Dos 19 filmes inéditos trazidos ao Brasil pelo 15º Festival Varilux de Cinema Francês, pude assistir a cinco antecipadamente. O mais imperdível de todos é O Sucessor (Le Successeur, 2023), que tem mais oito sessões em Porto Alegre. No Cinesystem do Bourbon Country, será exibido nesta sexta-feira (8), às 15h55min, dia 11, às 14h, dia 14, às 18h20min, e dia 19, às 21h; no Cineflix do Shopping Total, dia 13, às 19h55min, e dia 15, às 16h; na Cinemateca Paulo Amorim, dia 14, às 19h15min, e dia 19, às 19h. Para conferir datas, horários e salas de Caxias do Sul, Pelotas e Rio Grande, consulte o site variluxcinefrances.com/2024.
O diretor de O Sucessor é Xavier Legrand, que concorreu ao Oscar de curta-metragem por Avant que de Tout Perdre (2013). Seu primeiro longa, Custódia (2017, disponível para aluguel em Apple TV), recebeu o Leão de Prata de melhor direção no Festival de Veneza, o prêmio da Mostra de São Paulo para títulos estrangeiros e o César (da Academia Francesa) de melhor filme e de roteiro original, escrito pelo próprio Legrand. Se em Custódia o cineasta examina a disputa de uma mãe e de um pai pela guarda do filho, em O Sucessor ele coloca um filho a lidar com segredos paternos.
O filme é baseado no romance L'Ascendant (2015), de Alexandre Postel, e tem como protagonista Marc-André Grondin, visto em C.R.A.Z.Y.: Loucos de Amor (2005) e em O Declínio (2020). O ator interpreta Ellias Barnès, um estilista recém alçado ao cargo de novo diretor artístico de uma renomada grife francesa.
Ao saber que seu pai, com quem não mantinha contato há muitos anos, faleceu de ataque cardíaco, ele viaja para o Canadá. Quer resolver questões da herança e saber se também herdou alguma doença. Na casa do pai, o estilista fará uma descoberta desconcertante. Simultaneamente, passa a ser constantemente visitado por um vizinho dado a diálogos ambíguos, Dominique, papel de Yves Jacques, ator do diretor Denys Arcand em O Declínio do Império Americano (1986), As Invasões Bárbaras (2003), O Reino da Beleza (2014) e Testamento (2023).
A cena em que Ellias e o espectador descobrem o segredo terrível guardado pelo pai é um dos momentos mais impactantes da temporada, realçado pela ótima atuação de Grondin. Por isso, convém não revelar seu teor.
Legrand foi um dos artistas que vieram ao Brasil para falar com a imprensa sobre as atrações do Festival Verilux. Na tarde de quarta-feira (6), no hotel Fairmont Copacabana, no Rio, ele concedeu a seguinte entrevista a Zero Hora.
Como surgiu a ideia de fazer O Sucessor?
Eu descobri o livro e quis adaptar porque queria falar que o patriarcado também esmaga os homens, e como a violência se transmite.
Por que o protagonista, que é um vendedor de celulares no livro, no filme se tornou um estilista?
Escolhi o campo da moda porque queria colocar o personagem num pedestal, para que, quando ele caísse, fosse de um lugar muito alto. E no meio desse cenário há aquele catálogo de fotos de modelos que se reflete mais adiante (evitarei spoilers). Há outros ecos, que podem ser encontrados ao assistir de novo ao filme.
A cena da revelação desconcertante do filme se torna ainda mais impactante por causa da reação do personagem encarnado por Marc-André Grondin. Foi uma revelação para o ator também? Manteve segredo para ele?
Não, não, não. Nós ensaiamos bastante, nos preparamos muito, porque a cena demanda fisicamente tantas coisas, que nós realmente planejamos cada instante.
A gente valoriza o coragem, mas os homens também podem ter medo, se arrepender, não fazer as coisas que devem ser feitas.
Ellias tem a oportunidade de revelar o segredo do pai, mas ele hesita e, por fim, se atola numa areia movediça do campo moral, mesmo que não amando o pai. Acho que a reação que ele toma é a que muitos nós tomaríamos, não? Parece que mesmo a gente sabendo o que é o certo, quando há uma relação familiar bate uma espécie de instinto protetor.
Estou, efetivamente, bem surpreso com o que você diz, porque eu penso assim, mas, na França, muitas que rejeitam o filme têm convicção de que eles não fariam como Elias. Porém, é comum, por exemplo, você ir ao metrô, ver uma agressão e não intervir. Há espectadores que saíram do cinema antes de acabar o filme, dizendo "Eu teria chamado a polícia".
A moral do filme é que não devemos mexer nas gavetas e nos armários dos pais?
O meu trabalho, o meu papel de diretor não é dar uma lição de moral. A gente valoriza o coragem, mas os homens também podem ter medo, se arrepender, não fazer as coisas que devem ser feitas.
(*) O colunista viajou ao Rio a convite da organização do 15º Festival Varilux de Cinema Francês
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