Na contramão do que sugerem outras pesquisas e a crença popular, o uso exagerado de videogame, computadores e TV por crianças e adolescente não causa transtornos como ansiedade e depressão. Esta é a conclusão de um estudo realizado pela Universidade Federal do RS (UFRGS), Universidade de São Paulo (USP) e Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) que acompanhou 2,5 mil jovens de escolas municipais de Porto Alegre e São Paulo entre 2010 e 2014.
Os pesquisadores descobriram que o que ocorre é o inverso: eram as crianças com mais sintomas de transtornos mentais que exageravam no uso de telas. Ou seja, a mídia digital seria utilizada porque o usuário está ansioso, e não o contrário.
A pesquisa buscou coletar informações sobre o estado psíquico e investigar as trajetórias de cognição e saúde mental dos jovens. Para analisar essa relação, o grupo de pesquisadores realizou questionários com as famílias em dois momentos, entre 2010 e 2011 e entre 2013 e 2014. Ao tabular os dados, ficou claro que os jovens que já demonstravam sintomas de ansiedade e depressão na primeira amostra foram os que mais usaram as telas três anos depois.
— Quase todas as pesquisas que temos sobre uso de telas são por associação, ou seja, mostram quem usa as telas e como se sentem. Mas não conseguem deixar claro se o uso das telas é causa ou consequência de transtornos. Nossa pesquisa foi longitudinal, ocorreu ao longo de um período, por isso, conseguiu mostrar o que ocorre primeiro — explica Patrícia Bado, pós-doutoranda de Psiquiatria da UFRGS e participante do estudo.
A avaliação de Patrícia é que o uso das telas por jovens angustiados ocorra porque eles buscam a recompensa mais imediata nos videogames ou jogando pelo computador do que realizando outras atividades. No caso da televisão, jovens mais angustiados e deprimidos podem recorrer à tela como uma fuga da realidade.
Patrícia avalia que os resultados podem deixar os pais um pouco mais tranquilos nesta fase de pandemia, quando muitos não têm outra escolha a não ser deixar os filhos mais tempo em frente às telas do que pretendiam. Ou seja, isso não deve se converter em transtornos mentais, ainda que possa trazer outros prejuízos à saúde, como o sedentarismo e a dificuldade do sono.
O artigo fruto do estudo está em fase de preprint e é chamado de “Coorte Brasileira de Alto Risco para Transtornos Psiquiátricos”, do Instituto Nacional de Psiquiatria do Desenvolvimento (INPD). Nessa fase da pesquisa, não foram levantados dados relacionados a smartphones e tablets, que deverão estar em uma terceira rodada de perguntas, ainda a ser realizada.