga ou cianobactéria são bioindicadores de qualidade atmosférica. Ou seja, Itapeva ainda está livre da poluição.

Até 2010, um camping estadual funcionou nas dependências do parque. Com o fechamento dele, passou-se a discutir a elaboração de regras de visitação. Em maio do ano passado, Itapeva se tornou a primeira unidade de conservação do Estado a ter um plano de uso público, exclusivo e detalhado, para atender aos turistas. Orçado em R$ 7 milhões, o projeto prevê a construção de um centro de visitantes, com estacionamento, lanchonete, lojas de artesanato e um mirante de 12 metros de altura, fixado no ponto mais alto. A operacionalização será realizada por meio de concessão pública e cobrança de ingresso; hoje, o acesso é gratuito. No plano, está prevista a visitação de até 400 pessoas por dia. A gestão do parque continuará a cargo do governo estadual.
Atividades devem potencializar ecoturismo
Segundo Grübler, a expectativa é de captar o recurso financeiro necessário ainda neste ano. Também deverão ser implementadas atividades para potencializar o ecoturismo, como circuito de ciclismo e passeios de caiaque na Lagoa do Simão. O objetivo é transformar o parque numa ferramenta turística para Torres.
O acesso do público se dará dentro de um processo de regramento e com os cuidados ambientais necessários para não colocar em risco o ambiente e a fauna
PAULO GRÜBLER
Gestor do Parque de Itapeva
Para a criação da unidade de conservação, foram necessárias remoções de famílias que moravam dentro do espaço assumido pelo Estado. Nos últimos dois anos, a gestão dedicou-se a ressarcir os antigos proprietários das terras. Foram gastos R$ 14 milhões em indenizações. Outros R$ 7 milhões deverão ser liberados nos próximos meses. O dinheiro provém dos pagamentos de medidas compensatórias de impactos ambientais.
As velhas casas de madeira e de alvenaria permanecem em meio à floresta, que cresce ao redor. A intenção da gestão é usá-las para alojamentos de pesquisadores e parte administrativa. A maior delas, sem moradores há mais de 10 anos, já perdeu o telhado, mas deve ser recuperada para se tornar um museu. Grübler ressalta a importância de conscientizar a população sobre a conservação do parque, considerado um habitat natural de espécies ainda em estudo, como o sapinho-de-barriga-vermelha, o Melanophryniscus dorsalis, que só existe no local. O anfíbio tem potencial para o desenvolvimento de medicamentos.
— Temos uma rica diversidade de fauna, com mais de 200 tipos de aves, e inúmeros mamíferos, como o remanescente de um grupo de macacos-prego, além tamanduás-mirins e graxains. Itapeva é única e precisa ser preservada — finaliza Grübler.

Como visitar
- O Parque Estadual de Itapeva abriga ambientes de dunas, vegetação de restinga, campos secos e alagados, banhados e turfeiras e mata paludosa (floresta formada sobre solos bastante úmidos).
- Está localizado a 191km de Porto Alegre, via Estrada do Mar, no município de Torres, Litoral Norte, a 10 quilômetros do centro da cidade.
- O acesso ao Parque pode ser feito pelo trevo de acesso ao balneário de Itapeva ou pelo km 85 da Estrada do Mar. São 2km de estrada de chão até a entrada do parque.
- Visitas podem ser agendadas pelo email agendamentopeitapeva@sema.rs.gov.br ou pelo telefone (51) 3626-3561.