Importante debater o passado. O aniversário da eclosão do movimento militar de 1964 é mais uma oportunidade. Mais uma oportunidade, até agora, perdida. A discussão parece um cabo de guerra, daqueles que a gente fazia na quinta série. "Foi golpe", "não foi golpe".
Construir uma nomenclatura única é impossível, ainda mais quando, no eco de uma eleição polarizada e passional, cada um só está preocupado em ter razão. Mais produtivo seria tentar entender o que aconteceu naquela época. Por que a capacidade de dialogar e de construir consensos mínimos foi perdida? Por que as relações sociais e institucionais foram desmoronando, até o ponto em que restou o uso desproporcional da força? Parece o Brasil de hoje? Pois é. É sobre isso que deveríamos conversar e não sobre carimbos reducionistas e rasos.
O nível de irracionalidade só é tão grande porque o Brasil nunca conseguiu sentar, desarmado, para para conversar sobre as dores e os exageros de uma época que ainda não acabou. A disputa de narrativas só empurra cada lado mais para o extremo e nada constrói.
A esquerda de 1964 era tudo, menos democrática. Não lutava pela liberdade, mas sim pela afirmação de uma ideologia. O mesmo acontecia com o outro lado. Era o medo do comunismo contra o ódio ao capitalismo. Quem tinha razão? Perdemos a perspectiva de que éramos, então, apenas uma peça no tabuleiro de um jogo muito maior, o da Guerra Fria.
Serve de consolo, no meio do berreiro, o fato de que o processo histórico continua. Hoje, os sinais são claros: precisamos de mais tempo para, com serenidade e espírito construtivo, passar a limpo o país, em vez de apenas produzir mais sujeira.