Por anos a fio, o mar gaúcho carregou a pecha de "chocolatão" em razão de suas águas marrons, mas tão marrons, que chegavam a escurecer até a crista das ondas. Por isso, a sucessão de dias com ondas limpas – por vezes cristalinas, como nesta quarta-feira – vem impressionando os banhistas no Litoral Norte. E desperta entre eles um questionamento: que fim levou o célebre chocolatão?
Desde o início deste veraneio, o Atlântico brinda os frequentadores de praias como Tramandaí, Capão ou Torres com água limpa. Mesmo nos piores dias, de mar mais mexido, sua coloração pode até ficar opaca, mas em nada lembra os tons barrentos tão familiares a qualquer banhista da costa rio-grandense.
Nesta quarta, o tom esmeralda que tomou conta da orla encantou os veranistas e repetiu o espetáculo vislumbrado no primeiro dia do ano. Mesmo quem não estava preparado para tomar banho, em razão do tempo nublado pela manhã, não resistiu aos encantos quase caribenhos da água.
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– Só vim para a beira-mar para dar uma corrida. Mas, quando vi o mar desse jeito, pedi para uma senhora cuidar das minhas coisas e tive de dar um mergulho. Realmente, neste ano a água do mar está muito boa, limpa. E não está gelada – vibrou a estudante de Direito Louise Zwartjes, 21 anos, recém-saída das ondas de Capão da Canoa.
Se nos dias de chocolatão as crianças são a maioria dos banhistas, nesta quarta até quem tem quase um século de vida se aventurou no mar. O aposentado João Atílio Rosa Gobo, 90 anos, de Ijuí, se tocou para dentro d'água com a ajuda do filho Pedro Luiz Gobo, 61.
– Tenho que cuidar porque minhas pernas já andam meio bambas, mas não tinha como não tomar um banho – afirmou seu João Atílio.
O geógrafo e integrante do Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica (Ceco) da UFRGS Nelson Gruber afirma que a coloração do mar gaúcho está sendo favorecida por uma complexa conjunção de fatores climáticos, que incluem desde o fenômeno La Niña até a atuação de um centro de alta pressão subtropical. Esse centro, localizado sobre o oceano, vem favorecendo a propagação de ondas do Sudeste, mais limpas.
Quando essas ondulações não encontram ventos muito fortes vindos de Nordeste (o famoso Nordestão), que reviram muito o mar, a tendência é de ondas mais claras. O vento Nordeste tende a deixar mais areia em suspensão e favorecer a multiplicação de algas – parte importante da receita para "achocolatar" a orla.
Em resumo, não significa que o Litoral Norte ficará para sempre com ares de Santa Catarina. Mas, pelo menos por algum tempo, a tendência é de que os gaúchos possam aproveitar águas que em nada lembram chocolate.
Em Torres, por via das dúvidas, a estudante de Venâncio Aires Marília Schuh, 20 anos, deu um jeito de garantir a lembrança desses dias de águas claras em mar gaúcho:
– Vou tirar fotos e mandar revelar algumas, que é pra garantir que não vão se perder.
CUIDADOS NO MAR
O mar límpido estimula os banhistas a aproveitar mais a água, mas exige precaução. Confira algumas recomendações:
– Banhe-se em horário e local protegidos por salva-vidas, respeitando as bandeiras de sinalização.
– Evite tomar banho onde bandeiras fincadas na areia indicam ponto de perigo.
– Atenda aos eventuais pedidos dos salva-vidas para sair de um ponto de risco.
– Não entre no mar sob efeito de bebidas alcoólicas ou logo após refeições.
– Tenha sempre atenção com as crianças. Nunca as deixe sozinhas na praia.
– Evite mergulhar em locais desconhecidos.
– Evite banhar-se em locais de risco, tais como águas profundas, próximo a pedras, plataformas ou locais com repuxo.
– Não permaneça na praia em dias de tempestades, pois há risco de morte por raios.
– Tenha cuidado ao usar objetos flutuantes (boias, pranchas etc), que podem facilmente ser arrastados pelas correntes para águas profundas.
– Não pratique esportes náuticos ou pesca em horários e áreas de banho.