Aos 34 anos, Fernanda Pandolfi já foi e voltou muitas vezes. De países visitados, soma 62. Na primeira viagem ao Exterior, aos 18 anos, passou seis meses em Nova York. Seriam muitas outras andanças até a volta ao mundo que traçou no ano em que completou três décadas de vida, num roteiro de 270 dias por 37 países, em cinco continentes. E é dos encontros vividos ao longo desses nove meses que trata o livro Quem é a Estrada?, o primeiro da jornalista nascida em Passo Fundo, casada com o consultor de negócios Felipe desde 2019.
Criadora da plataforma de viagens Ida e Volta, professora na ESPMSul e coordenadora da FP Ideação em Mídias Sociais e Mentoria em Digital Branding, Fernanda mantinha uma coluna em ZH quando decidiu pedir demissão, em 2017, e fazer a jornada que, em suas palavras, a reconectaria consigo mesma. Ficou tudo registrado no blog e nas redes sociais, mas o livro que ela lança nesta quarta-feira, em Porto Alegre, demorou a tomar forma. E é na primeira parte da obra, no capítulo que leva seu nome (todos são identificados com o nome ou característica de alguma pessoa), que ela avisa:
— Se você esperava a história de uma volta ao mundo, sinto decepcionar. Esta é uma história sobre uma volta em uma pessoa.
Por que a escolha do título?
— Quando saí para viajar, em 2017, fui sozinha. Achava que ficaria muito sozinha na viagem, em busca de autoconhecimento. Mas aí fui encontrando pessoas. A construção do livro é toda baseada nesses encontros, nas pessoas que foram constituindo essa estrada até eu achar "quem era a estrada". Descobri que as pessoas iam me mostrando os caminhos. Às vezes eu mudava o roteiro, às vezes um lugar era muito legal por que eu tinha uma companhia ou alguém me mostrava um roteiro diferente. Descobri que a estrada é muito mais feita por pessoas do que por lugares, principalmente quando tu estás num "mochilão". O mochileiro é abraçado pela estrada e pelas pessoas. Foi difícil chegar ao título, ficamos pensando em algo que conectasse com todas as pessoas que fui encontrando e nortearam o caminho. A interrogação serve para não entregar muito o ouro.
Que mudanças a viagem de volta ao mundo provocou em ti?
— Principalmente na questão da insegurança e da vaidade. Minha carreira teve um início muito rápido, eu tinha uma coluna, estava em evidência. Mas não tanto por isso, mais pelas conexões que eu fiz ao meu redor e que me distanciaram da Fernanda que eu era. Muita gente me dizia que eu ia voltar diferente da viagem, mas eu acho que voltei na minha versão original, me resgatei. Não voltei com muitas certezas do que queria, mas do que não queria mais para mim.
Voltar foi difícil?
— Voltar não é difícil, chegar é mais difícil. Acho que a gente sempre tem de ter um lugar ou para quem voltar. Nunca pensei em morar em outro lugar que não fosse o Brasil, que é o meu país, a minha casa. Pra mim isso é importante, a origem, as raízes. Foi algo que eu aprendi na estrada. Mas o chegar é difícil, ver tudo o que passou, ainda mais quando tu voltas de uma viagem que fez sozinha.
O jeito de viajar mudou?
— Minha primeira viagem internacional foi aos 18 anos, quando fui morar em Nova York, levei duas malas, um monte de roupa e um roteiro todo organizado. Hoje, sou uma viajante que acredita que o roteiro pode abortar parte da experiência, que é ter mais surpresas, viver mais o local, encontrar as pessoas. Hoje, vou com muito menos medo, experimento de tudo, viajo com bem menos coisas e com desapego de roteiros.
Os destinos mudaram?
— Acredito muito no amadurecimento do viajante. A gente começa por destinos no Brasil, depois para o Exterior, Estados Unidos, Europa... Aí quando tu avanças para Ásia e África entra aquela viagem mais espiritual, cultural, mas que tem muito de perrengue também. A gente está num lugar muito diferente, se desacomoda do lugar-comum, da alimentação, da religião, de tudo. Hoje, gosto muito da Ásia, há vários lugares que ainda quero conhecer na Ásia e tem de ter esse lado espiritual. Não se trata de religião, mas de energia, de conexão, comigo e com o ambiente.
Para as mulheres, viajar sozinhas ainda é um problema. Como tu encaras isso?
— Quando saí para a volta ao mundo, estava meio despreparada, eu não me muni o suficiente de informações e não tinha essa preocupação. Até então tinha entrado pouco em lugares onde a cultura do machismo é mais presente. Fui muito assediada na Turquia, homens questionavam muito porque eu estava viajando sozinha, porque eu tinha 30 anos e não era casada, fiquei bem desconfortável. A partir daí comecei a me cuidar mais, não saía mais à noite, me informava muito a respeito da vestimenta, da cultura, procurei respeitar muito isso, em respeito às mulheres do lugar. Tem vários impeditivos no caminho, bate medo, mas não é algo que deve impedir as mulheres de viajar. Tem grupos que podem ajudar, dá para buscar um guia, uma agência.
Como foi o processo de escrita do livro? Revisitaste anotações?
— Essa viagem também foi muito importante pra me reconectar com a escrita. Durante a viagem, escrevia duas vezes por semana, no blog Ida e Volta, onde ficou tudo arquivado. Eu tinha planos de escrever o livro. Mas logo que voltei, em 2018, acabei engolida pelo trabalho novo, que era muito legal, numa área comercial. Ficou tudo engavetado e, cada vez que eu tentava, não conseguia. Quando chegou a pandemia, achei que era o momento. Uma amiga sugeriu que eu procurasse alguém para me orientar nesse processo e me ajudasse na construção. Eu escrevi a amarração, basicamente o início e o fim, porque o meio estava quase pronto. Os textos foram revistos, alguns reescritos, outros eu adicionei ou tirei. Selecionei lugares-chave. Revivi tudo, vasculhei o que tinha escrito. Remexi em alguns pontos doídos, mas foi bom.
Por que foi difícil escrever?
— O que torna mais difícil essa escrita é ela ser autobiográfica. Quando se trata das outras pessoas, tenho uma preocupação imensa com o que escrevo, mas quando é a tua história, tu te expões demais. É diferente da exposição nas redes sociais, que é seletiva. Tornar a própria dor pública é um processo mais complicado, mais doído.
Para onde foram as viagens após a volta ao mundo? Como ficaram com a pandemia?
— Na volta ao mundo, criei um grupo chamado Gurias a Bordo, com a agência Diário de Bordo, que leva mulheres para lugares onde não se sentem seguras. Esse grupo se solidificou. Depois, fomos para Marrocos, Jordânia, Egito, fiz uma caminhada ao Cabo da Roca, em Portugal, e revisitei a Disney, com a família. A última viagem, antes da pandemia, foi a lua de mel, para a Polinésia Francesa, no final de 2019. Tinha várias viagens marcadas, que foram canceladas, mas viajei muito no RS e fui à Bahia. Gostaria de ir para a Costa Rica.
Quem é a Estrada?
- De Fernanda Pandolfi. Editora Vienense, 256 páginas, R$ 59,90
- Lançamento e sessão de autógrafos dia 15/12, das 17h às 20h, no Piazza Navona by Intercity (Av. Independência, 813, na Capital)
- A partir do dia 16, disponível na livraria PocketStore (R. Félix da Cunha, 1.167) e nos principais marketplaces
Estreias e reestreias em Gramado
A próxima quinta-feira (16) marca, em Gramado, a abertura do Gatzz e a (re)estreia do musical Bellepoque, que mistura música, dança, teatro e acrobacias. O espetáculo, que já esteve em cartaz na cidade em 2015 e 2016, volta com sessões diárias e repaginado como atração permanente do local. O novo roteiro tem um elenco maior — com 22 artistas no palco de um total de 37 cantores (as) e bailarinos (as), atrizes, atores e acrobatas —, novas cenas e figurinos. Clássicos de musicais e filmes como All That Jazz (Chicago), El Tango de Roxanne (Moulin Rouge) e Show Me How You Burlesque (Burlesque) são interpretados ao vivo.
O Gatzz funcionará com jantar seguido de apresentações, ao estilo de locais tradicionais como o Lido, de Paris, e outros estabelecimentos do gênero na Europa e nos Estados Unidos. Com área de 2.790 m², tem um palco com mais de 20 metros de comprimento e projeto inspirado na belle époque.
As apresentações ocorrem a partir das 18h30min, todos os dias. Mais informações em www.gatzz.com.br
Bairrismo
Teve pré-inauguração no sábado o Complexo Quintal Dona Irena, que fica no meu bairro, a Tristeza, na Capital. O complexo do nome reúne experiências gastronômicas, shows, exposições e até uma praia artificial. Ele é parte do projeto já reconhecido do Portal Dona Irena, área revitalizada na beira do Guaíba, no final da Rua Armando Barbedo (o Quintal fica no número 256 da rua). A inauguração oficial deve ser em março.