Se um marciano baixasse na Terra e lesse as notícias, teria certeza de que Donald Trump só começou a postar barbaridades nas redes sociais na quarta-feira passada. E se esse ET fosse descolado, aplaudiria a coragem e o espírito democrático do Twitter, do Facebook e do Instagram, que decidiram bloquear o ainda presidente dos EUA depois que o Capitólio foi invadido.
Balela, das mais baixas, oportunistas e covardes.
Faz bem mais de quatro anos que Donald Trump publica mentiras, agressões e declarações absurdas em suas contas. Agora, quando faltam duas semanas para que ele deixe o poder, as grandes artífices do capitalismo de vigilância decidiram, subitamente, que a postura de Trump é inaceitável. E resolveram, mas só depois de terem certeza de que ele deixará mesmo a Casa Branca em breve, bancar as defensoras da paz, da harmonia e dos bons modos online.
É muita hipocrisia.
Se essas mesmas redes sociais assumissem, de fato, a responsabilidade pelas trilhões de mentiras e incitações ao racismo e ao ódio que deixaram publicar nos últimos anos em suas plataformas, talvez o mundo hoje fosse diferente – e bem melhor. Facebook e Twitter nasceram como ideias maravilhosas. Espaços abertos, sem porteiro nem autoridade central, nos quais as pessoas poderiam interagir livremente. Na prática, confirmou-se a tese de que festa open house, sem porteiro e sem regras, se transforma em porre e em quebra-quebra. Essas gigantes da desinformação até andaram promovendo alguma pirotecnia para fazer de conta que controlam o que não podem e não querem controlar, porque isso destruiria a essência do eu ganhão pão. Se algo de fato aconteceu para tentar organizar a bagunça, foi por conta da pressão das pessoas, das instituições civis, dos parlamentos e dos governos, que aprovaram legislações sobre defesa da privacidade na internet.
O que as redes sociais fizeram ao bloquear Trump no calor dos acontecimentos nada tem a ver com a real defesa de democracia. Foi apenas um afago nos novos donos do poder. Desculpe, ET, por quebrar o encanto.