O Rio Grande do Sul possui cinco mil interessados em adotar crianças e adolescentes, segundo dados do Cadastro Nacional de Adoção. Atualmente, 4.879 estão em abrigos, mas apenas 620 podem, efetivamente, ser adotados. Desses, 348 (56,13%) pertencem a grupos de irmãos. São 346 meninos e 274 meninas. Em relação às idades, os dados de crianças e adolescentes pretendidos e os aptos para adoção são antagônicos. A maioria prefere crianças de zero a cinco anos, que é a minoria na fila de adoção. Cerca de 80% de quem está liberado pela Justiça para ter um novo lar têm entre 12 e 17 anos.
Os dados foram apresentados nesta sexta-feira (13), durante audiência pública promovida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul(TJ-RS) para marcar os 28 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que teve como tema Adoção Tardia e a Proteção Integral de Crianças e Adolescentes em Acolhimento Institucional.
Representantes de diversos órgãos envolvidos na chamada rede de proteção debateram, no auditório do Palácio da Justiça, em Porto Alegre, alternativas para agilizar as adoções. A juíza-corregedora do TJ-RS e coordenadora da Infância e da Juventude da corte, Nara Cristina Neumann Cano Saraiva, conta que um dos entraves para adoção está no próprio desejo dos interessados:
_ São 348 crianças e adolescentes que fazem parte de grupos de irmãos e essa é uma dificuldade, porque as pessoas, na maioria das vezes, prefere a adoção de uma só criança ou adolescente. E nós tentamos inserir os irmãos na mesma família.
Segundo Nara, para tentar uma solução a curto prazo, o Judiciário pretende lançar um aplicativo de celular que visa facilitar o acesso à informação pelos interessados em adoção.
_ Nele, os habilitados poderão visualizar essas crianças e adolescentes que estão aptos para a adoção a partir de vídeos, falas. Como forma de vencer a dificuldade que temos da adoção, quando o pretendente não visualiza. E quando ele não visualiza, ele indica perfil. E acaba indicando, na maioria dos casos, de zero a três anos.
O aplicativo, que é uma parceria entre Poder Judiciário, Ministério Público e Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), será lançado em 10 de agosto.
A promotora da Infância e da Juventude de Porto Alegre, Cinara Dutra Braga, diz que há necessidade de maior celeridade processual quando se trata de destituição do poder familiar e ressalta que o "tempo da criança não é o tempo do adulto".
_ Precisamos ser ágeis tanto na verificação se a família extensa tem condições de atender. Se não, que o processo tramite no prazo legal de 120 dias preconizado no Estatuto da Criança e do Adolescente. E quando for caso de adoção, que façamos o estimulo a que os habilitados à adoção conheçam crianças e adolescentes aptos que se encontram nos abrigos.
Muitos desses processos que deveriam ser encerrados em 120 dias levam anos, como destaca Cinara:
_ Aqui, em Porto Alegre, a nossa maior dificuldade é que as ações não tramitam. Depois de ajuizada a ação, ela em vez de tramitar pelos 120 dias, ela tramita por anos. Por que isso acontece? Muitas vezes porque os pais não são localizados, outras vezes porque se faz um investimento na família que não vai dar jeito. Faltam equipes técnicas suficientes para que façam os laudos no prazo razoável.
A corregedora-geral de justiça do TJ-RS, desembargadora Denise de Oliveira Cezar, admite que é preciso melhorar a estrutura do Judiciário para acelerar os processos e conseguir efetivar mais rapidamente as adoções. Como alternativa, ressalta a importância de decisões liminares permitindo adoções.
_ Se não enfrentarmos e colocarmos liminarmente aquelas situações que são de natureza irreversível, esses meninos e meninas vão acabar tendo a situação jurídica definida quando já passou o perfil ideal.
Para o titular do Juizado Regional da Infância e da Juventude de Santo Ângelo, juiz Luiz Carlos Rosa, a celeridade não deve ser apenas processual, mas de toda a rede de proteção.
_ Temos de chegar nas crianças e nos adolescentes no momento em que eles tenham o seu direito violado. Se isso for logo ao nascimento, temos de chegar lá e tomar uma providência. Isso é fundamental para que a gente não tenha tantas crianças e adolescentes que acabam ficando por anos nos abrigos.
José Luís Barbosa Gonçalves é presidente da Fundação de Proteção Especial. A entidade estadual possui abrigos para 400 crianças e adolescentes, em Porto Alegre. O acolhimento vai de bebês, passando por crianças e adolescentes com necessidades especiais, até jovens, de 17 anos, por exemplo. Gonçalves relata os reflexos da demora desses processos nos abrigos.
_ Tenho crianças que chegaram lá com quatro, cinco anos, seis anos e que estão com até 16 anos e ainda não foram adotadas, em razão dessa demora e também por falta de interessados no perfil. Tenho adolescentes que já foram desligados por atingirem a idade adulta e que ficaram por até 12 anos em acolhimento com grupos de irmãos que não conseguiram adoção.