A certa altura da aposentadoria, Mário Augusto Naujorks, 69 anos, se deu conta de que estava passando muito tempo atirado no sofá, assistindo a dois ou três filmes por dia na Netflix.
— Um absurdo. Muito tempo perdido. Tenho que voltar a estudar — constatou.
Empresário aposentado, Naujorks segue atuando como assessor imobiliário e corretor de imóveis, além de ter uma ativa rotina de exercícios físicos, mas sentia que faltavam atrativos para preencher seus dias. Acompanhar o neto pré-adolescente à escolinha de futebol lhe despertou uma paixão antiga e, a poucos meses de completar 70 anos, ele decidiu realizar um sonho: está cursando a graduação em Educação Física.
— Me sinto jovem ainda, motivado, encorajado, valorizado — descreve.
A idade não o impede de traçar mais planos a médio e longo prazos. Ex-jogador de futebol amador, Naujorks pretende trilhar uma nova carreira assessorando técnicos, garimpando talentos ou treinando a gurizada no futebol de campo ou no futsal.
— Tenho muito para contribuir. Meu foco é viver até os 90 anos com saúde mental e física. Acredito em aliar a experiência dos mais velhos e dos mais jovens. Com respeito, podemos trabalhar juntos, nos auxiliar e somar — afirma o aluno de primeiro semestre do Centro Universitário Fadergs.
A psicóloga Simone Bracht Burmeister, mestre em Gerontologia Biomédica e coordenadora do Núcleo Longevidade do Centro de Estudos da Família e do Indivíduo (Cefi), trabalha com preparação para a aposentadoria. Continuar ativo após a parada na trajetória de trabalho, ela frisa, é extremamente importante.
— Aposentar-se da carreira principal não é se aposentar da vida e de outros sonhos e desejos. É muito importante continuar com planos. Enquanto temos objetivos, estamos vivos, saudáveis, buscando — afirma Simone. — O que ele (Naujorks) está fazendo é superpositivo: realizar um sonho, descobrir algo novo — aponta.
Simone é professora e costuma testemunhar, em sala de aula, os inúmeros benefícios da convivência entre diferentes faixas etárias.
— Precisamos trabalhar mais a questão intergeracional na nossa sociedade. Isso vai gerar uma aceitação maior dos idosos. Cada vez mais, vamos precisar nos acostumar e interagir com diversas idades. O conhecimento, o histórico dos mais velhos contribui muito para os mais jovens, assim como a agilidade de pensamento, a criatividade e a inovação dos mais jovens ajuda as pessoas idosas — comenta a psicóloga.
Eliane Monken, pedagoga, professora e especialista em Avaliação Educacional e Metodologia do Ensino Superior, também vê vantagens para todos os envolvidos essa convivência.
— A troca de experiências e a socialização auxiliam na aprendizagem. O idoso que chega à faculdade terá desafios novos. Isso será saudável para o processo de envelhecimento dele e para os jovens também, que vão ouvir uma pessoa extremamente experiente, trocar ideias sobre a vida e habilidades socioemocionais — observa Eliane.
Desafios também se apresentam ao novato, ressalta a pedagoga. Se o idoso nunca fez uma graduação antes ou está há décadas longe dos bancos escolares, necessitará de um período de adaptação. A rotina de estudante inclui leituras, horas de concentração para estudar, realização de provas e atividades em grupo, apresentação de trabalhos. Aspectos tecnológicos do cotidiano também podem ter impacto, considerando-se as habilidades de cada um.
— O estudante vai precisar construir algumas habilidades que ficaram adormecidas, se organizar no tempo, fazer um cronograma. Pode ter uma dificuldade ou outra, mas, se for empoderado e ativo, vai superá-las com ajuda dos professores e dos colegas — afirma Eliane.
Hoje em dia, o ensino não é unilateral nem individual, destaca a pedagoga. Trata-se de um trabalho coletivo. A idade é apenas um detalhe.
— Não vamos olhar o aluno idoso, com 70 anos. Vamos olhar o aluno. Um sujeito de direitos, com capacidade de aprender. Não existe isso de “as pessoas não aprendem”. As pessoas aprendem dentro das suas possibilidades. Quem dera tivéssemos mais idosos na sala de aula — conclui Eliane.