É multiplicando milhões de vezes a fotografia da senhora de cabelo grisalho curto e olhos azuis que João Carlos Winck alimenta uma certeza inabalável há exatos oito anos. Depois de mais de 30 viagens pelo Brasil e nenhuma pista consistente sobre o paradeiro de Beatriz Joanna Von Hohendorff Winck, que estaria hoje com 85 anos, o mais velho dos quatro filhos da idosa de Portão, no Vale do Sinos, está lançando uma campanha em redes sociais para reencontrá-la.
Não se trata de mais uma tentativa, garante o técnico químico de 61 anos. Ele externa, outra vez, a sensação que guia sua perseverança desde 21 de outubro de 2012, quando a mãe sumiu dentro do Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, em Aparecida (SP):
— Meu sentimento é de que ela está viva. Vamos encontrá-la. Estamos muito perto disso.
Beatriz viajou ao interior paulista na companhia do marido, Delmar Winck, em um ônibus de excursão. Depois de escolher suvenires na Casa das Velas, perto da basílica, em um domingo em que o templo religioso estava repleto de fiéis, Delmar se dirigiu ao caixa, enquanto a esposa rumou para a porta, onde aguardaria até que ele concluísse o pagamento. Foi essa meia dúzia de instantes que marcou o início do tormento da família. Beatriz desapareceu na multidão.
No dia seguinte, João Carlos embarcou para Aparecida. Deu início a jornadas extenuantes com horas de caminhada. Abordava populares, distribuía cartazes com a imagem da mãe. Voltou ao Rio Grande do Sul depois de dois meses.
Pelos anos posteriores, ele continuou, também em outros Estados, a se enfiar em matagais, percorrer margens de rios, descampados, asilos, necrotérios. Contratou um detetive particular. Formou uma rede de contatos pelo país. Nada. Com a repercussão nacional que o caso alcançou, o filho não consegue entender como Beatriz jamais foi localizada.
Aos 90 anos, Delmar está com a saúde fragilizada. Desde o choque da perda da esposa, enfrentou, além da espera sem fim, um câncer e uma isquemia cerebral. Na residência do casal, caminha pouco e com grande dificuldade. Refaz, diariamente, o convite para João Carlos visitá-lo para tomar chimarrão. Pede:
— Traz novidades.
Sem resultados satisfatórios da investigação das autoridades, João Carlos procura quem pode auxiliá-lo. Agora, por indicação, chegou a Bruno Angos de Oliveira, 34 anos, desenvolvedor de sites e sistemas de Montenegro, onde o técnico químico trabalha. Ações em redes sociais não são o forte do currículo de Bruno, mas o jovem se comoveu com a situação. Criou site e página no Facebook, já com 13 mil seguidores. Junto das fotos mais recentes da idosa à época do sumiço, vê-se uma imagem envelhecida digitalmente, para dar ideia das possíveis mudanças em sua aparência.
“Minha mãe já andava com algumas perdas de memória, então acreditamos que ela possa ter entrado em algum ônibus para outra região do país. Ela pode estar em algum asilo, hospital ou até mesmo em uma casa, com um nome falso. A única certeza que eu tenho é de que ela segue viva, e eu sigo procurando por ela. Eu e meu pai continuamos com esperança de reencontrá-la”, diz o texto de apresentação, com o pedido para que se espalhe a hashtag #OndeEstaDonaBeatriz. O Instagram é outra plataforma utilizada.
Meu sentimento é de que ela está viva. Vamos encontrá-la. Estamos muito perto disso. Estou muito confiante. Ela não morreu. Ninguém teve coragem de matá-la.
JOÃO CARLOS WINCK
Filho de Beatriz
A publicação inicial, na última quinta-feira (15), contabilizava, até a manhã desta quarta (21), 101 mil compartilhamentos, 26 mil reações e 12 mil comentários. Os posts são direcionados para usuários da região de Aparecida e outros pontos onde surgiram indícios considerados mais críveis de supostas passagens de Beatriz. Pelo número de WhatsApp (51 99319-6591) vinculado à iniciativa, chega uma média de 500 mensagens diárias, grande parte com referência a fotos que circulam de outras idosas.
— Sempre agradeço a todo mundo. É com a melhor intenção possível que a pessoa está entrando em contato — relata Bruno. — Entrei de cabeça nisso. É muito complicado ficar tanto tempo afastado de quem você ama, sem respostas. A pior coisa é a incerteza: se está vivo, se está morto, se está bem, se não está — completa.
Os resultados de menos de uma semana de trabalho empolgam Bruno e João Carlos: mais de 7,8 milhões de usuários alcançados e 1,3 milhão de engajamentos (curtidas, comentários, compartilhamentos) com a primeira postagem.
Contatada por GZH, a Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo se limitou a enviar nota por e-mail, afirmando que as circunstâncias do desaparecimento foram investigadas, em inquérito policial, pela 5ª Delegacia de Investigações sobre Pessoas Desaparecidas, da Divisão de Proteção à Pessoa, do Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP). “Diversas diligências foram empreendidas pela equipe do DHPP para a localização da vítima”, diz o comunicado, em que consta a data em que o inquérito foi relatado (encerrado): 27 de novembro de 2018. “A denúncia do desaparecimento continua ativa no Banco de Dados de Pessoas Desaparecidas, da Prodesp (Companhia de Processamento de Dados do Estado de São Paulo), permanecendo a unidade da especializada atenta a novas informações sobre o caso.”
João Carlos, que certa vez se preparou para alugar um avião equipado com unidade de terapia intensiva (UTI) para a eventualidade de a mãe ser achada muito debilitada, conta que se esforça para levar uma vida normal:
— Mas é difícil, né? Você tem isso gravado na mente e está sempre buscando informações, sempre fica na expectativa, com o celular sempre do lado. Não consigo ter sossego.
O técnico químico anseia por novidades em breve, repetindo que o martírio do Winck se aproxima do fim.
— Estou muito confiante. Ela não morreu. Ninguém teve coragem de matá-la.