O Rio Grande do Sul passará, na virada de 2023 para 2024, o seu quarto réveillon seguido sob a vigência de uma lei que impõe um limite para o ruído dos fogos de artifício. A lei estadual 15.366 – aprovada em 2019 e regulamentada em 2020 – não proibiu a explosão dos fogos com barulho, mas determinou que as explosões são ilegais quando ultrapassam os cem decibéis.
A legislação diz ainda que a medição do ruído – para determinar se cada explosão é legal ou ilegal – deve ser feita a 100 metros de distância do explosivo.
A punição para os infratores, prevista na lei, é uma multa em dinheiro com valor entre 102 e 512 Unidades de Padrão Fiscal – o que, atualmente, corresponde ao montante de R$ 2.523,67 a R$ 12.667,85. O argumento é de que o artefato com estampido causa estresse em autistas, enfermos e em animais.
Proposta original proibia qualquer nível de ruído
A legislação sobre o tema é fruto de um projeto de lei da deputada Luciana Genro (PSOL). Originalmente, a proposta da parlamentar proibia a soltura de quaisquer fogos com ruídos.
Contudo, em plenário, foi aprovada uma emenda ao projeto, de autoria do então deputado estadual Tenente-Coronel Zucco (à época no PSL, hoje no Republicanos). A emenda liberou as explosões com ruídos, proibindo os fogos com barulho acima dos cem decibéis.
À época, a autora do projeto criticou a emenda que manteve a permissão para as explosões, argumentando que a mudança no projeto original dificultaria a fiscalização da lei.
"Fui contra a emenda, pois ela dificulta a fiscalização e o cumprimento da lei, mas caberá ao Poder Executivo tornar viável esta fiscalização”, disse Luciana, em 2019, à agência de notícias da Assembleia Legislativa.
Fiscalização cabe à Polícia Civil do RS
Em decreto de 11 de dezembro de 2020, o governador Eduardo Leite detalhou a aplicação da lei. A regulamentação do Palácio Piratini repassou para a Polícia Civil a responsabilidade de fiscalizar o volume de cada explosão de fogo de artifício no Estado.
“O órgão da Polícia Civil competente pela fiscalização das atividades relacionadas ao uso, ao emprego, ao depósito e ao transporte de produtos controlados, no exercício de suas atribuições relacionadas aos espetáculos pirotécnicos, solicitará que profissional habilitado responsável pelo evento informe os fogos de estampidos e de artifícios ou outros artefatos pirotécnicos que serão empregados e ateste que estes respeitam as limitações previstas”, diz trecho do decreto de Leite que regulamentou a lei.
Questionada por GZH, a Casa Civil do governo do Estado informou que, desde 2020, não houve qualquer regulamentação de lei que trate do assunto.
Polícia Civil diz que não há como fiscalizar
A Polícia Civil admite que não é possível fiscalizar todas as atividades relacionadas ao uso de fogos de artifício com ruído no Rio Grande do Sul. Citando o decreto que regulamentou a lei, o delegado Dinarte Marshall Júnior, responsável pela Divisão de Armamento, Munição e Explosivo da Polícia Civil (Dame), afirma que a penalidade é aplicada aos espetáculos técnicos e o decreto não menciona a aplicação em casos particulares e individuais de cada cidadão.
Segundo Marshall, as empresas precisam apresentar um plano para realização das atividades. Nessa proposta deve constar a contratação de um profissional especializado em pirotecnia e a apresentação de um alvará com certificado de registro do Exército. No entanto, ao ser questionado pela reportagem de GZH sobre casos individuais, o delegado disse não ser possível fazer a fiscalização e que, por isso, há a necessidade de fazer convênios com municípios para fazer o controle.
— Geralmente, são ações que podem ser feitas junto às secretarias de Meio Ambiente, por exemplo, para que os municípios façam as fiscalizações e auxiliem nos trabalhos. Para fiscalizar cidadão por cidadão, individualmente falando, a Polícia Civil teria que estar presente em cada local, com equipamentos para medir altura e som emitidos. É uma fiscalização humanamente impossível, quanto aos casos particulares. Não é proibido e não depende de alvará nesses casos. É difícil até quando envolve inúmeros eventos, por exemplo — afirmou o delegado.
Como ocorre em Porto Alegre e outras cidades
Em Porto Alegre, por exemplo, há uma lei complementar, de autoria do vereador Aldacir Oliboni (PT), que proíbe a queima de fogos de artifício com efeito ruidoso e estabelece penalizações e multas para quem descumprir a medida. Sancionado em março de 2021, o projeto não especifica, por exemplo, a quem cabe a responsabilidade de fiscalizar o volume das explosões.
Questionada, a secretaria municipal da Segurança (Smseg) da Capital informou, por meio da Diretoria-Geral de Fiscalização (DGF), que realiza ações de fiscalização nos locais de venda de artefatos pirotécnicos com o objetivo de coibir a circulação.
Conforme a pasta, a população pode contribuir com denúncias, protocoladas a partir do sistema 156 (telefone, site, aplicativo e WhatsApp). Também é possível denunciar o uso dos artefatos à prefeitura por meio dos mesmos canais ou no telefone 153, da Guarda Municipal.
Na Região Metropolitana, a prefeitura de Gravataí sancionou em maio deste ano um projeto que proíbe a utilização de fogos com estampido no município. O descumprimento da medida acarreta em multa para quem for pego queimando esses artefatos. A comercialização do produto, entretanto, não é proibida.
Em municípios da serra gaúcha, como Caxias e Farroupilha, vereadores aprovaram projetos de lei proíbem fogos de artifício com barulho. As medidas ainda não foram sancionadas pelas prefeituras e não há previsão para implementação.