"Nossa, como o mar está clarinho". Nos últimos dez dias de janeiro, essa é a frase mais repetida na beira mar pelos veranistas. Para os gaúchos, acostumados com o turvo e gélido chocolatão, deparar-se com água clara e quente é motivo de comemoração e surpresa.
Fim de semana será de sol e tempo firme em todo o Estado
Para entender os motivos deste mar "caribenho" é preciso entender o papel das correntes marítimas em nossa costa. De acordo com a química e oceonógrafa do Centro de Estudos Costeiros, Limnológicos e Marinhos (Ceclimar), Cacinele Mariana da Rocha, na costa do Brasil existem duas correntes marítimas que influenciam o litoral do Rio Grande do Sul: a das Malvinas, que vem do sul, tem temperatura baixa, mas é muito rica em nutrientes, deixando a água turva; e a corrente do Brasil, que vem do norte, tem temperaturas quentes e é pobre em nutrientes, o que resulta em água clara.
- É no litoral do Estado, entre a Argentina e Santa Catarina, que essas duas correntes se encontram e se "enfrentam", uma empurrando a outra. De acordo com as variáveis de vento e frentes de ar, uma delas sempre prevalece no nosso litoral - explica Cacinele.
Veja as imagens de como estava o mar no Litoral Norte nesta quinta-feira:
Normalmente, a corrente das Malvinas tem mais força e acaba atuando por maior período no Estado, deixando o mar escuro. Em Santa Catarina, a corrente do Brasil tem mais influência, o que explica a água mais clara. Para os pesquisadores do Ceclimar, o mar "perfeito" desse início de 2016 é atípico. Foi o forte El Niño que ajudou a corrente do Brasil a se fortalecer. Outro fator foi a falta de chuva e vento no período.
- A falta de vento em nosso litoral, que é aberto, tem influência direta na transparência da água. A falta de chuva também contribui. Nosso escoadouros naturais, que são os rios Mampituba e Tramandaí, e a Lagoa dos Patos, despejam água e matéria orgânica no mar, o que contribui para o escurecimento da água. Não estamos tendo isso nesses últimos dez dias - pontua Ignácio Moreno, biólogo e diretor substituto do Ceclimar.
Um em cada três pontos analisados em praias de Santa Catarina está impróprio para banho
Segundo os especialistas, 2016 é um ano diferenciado se comparado com os anteriores. Em 2014 e 2015, houve registros curtos de mar quente e claro. Mas as condições não duraram mais que quatro ou cinco dias. Neste ano, já são mais de dez dias de mar claro. Para quem torce para essa condição perdurar até o fim da temporada, a resposta dos especialistas é um pouco desanimadora:
- Provavelmente a água não vai ficar assim por todo o verão. Como estamos em ano de El Niño, poderão vir mudanças expressivas em breve. A previsão é de que o tempo vai virar e teremos a chegada da chuva e do vento, o que pode deixar o nosso mar mais turvo. Isso não quer dizer que teremos o chocolatão, mas a água vai perder a transparência e a temperatura mais amena - ressalta Cacinele.
Fauna marinha também muda
As águas quentes desse mar "perfeito" influênciam diretamente a fauna marinha. Esse fenômeno pode atrair animais diferentes, presentes normalmente em locais de clima mais tropical.
- Se formos mar adentro poderemos encontrar espécies de golfinho e aves marinhas que não são comuns no inverno, como baleias, pinguins e lobos marinhos. A fauna marinha da nossa região oscila de acordo com a temperatura da água e da época do ano - conta Inágcio.
Um animal que tem aparecido frequentemente nas areias gaúchas são as tartarugas marinhas.
- Quando está um pouco mais quente, elas aparecem em maior quantidade, por isso temos visto uma mortalidade maior de tartarugas recentemente - explica o pesquisador.
Como está a conexão à internet móvel no litoral gaúcho
O Ceclimar também reitera que todos os verões, as mortes de tartarugas estão aumentando, e o motivo é um só: a ingestão de plástico devido ao lixo jogado nos oceanos. Nos últimos 10 anos, o número de tartarugas que apresentaram plástico no estômago cresceu de forma alarmante, informam os biólogos.