Por dever profissional, tenho de assistir a um filme até o fim antes de comentá-lo. Mas já quebrei essa regra: achei a violência de The Spirit (2008) tão insultante em comparação ao lirismo dos quadrinhos de Will Eisner, que saí do cinema no meio da exibição da adaptação dirigida por Frank Miller. Repeti a dose agora, com Esquadrão 6 (6 Underground), que estreou na sexta-feira (13) na Netflix.
Não faltou boa vontade, afinal, curto o estilo canastrão cínico do ator Ryan Reynolds e já me diverti bastante com as extravagâncias dirigidas por Michael Bay (especialmente as do início de sua carreira, como Bad Boys e A Rocha – mas admito que passo longe da franquia Transformers).
E não faltou empenho nem dinheiro do lado de lá – Esquadrão 6 custou US$ 150 milhões, orçamento semelhante ao de alguns blockbusters da temporada cinematográfica, como Capitã Marvel e Homem-Aranha: Longe de Casa, e pode-se intuir, a julgar pelo que aparece em cena, que direção e elenco se divertiram fazendo essa montanha-russa globalizada (visita a Europa, os Estados Unidos, a Ásia...).
Mas não rolou.
Quer dizer, minha relação com esta salada que mistura Missão: Impossível, Os Mercenários, Velozes & Furiosos e o Universo Marvel começou como se fosse uma fulminante paixão à primeira vista. Os 15 minutos iniciais são realmente alucinantes. São Michael Bay no auge, mostrando sua habilidade para criar cenas de ação que nos fazem acreditar que são verdadeiras e duvidar sobre a integridade física dos atores e dublês envolvidos. Eu fiquei de queixo caído, hipnotizado durante toda aquela perseguição automobilística pelas ruas de Florença, na Itália, onde conhecemos os principais personagens e o básico da história: o astro de Deadpool interpreta um bilionário que financia uma supertime formado por "fantasmas", homens e mulheres que forjaram a própria morte para ficarem livres (seja lá do que for).
O primeiro passo é abandonar as próprias identidades, portanto, eles só se chamam por números. Ryan Reynolds é o Um, Mélanie Laurent (a heroína de Bastardos Inglórios) encarna a Dois, uma ex-agente da CIA, Manuel García Rulfo (do remake de Sete Homens e um Destino) vive o Três, um assassino de aluguel, Ben Hardy (o Anjo de X-Men: Primeira Classe) faz o Quatro, mestre do parkour, Adria Arjona (a Emily da segunda temporada de True Detective) é a Cinco, uma médica, e Dave Franco, Seis, o motorista.
Em ritmo de videoclipe, com o emprego de umas três ou quatro músicas na trilha sonora e de letreiros à la Quentin Tarantino, todos são apresentados à medida que seus talentos especiais são requisitados. Quatro, por exemplo, está no alto da Catedral de Santa Maria del Fiore, o duomo de Florença – sim, ele vai descer fazendo parkour! Cinco precisa extrair uma bala do corpo de Dois enquanto a ferida atira nos inimigos e enquanto Seis dirige em alta velocidade – perdi as contas de quantos bandidos morreram e quantos carros devem ter sido destruídos ao longo dessa sequência, que rende momentos de humor macabro (como quando um olho humano vai parar dentro do veículo) e ação surrealista (como quando, em câmera lenta, os mocinhos precisam desviar de uma mãe e seu bebê).
Eu poderia passar horas tentando, sem sucesso, descrever como são delirantes esses 15 minutos iniciais, mas não consegui passar muito mais tempo assistindo a Esquadrão 6. Vi o suficiente para saber que a missão do grupo será derrubar o ditador de um país fictício da Ásia, o Turgistão, e colocar no poder um suposto democrata – ou seja, algo que já se viu trocentas vezes (inclusive na vida real...). Vi o suficiente para me sentir cansado diante de tanta pirotecnia, tanta velocidade e tanta gritaria – este é um pecado de Michael Bay, ele abusa das explosões a ponto de, em vez de impactar, anestesiar o espectador. É uma overdose de adrenalina. E, quando as luzes se apagam e o barulho cessa, os diálogos clichê e o parco desenvolvimento dramático dos personagens transformam o estado de torpor em sonolência. Pode ser que, com a overdose de adrenalina, seja difícil dormir, mas pelo menos você ainda terá ânimo o bastante para escolher outro filme.