Durante a enchente de maio, um grupo que chamou atenção nos resgates foi o dos animais de estimação. Com o esforço de equipes de voluntários, pets foram salvos da água e, posteriormente, disponibilizados para lares temporários ou adoção definitiva.
Nesta reportagem, três histórias com final feliz serão mostradas. Uma delas sobre o reencontro de um cachorro com sua tutora em um abrigo e outras duas sobre bichinhos que conseguiram um lar confortável e amoroso, após passarem dificuldades na inundação. Também conversamos com quem estava do outro lado, realizando os resgates: a protetora de animais Paola Saldivia.
Renata foi amor à primeira vista
Eduarda Piltcher, 24 anos, moradora de Porto Alegre, não imaginava que, após trabalhar incessantemente como voluntária, receberia uma recompensa tão gratificante: um novo amor canino. A história começou quando a estudante de Relações Públicas, já no dia 2 de maio, começou a divulgar seu Pix para realizar grandes compras de mantimentos. Por ter carro, também fazia o transporte dos itens para os locais que estavam precisando. Entre eles, a Usina do Gasômetro, principal ponto de acolhimento de pessoas e animais que vinham do bairro Arquipélago, em Porto Alegre. Enquanto estava aguardando a entrega de uma compra grande de doações, a estudante ficou ajudando na área de pets do local, que contava com cem cachorros. Porém, de repente, um temporal se formou.
– Foi um caos. Então, todo mundo que tinha carro e estava se voluntariando começou a colocar os cachorros dentro dos seus carros. E nessas eu coloquei a Renata dentro do meu – descreve a estudante.
Nessa hora, porém, ela não conhecia os cães que abrigou em seu veículo nem imaginava que iria se apaixonar por um deles. Quando a chuva passou e a estudante pôde interagir um pouco mais com os pets, já notou seu apego pela cachorrinha Renata.
No entanto, ainda não tinha perspectiva de ficar com ela. O problema é que sua tia, com quem morava, não gostava de cachorros e não permitia a adoção de pets. Então, Eduarda resolveu encontrar um lar temporário para os dois bichinhos:
– Eu decidi que esses dois cachorros eu mesma ia dar um jeito de encontrar uma casa pra eles. E rapidinho, em menos de uma hora, eles já tinham um novo destino.
Reviravolta
Depois de encaminhar Renata para um lar temporário, Eduarda continuou se voluntariando. Contudo, após cinco dias, a estudante recebeu uma ligação de uma pessoa dizendo ter visto Renata quase sendo atropelada. Segundo ela, os responsáveis pela cadela a deixaram fugir.
Eduarda, então, pediu para que a pessoa que a telefonou informando sobre a fuga de Renata ficasse com ela e que forneceria o dinheiro necessário para manter a pet. No entanto, não obteve mais resposta. Indignada com a situação e com um desejo de fornecer amor e acolhimento para a cachorrinha, a estudante conseguiu uma castração gratuita para ela e convenceu seu pai a fazer um lar temporário. Por fim, atualmente, Eduarda está se mudando da casa de sua tia, justamente para ficar com Renata.
– É curioso quando me perguntam se ela sofreu muito, se sinto traumas nela, se demorou para se adaptar a mim. Quem nos vê juntas afirma, com toda certeza, que ela sempre foi minha. Ela me obedece muito, faz muita festa pra mim e tem um grude enorme comigo. Parece que sempre estivemos juntas – finaliza a estudante.
Adoção em família
A história de Larissa Segovia, 21 anos, é parecida com a de Eduarda. A principal diferença é que o amor que encontrou enquanto fazia voluntariado é felino. Na verdade, os amores. Isso porque ela levou uma gatinha recém-parida para casa, junto com seus quatro filhotes. A estudante de Medicina encontrou Mimi, que hoje se chama Milonga, enquanto fazia trabalho voluntário no gatil do Centro Vida, na zona norte de Porto Alegre. Lá, as veterinárias pediram para que alguém fizesse lar temporário para a gata, pois, a princípio, ela teria tutores. No entanto, a família não a procurou.
– A ideia, no início, era fazer um lar temporário para um animalzinho, não importava se fosse gato ou cachorro, e acabei voltando com cinco gatos para casa – conta Larissa.
Filhotes
Depois do período de adaptação dos filhotes, com cerca de um mês e meio, eles foram doados para outros lares, com o aval de uma médica veterinária que os examinou voluntariamente. Além disso, a estudante recebeu ajuda de uma cuidadora de gatos, “cat sitter” que, inclusive, doou alguns itens necessários como potes de ração e caixas de areia. Larissa descreve que as famílias para quem doou os animais são conhecidas e responsáveis, uma característica que prezou na hora da adoção.
– A veterinária fez um trabalho muito legal junto comigo. Ela veio aqui em casa, deu antipulgas para os gatinhos, pesou e fez o teste FIV FELV neles para que a gente pudesse encaminhá-los para a adoção. Agora, eles já foram doados para famílias maravilhosas, e estão em lares cheios de amor – comenta a estudante.
Milonga, então, ficou com Larissa e já está enchendo a casa de alegria. A estudante descreve a emoção que sente com sua nova filha e o companheirismo que as duas construíram, mesmo em tão pouco tempo.
– Ela é apaixonante. Nós somos muito apegadas. Foi uma coisa muito bonita, porque eu morava sozinha e, agora, tenho essa companhia maravilhosa dela. Virou minha família. Eu sempre digo que, na verdade, eles que fizeram minha casa ser um lar. Ela me ajudou na mesma proporção que eu ajudei ela – finaliza.
Reencontro via Instagram
A estudante de Jornalismo Brenda da Rosa teve que lidar com a angústia de se separar de seu cachorro, o Franguinho, e não saber seu paradeiro depois que deixou a casa de sua ex-companheira, no bairro Rio Branco, em Canoas.
Brenda e sua ex-namorada têm, ao todo, três animais: dois gatos e um cachorro de porte grande, de 22 quilos. Um dos gatinhos fica com Brenda, no seu apartamento no Centro Histórico de Porto Alegre. Já o cachorro e o outro gato ficam com a ex-companheira.
Tudo começou no dia 2 de maio, quando a estudante se dirigiu a Canoas para passar o fim de semana. À noite, começou uma movimentação estranha no bairro, de moradores saindo de suas residências. Para se proteger, elas se dirigiram até a casa da família da ex-namorada de Brenda, que tinha dois pisos. Na madrugada de sexta-feira, saiu a notícia de que o dique do bairro tinha extravasado. A partir daí, a família começou a se preparar para ficar ilhada, pois ainda tinham esperança de que a água não alcançaria a casa de dois andares.
Ao todo, contando os animais do casal e da família, havia seis gatos, dois cachorros e um porquinho da índia no imóvel. E a água não parava de subir. Então, elas pediram resgate para um amigo que estava realizando salvamentos com uma caminhonete alta. Apesar disso, elas tiveram que caminhar com a água acima do umbigo por mais de 500 metros, até encontrar um local seguro para embarcar no veículo.
Nesse momento, conseguiram levar dois gatos, pois os outros animais eram maiores e estavam inquietos por causa da movimentação.
– Passamos duas semanas e meia no apartamento da prima da minha ex-companheira no bairro Olaria, em Canoas. Durante esse período, tentei resgate para os animais que ficaram no segundo piso da casa. Tentamos em muitos grupos, voluntários, influenciadores. Consegui contato, inclusive, com a Luisa Mell (protetora de animais e influencer em São Paulo). Logo ela veio para cá e ficou ajudando nos resgates – diz Brenda.
Tentativas
O tempo foi passando e, no dia 10 de maio, Brenda conseguiu contatar um socorrista que tinha ido até sua casa para tentar salvar os animais, mas os cachorros estavam muito agitados e ele não conseguiu resgatá-los. Então, deixou ração e água para eles aguentarem mais um pouco.
No dia 13 de maio, a estudante conseguiu apoio de um barco voluntário para visitar os bichinhos. Nesse momento, ela conseguiu resgatar os outros quatro gatos e o porquinho da índia. Mas tomou um susto, pois não achou o Franguinho. Também não conseguiu levar o outro cachorro embora, porque estava muito agitado.
Após 15 dias de desespero e muita busca, um acalento surgiu em meio ao caos. Enquanto estava visualizando os stories de alguns abrigos de Canoas, Brenda reconheceu seu cão. Ela não sabe quem o resgatou nem como foi parar no abrigo. Porém, a sensação foi inexplicável, segundo a estudante, e foi como se tivesse recebido um presente de aniversário.
– A gente já tinha visto tantas fotos de amigos e conhecidos que enviavam achando que era ele, que fiquei meio insegura. Mas, quando vi a foto dele, tive certeza. Porque tinha tudo dele: as manchinhas no nariz, as patinhas brancas. Eu olhei cada canto da imagem, porque eu não queria que meu coração fosse quebrado. Foi muito forte ver ele. Ver que ele estava bem no abrigo da Ulbra foi um alívio. Eu tinha feito aniversário uns 10 dias antes, então considerei na hora como se fosse meu presente – relata.
Atualmente, o cachorro de Brenda ainda está no abrigo da Ulbra, em Canoas. O plano é que, assim que a família da sua ex-companheira se restabelecer, ele volte para onde morava. Um dos gatos da família e o porquinho da índia, infelizmente, não resistiram ao estresse e às condições que estavam antes de serem resgatados. Os outros bichinhos, porém, estão saudáveis e bem.
Mais de 300 resgates
A protetora de animais Paola Saldivia foi uma das pessoas que colocou o corpo na água para salvar animais. Segundo ela, durante o mês de maio, realizou cerca de 300 resgates. Ela conta que viu cenas desesperadoras, de bichinhos que poderiam ter sido levados na hora da evacuação, por conta dos seus portes pequenos, e que foram esquecidos.
Um dos seus relatos é sobre as portas que tiveram que ser arrombadas, em casas onde a água já estava na altura do pescoço. Nesses locais, os bichos ficavam nadando por horas até encontrarem alguém que os salvasse. Infelizmente, existem diversas complicações de saúde pós-resgate, e muitos não conseguiram sobreviver. Segundo Paola, assim que saíam dos barcos, os animais passavam por uma triagem. Aqueles que precisavam de atendimento eram encaminhados para clínicas veterinárias. Os demais iam para abrigos organizados pela própria protetora, em Canoas e Gravataí.
Resgatar qualquer animal não é uma tarefa fácil, é necessária paciência e resiliência para lidar com os bichinhos que, muitas vezes, estão agitados. Porém, Paola relata que resgatar gatos é ainda mais desafiador. Isso porque os felinos são muito desconfiados e podem ser ariscos.
Durante a enchente, por exemplo, eles pulavam de telhado em telhado, pois estavam assustados. No entanto, mesmo com essas dificuldades, a protetora conseguiu resgatar 30 gatos. Um dos casos que ela se lembra é de quando salvou 10 felinos que estavam no forro de uma casa, sem comer há algum tempo e muito debilitados, portanto, menos reativos.
Atualmente, Paola tem 29 anos, mas relata que sua história com a proteção de animais começou aos 21. Já o interesse pelos bichinhos vem desde quando era criança. Ela descreve que, durante a enchente, sentiu como se estivesse cumprindo sua missão e que poder levar os animais para um lar cheio de amor não tem preço:
– Eu senti como se eu realmente estivesse fazendo o meu dever. Eu tinha uma missão e, por conseguir concluir ela, eu sinto uma felicidade muito grande. A gente passou por muitas dificuldades, mas isso não tem nem comparação, era mais importante salvar os animais do que bens materiais.
Não acabou
Mesmo com a água tendo baixado na maior parte do Estado, o trabalho de Paola segue sendo muito necessário. Atualmente, a protetora está realizando as adoções dos animais resgatados na enchente. Cerca de 180 pets já foram encaminhados para novos lares.
Porém, ainda há muitos resgates e tratamentos acontecendo, de bichinhos que foram salvos da água, mas estão soltos pelas ruas.
– Estamos recebendo contato de animais que estão doentes por causa da água da enchente. Com leptospirose, esporotricose, pneumonia. Além disso, os resgates não param, porque muitos animais foram salvos, mas estão nas ruas. O foco agora, então, é castrá-los – avalia a protetora animal.
Quero adotar
- Se você quer adotar um bichinho que foi resgatado na enchente com a Paola Saldivia, contate o número de WhatsApp (51) 98646-6574. Para ver os bichinhos disponíveis, acesse a página no Instagram @paolasaldiviaprotetora
- Neste domingo, das 12h às 17h, o BarraShoppingSul (Avenida Diário de Notícias, 300 – Porto Alegre) recebe uma feira de adoção promovida pela Associação Cão da Guarda. A iniciativa ocorre no Setor D, Nível Guaíba, perto do Outback.
- O Shopping Total está hospedando uma feira de adoção estendida de gatos e cachorros. Duzentos animais ficarão expostos, diariamente, até 29 de julho, das 14h às 19h.
- O Shopping do Vale, em Cachoeirinha, recebe uma ação de adoção de animais nos dois dias do fim de semana, das 14h às 20h. O evento é realizado em parceria com a ONG Patinhas do Bem.
- A prefeitura da Capital realiza neste sábado, das 13h às 17h, uma feira de adoção de animais na Unidade de Saúde Animal Vitória (Usav), localizada na Estrada Bérico José Bernardes, 3.489, no bairro Lomba do Pinheiro.
- O abrigo de cães da Escola Estadual de Ensino Médio André Leão Puente, em Canoas, neste fim de semana, terá uma feira de adoção. O evento ocorre das 13h às 17h, na Rua Victor Kessler, 291.
- Neste sábado e domingo, o Park Shopping Canoas recebe uma feira de adoção do Abrigo Emergencial Pata Molhada. O evento ocorre das 11 às 18h, no piso L3 do ParkShopping Canoas, na Av. Farroupilha, 4545, Mal. Rondon.
- Neste sábado, das 11h às 17h, os animais abrigados no Hotel da Fenac estarão disponíveis para adoção. O evento ocorre na Rua Araxá, 755, no bairro Ideal.
- Promovido pela Secretaria de Proteção Animal (Sempa) de São Leopoldo, em parceria com a Central Animal Pet, o Arraial da Adoção continua neste sábado, das 11h às 19h, na Avenida Imperatriz, 45, São José, em São Leopoldo.
*Produção: Elisa Heinski