Na comparação com os outros quatro indicados ao Oscar de melhor filme internacional, A Sala dos Professores (Das Lehrerzimmer, 2023) pode ficar escondido diante da proeminência de Zona de Interesse, concorrente em outras quatro categorias, incluindo a principal e a de direção; da urgência do tema de Eu, Capitão, retrato da odisseia dos imigrantes africanos que tentam atravessar o Mediterrâneo em busca de uma vida melhor na Europa; do sucesso de público alcançado por A Sociedade da Neve, que em poucos dias se tornou um dos 10 títulos em língua não inglesa mais vistos na história da Netflix; e da fama de Wim Wenders, cineasta alemão que assina o belíssimo representante do Japão, Dias Perfeitos.
Mas A Sala dos Professores merece tanto ou mais visibilidade. Em cartaz no Espaço Bourbon Country e no GNC Moinhos, é um filme que deveria ser tema de aula — e de casa também.
Trata-se do candidato da Alemanha, país que vem apresentando uma invejável frequência no Oscar internacional. Nas últimas 22 edições (contando 2024), competiu 10 vezes e teve três longas-metragens premiados: Lugar Nenhum na África, de Caroline Link, em 2003; A Vida dos Outros, de Florian Henckel von Donnersmarck, em 2007; e Nada de Novo no Front, de Edward Berger, no ano passado. Os alemães também ganharam em 1980, com O Tambor, de Volker Schlöndorff.
Quem dirige e coassina o roteiro de A Sala dos Professores é Ilker Çatak, 40 anos, de ascendência turca. A exemplo do que fez o cineasta francês Laurent Cantet em Entre os Muros da Escola (2008), vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes, o diretor alemão transforma um colégio em microcosmo da sociedade contemporânea, com suas tensões e suas doenças.
A protagonista é interpretada por Leonie Benesch, 32, coadjuvante em outro filme alemão indicado ao Oscar, A Fita Branca (2009), e vista na pele de Greta Overbeck na série Babylon Berlin (2017-). Sua personagem, a idealista Carla Nowak, ensina matemática e educação física para alunos do sétimo ano. Recém-chegada à escola, a professora logo entrou em sintonia com a turma — vide a saudação que todos fazem no início de cada aula. Mal começa o filme e surge o conflito que provocará desarmonia: o colégio vem sendo cenário de uma série de furtos.
O principal suspeito é um aluno de Carla, Ali, filho de imigrantes. Mas a professora sabe, por experiência própria, que pelo menos duas pessoas adultas estão surrupiando dinheiro de carteiras ou daqueles porquinhos em que depositamos moedas. A protagonista resolve investigar a situação. Suas intenções parecem certas, mas a cada passo afunda em uma espécie de areia movediça do campo da ética.
Por trafegar pelo gênero do mistério policial, A Sala dos Professores requer discrição quanto aos rumos tomados na trama. O que se pode dizer, sem medo de estragar surpresas e com o desejo de enaltecer qualidades, é que o filme consegue atiçar a curiosidade do espectador ao mesmo tempo em que o incita a refletir sobre questões variadas, algumas perenes e outras candentes: as dinâmicas de poder, as desconfianças mútuas, os direitos de privacidade, os limites tênues entre o certo e o errado, a política da desinformação e a fragilidade da verdade, a censura, a cultura do cancelamento, a xenofobia, o bullying, o corporativismo, a perda de autoridade da figura do professor e a intromissão dos pais na escola.