O segundo Dia dos Namorados em plena pandemia será de celebração especial para um tipo de casal surgido nos últimos meses: os apaixonados que ainda não sabem o que é pegar um cinema dividindo pipoca, nunca foram a uma cafeteria juntos e nem tomaram um chope ouvindo música ao vivo em um bar.
Eram programas típicos do começo de qualquer namoro, mas antes da covid-19. As restrições impostas pelo combate à pandemia tiraram da rotina ambientes como as salas de cinema, além de bares, cafeterias e restaurantes, que somente aos poucos começam a ter uma ocupação limitada permitida. Quem se conheceu já nesse cenário precisou de paciência e muita conversa.
Foi como Carolina Herrlein Tavares e Welington Fraga, ambos com 45 anos e moradores de Porto Alegre, levaram o relacionamento até este Dia dos Namorados, já com o mês de julho em vista: primeiro aniversário de namoro. O estopim foi em maio do ano passado, depois do "match" em um aplicativo de relacionamentos — para os ainda por fora dessa nomenclatura, é quando um curte o perfil do outro, estabelecendo a combinação que permite ambos conversarem.
— Começamos a conversar naquele dia. Era aquele pânico inicial da pandemia, e eu estava passando o tempo, me protegendo trancada em casa. E aconteceu de rolar papo desde o primeiro contato, passamos a primeira noite inteira conversando. Ficamos dois meses só pelo celular até criarmos coragem de marcar um encontro, com máscara e todos os cuidados, evitando local fechado e com aglomeração — lembra ela.
Carolina e o Welington seguiram a onda de plataformas como Tinder e Happn, que tiveram aumento nas interações durante o distanciamento imposto no mundo inteiro. Em abril, o Tinder divulgou ter alcançado o pico de usuários acessando por dia o aplicativo. Já levantamento do Happn identificou que a troca de mensagens em todo o mundo aumentou 20% desde o início das medidas de restrição.
Foram homens e mulheres em todo o mundo dando uma chance a esse novo meio de conhecer possíveis parceiros. Para a psicóloga, terapeuta de casais e família Fernanda Vaz Hartmann, essa opção deixou de ser motivo de constrangimento a partir da pandemia.
— As pessoas se abriram mais, romperam com tabus, com preconceitos, se autorizaram mais. E algumas dessas situações viraram relacionamento como nos modelos tradicionais. Algumas pessoas se dispuseram a preencher um perfil nos aplicativos, a ler o de alguém e realmente conversar. Tenho pacientes que se apaixonaram e começaram relacionamentos durante a pandemia, até porque seria muito tempo para ficar em stand by — diz ela.
Algumas afinidades ajudaram Carolina e Welington. Ambos têm três filhos homens, e só essa coincidência rendeu boas risadas e muita troca de experiência. Depois daquele primeiro encontro, ele lembra que começaram a frequentar um a casa do outro até passarem o verão juntos na praia.
— A gente acabou indo no embalo da pandemia mesmo, se cuidando, se privando de certas situações. O fundamental foi a conversa, a sintonia, fomos na contramão do corriqueiro. Conversamos muito antes de nos conhecermos pessoalmente, e a gente não sentiu falta de nada nesse começo, fluiu naturalmente — conta ele.
Tudo pelo sinal de internet
Patrícia Rangel Viana, 32 anos, e Diego DeLeon Vieira, 34 anos, também moradores da Capital, completam oficialmente um ano de relação no Dia dos Namorados. Pode se chamar a história deles de híbrida. Antes de março do ano passado, eles já tinham saído algumas vezes juntos. Mas a palavra namoro passava longe. Veio a pandemia, a restrição de atividades noturnas, e cada um poderia ter ido para o seu lado sem maiores ressentimentos.
— Em março de 2020, veio a pandemia. Trabalhamos em escola e fomos os primeiros a começar a trabalhar de casa. Ele usava a internet da casa da mãe dele, só que lá o sinal era bem ruim. Aí, ele passou a frequentar a minha casa, pois lá o sinal não caía. E no dia 12 de junho do ano passado, atualizou o status de relacionamento sem eu saber, fez surpresa na jantinha romântica que eu havia preparado — relembra Patrícia.
Perguntada se em algum momento acreditou na desculpa do sinal de internet, ela se limita a gargalhar. Mas faz questão de contar que o relacionamento não caiu do céu, a história foi sendo escrita dia após dia. E aquele "rolo" antes da covid-19 se fortaleceu.
A construção de vínculos na pandemia não surpreende outra profissional com experiência na área, a também psicóloga, terapeuta de casal e família Adriana Zilberman.
— O que vai realmente direcionar o que será construído nesse vínculo dependerá de muitas variáveis. Características de cada um, o quanto estão disponíveis para iniciar uma relação, por exemplo. São aspectos que vão ser atravessados também pela pandemia e suas consequências, mas não será isso só fundamental para o sucesso da relação — pondera ela, também diretora e professora do Centro de Estudos da Família e do Indivíduo.
Para casais que ainda precisam de um estímulo para dar um passo mais firme no relacionamento, a psicóloga Fernanda Vaz Hartmann faz um incentivo:
— Eu trabalho muito a questão da criatividade com os meus pacientes. Não dá para ir a um restaurante? Façam um piquenique juntos. Não tem danceteria aberta? Eu tenho um casal de pacientes que montou uma danceteria em casa, eles passam o sábado à noite dançando. Acho que vai muito da disposição das pessoas de criar situações agradáveis para a relação fluir.