Após mais de uma década de portas fechadas e plateia vazia, o tradicional Theatro Sete de Abril, em Pelotas, deve reabrir ao público até janeiro de 2023. Interditada pelo Ministério Público Federal em 2010, devido ao risco de desabamento do telhado, a casa de espetáculos teve sua cobertura e fachada restauradas nos últimos anos. A estrutura interna também foi recuperada, com algumas melhorias, e a expectativa da prefeitura do município é de que as últimas etapas sejam finalizadas já nos próximos meses.
Localizado em frente à Praça Coronel Pedro Osório, no centro de Pelotas, o teatro foi inaugurado em 2 de dezembro de 1834 e passou por diferentes reformas ao longo de sua existência. Uma delas em 1916, quando a fachada foi alterada – por isso, o prédio rosa hoje destaca as duas datas em seu exterior, logo acima dos três vitrais com as cores das bandeiras do Brasil e do Rio Grande do Sul. Em 1972, o local com capacidade para cerca de 530 pessoas foi tombado pelo Instituto de Patrimônio Histórico Nacional (Iphan), tornando-se Patrimônio Cultural do Brasil.
Conforme a prefeita de Pelotas, Paula Mascarenhas, depois da interdição, o Sete de Abril permaneceu fechado por três anos, até a aprovação do projeto de restauro e a conclusão da primeira fase, referente ao conserto da cobertura, que ocorreu entre 2013 e 2014.
— O telhado estava muito deteriorado e todo o teatro estava sendo prejudicado quando chovia. Então, fizemos a troca do telhado e fechamos aquela primeira parte do restauro. Mas precisava de toda uma recuperação interna e tivemos mais uma fase — explica.
Mas a aprovação do projeto para restauro interno só saiu em 2018, com obras iniciando em agosto de 2019 e sendo finalizadas em abril deste ano. Giorgio Ronna, diretor do Theatro Sete de Abril, afirma que a intervenção atual é a maior da história do local, mas que a estrutura continua igual a original em relação às cores e materiais utilizados – as exceções estão relacionadas aos acréscimos, como a instalação de um Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndios (PPCI) e de recursos de acessibilidade (elevador e plataforma que permite acesso de cadeirantes aos camarotes e ao palco, por exemplo).
Ao mostrar os avanços do restauro, Ronna enumera outras novidades: a antiga entrada de artistas e cenário, pela Rua Quinze de Novembro, que abrigava o memorial do teatro, foi coberta e receberá novamente os itens quando todo o resto estiver concluído. No mesmo espaço, foi instalado um reservatório de água que alimenta as mangueiras do PPCI e uma casa de máquinas. Já no centro da casa de espetáculos, foram incluídas uma estrutura metálica para mecanização da caixa cênica e estruturas para climatização.
De acordo com o diretor, a segunda etapa da climatização será feita depois da reabertura, que depende da instalação da caixa cênica e do mobiliário: poltronas serão colocadas na plateia, nos camarotes e nas galerias. Também falta finalizar alguns acabamentos, como o revestimento dos camarotes, e a reforma da rede elétrica – essas partes serão feitas com recursos próprios, aponta Ronna. Além disso, o teatro ainda não tem equipamentos próprios de som e luz, que não são essenciais para abrir as portas ao público, já que podem ser alugados.
— Os recursos cessaram nessa terceira fase, mas já temos uma parceria confirmada com a empresa Equatorial e entramos com um projeto na Lei de Incentivo à Cultura para colocar a caixa cênica e as poltronas. Acreditamos que até o final deste ano, talvez início de 2023, já possamos reabrir as portas do nosso teatro histórico — calcula a prefeita.
Na etapa da cobertura, foi gasto R$ 1,2 milhão e, no restauro interior da edificação, R$ 6,4 milhões. Para a última fase, o valor investido será em torno de R$ 2 milhões. Paula também destaca que a prefeitura buscou o apoio da iniciativa privada em função do longo período de fechamento do local, que tem uma importância nacional e é o mais antigo do Estado:
— É um patrimônio que precisa voltar a viver, é um equipamento cultural extremamente importante para a política cultural do município. Então, vamos trabalhar para levar o menor tempo possível para reabrir as portas.
Pintado com cores neutras e sem muitos ornamentos, o Sete de Abril também receberá de volta seu lustre, que está sendo restaurado pelos acadêmicos do curso de Conservação e Restauro da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e deve ser finalizado até dezembro. Já o piano do teatro foi restaurado em Brasília, pela Casa do Piano, e estará de volta ao município gaúcho em janeiro de 2023. Segundo o diretor Ronna, a casa já está recebendo agendamentos para o próximo ano pelo e-mail theatro.setedeabril@gmail.com.
Reabertura atrairá crianças e adultos, projeta diretor
Para o diretor Ronna, o que o Sete de Abril tem de muito especial, que sempre foi muito comentado pelos artistas e visitantes, é a acústica. Ele ressalta que todo o processo de restauro partiu de um laudo acústico, que norteou as intervenções e garantiu o resultado esperado: a acústica original também foi preservada.
— O Sete de Abril é um teatro em que artista e público estão sempre próximos, não importa o lugar em que a pessoa esteja sentada. É um teatro que permite a eficiência dos diálogos artísticos. Eu cresci fazendo espetáculo aqui, ensaiando, apresentando, então acho que ele tem a sua mágica, que é ter essa proximidade — comenta.
Ronna lembra que, na primeira edição do Festival de Teatro de Pelotas, em 1986, o público foi crescendo conforme o evento avançava e, na última noite, o número de pessoas foi tão grande que precisaram fazer duas sessões.
— O Sete é a cara de Pelotas e, quando está aberto, ele faz parte da rotina de todo mundo. Ele é um símbolo muito importante do protagonismo da cultura na cidade de Pelotas. É um espaço icônico, que faz parte da vida cultural de todos os cidadãos, então foi muito traumático esse fechamento por 12 anos. A população sente muita falta e vai ser uma grande felicidade devolver o teatro para a comunidade pelotense — afirma o diretor, ressaltando que já viu apresentações de Fernanda Montenegro, Cássia Eller e Denise Stoklos no local.
O diretor também aponta que o fluxo de grupos de teatro do Estado, do Brasil e do Exterior que vinham para Pelotas na década de 1980 foi muito importante para aquela geração, pois tiveram a oportunidade tanto de assistir espetáculos quanto de fazer oficinas promovidas no Sete de Abril. Por isso, acredita que reabertura do local representa não só a retomada de uma casa de espetáculos pública, mas também de um equipamento cultural capaz de oferecer profissionalização e conhecimento.
O teatro já tem um núcleo de dramaturgia ativo, fruto de uma parceria com o programa Sesc Dramaturgias, a partir do qual foram realizadas três oficinas desde o ano passado – duas virtuais e uma presencial –, com previsão de uma quarta edição presencial em setembro. Segundo Ronna, a expectativa é que esses núcleos sejam estendidos para além da dramaturgia, abrangendo dança contemporânea e cenografia, por exemplo.
Também serão feitos outros projetos, como uma série de residências artísticas no Sete de Abril, que vai promover três estreias por ano - uma de circo, uma de dança e uma de teatro -, a manutenção do programa Sete ao Entardecer, que abre as portas do teatro com uma programação semanal gratuita de música, dança, circo e teatro, e parcerias com a Secretaria Municipal de Educação, para que os jovens frequentem o local:
— Tem toda uma geração que nunca veio ao Sete, então vamos abrir com muito foco na infância e na juventude, porque também temos o dever de formar plateia. Tínhamos uma plateia formada em Pelotas até o fechamento e claro que as pessoas da minha idade vão voltar assim que o teatro reabrir, mas vamos trabalhar muito para que seja convidativo para essa geração de crianças e jovens que não puderam acessar o teatro.
Os festivais também serão retomados. Para 2023, a ideia é ter apresentações do Festival Nacional de Solos e do Dança Sul. Já o Festival de Teatro de Pelotas vai precisar de mais tempo de trabalho, então será retomado em 2024.