O ambientalista Paulo França, de 54 anos, recolhia o lixo deixado na praia, quando olhou para o mar e viu um casco sobre as ondas na Praia do Cal, em Torres. Correu para tentar ajudar a tartaruga a retornar para a água. O esforço foi inútil.
— É de chorar. E eu chorei, porque a tartaruga já estava morta. Tinha no estômago plástico e bitucas de cigarro — relembra.
Da espécie cabeçuda, a tartaruga media 1m20cm, dimensão confirmada por uma fotografia registrada por França ao lado do animal. O fato atordoou tanto o ambientalista que ele decidiu protestar: usou as centenas de pontas de cigarro recolhidas na praia para montar o contorno de um esqueleto de tartaruga, exposto no gramado da Prainha, em Torres.
A outra escultura foi feita com pedras, areia em formato de cruz e as bitucas jogadas no chão. Em tinta vermelha, no cordão da calçada, pintou ainda um apelo: “são milhares de bitucas, dos Molhes à Prainha, a cruz de toda vida marinha”. A mensagem tem um objetivo:
— Se uma criança deixar de fumar com o meu protesto, já me sinto satisfeito. Pior que quem fuma, me xinga. Eu digo que pode fumar, só não joga no chão — afirma.
O artista é natural de Torres e diz começado a se envolver mais na causa ambiental no início da vida adulta. O avô dele foi uma das inspirações, e ele próprio já repassou o gosto pela natureza aos filhos — um biólogo e outro guarda-vidas.
França é reconhecido na região por intervenções artísticas. Em 2019, lançou um livro de poemas, onde também expõe fotografias de outras manifestações.
— Ele junta a poesia e arte para preservação — define o estudante de Medicina Veterinária Tiago Dominguez Pacheco, 27 anos.
O engenheiro André Augusto Bitencourt, 27 anos, acompanhava as manifestações pelo livro, também exposto no quiosque onde o artesão trabalha:
— Admiro o trabalho dele há muitos anos. Acredito que terá impacto nas próximas gerações.
Neste ano, no entanto, os pedidos de ajuda ao ambiente e animais marinhos não contam com uma companheira centenária: a avó de França, que está em quarentena devido ao coronavírus:
— Minha avó, de 105 anos, sempre participa, mas, pela pandemia, está em casa, se cuidando.
O artista conta que, no último ano, ficou assustando com a quantidade de materiais plásticos que recolheu na praia: dezenas de garrafas de água mineral e latas de inseticida jogadas em alto mar por tripulantes de embarcações internacionais, de acordo com ele. O rótulo dos produtos indica a origem: Serra Leoa, Estados Unidos, China e Malásia, exemplifica.