Jair Bolsonaro não acredita em partidos. Nem no dele, o inexpressivo PSL, ao qual nunca se refere. A única sigla que merece sua atenção permanente é o PT, mas sempre no esforço de desconstrução.
A maior prova de que Bolsonaro despreza os partidos tradicionais é a forma como vem conduzindo a formação da chamada "fatia civil" do seu Ministério. Suas conversas e indicações estão vinculadas às frentes parlamentares, passando por cima dos caciques.
Bolsonaro deixou claro que a escolha da ministra da Agricultura, deputada Tereza Cristina, foi articulada com a frente que representa o setor na Câmara. Foi da frente evangélica a pressão por um ministro da Educação mais alinhado com suas ideias.
Há pelo menos quatro frentes fundamentais na construção do apoio do futuro governo no Congresso: a evangélica, a do agronegócio, a da segurança/militar e a da saúde. A estratégia de Bolsonaro é original e arriscada. Pode ser lida como um teste para o poder das antigas lideranças no Congresso, algumas delas reeleitas. Resta saber como reagirão e qual é, ainda, o seu real poder.
Durante a campanha, Bolsonaro não poupou críticas à política e aos políticos tradicionais. A forma de atuar na construção do governo é coerente com o discurso. Mas, paradoxalmente, repete o mecanismo de trocar cargos por apoios. Muda apenas os interlocutores, abandonando os partidos e negociando com bancadas suprapartidárias que defendem interesses específicos em vez de programas genéricos.
Mais do que uma tentativa de subversão da ordem consolidada em Brasília, a engenharia do Ministério que tomará posse em janeiro é uma prova de que Bolsonaro vê com desprezo a estrutura política brasileira, apodrecida e contaminada pelo descrédito e pela corrupção, mas que compreendeu, por outro lado, que é fundamental negociar. Se vai funcionar, saberemos logo, quando os primeiros projetos no novo governo chegarem ao plenário da Câmara.