Por enquanto, a Câmara aprovou apenas a votação em regime de urgência do projeto de lei 1.904/24, mas, do jeito que a bancada conservadora está passando a boiada no Congresso, não será surpresa se nos próximos dias for aprovado o projeto que tornará o Brasil famoso por impor pena maior à mulher estuprada, que faz um aborto, do que ao estuprador. O regime de urgência permite que os projetos sejam votados diretamente em plenário, sem passar pelo debate nas comissões.
Embora garantido na Constituição o aborto em casos de estupro, não há clareza em relação ao tempo da gestação. O projeto em questão, de autoria de Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), equipara o aborto ao homicídio. Por isso, à mulher estuprada que não conseguir fazer o procedimento antes de 22 semanas será imposta pena mais dura do que ao criminoso que a violentou.
O projeto é assinado por 32 deputados, dos quais 18 são do PL. Entre os 32 há dois gaúchos: Franciane Bayer (Republicanos) e Bibo Nunes (PL).
A deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) criticou a aprovação da urgência, lembrando que mais de 60% das vítimas de violência sexual têm menos de 14 anos:
- Criança não é mãe, e estuprador não é pai.
Segundo Sâmia Bomfim, uma menina estuprada ficaria presa por 20 anos enquanto o estuprador ficaria atrás das grades por apenas seis.
- As baterias dos parlamentares estão voltadas para essa menina, retirá-la da condição de vítima para colocá-la no banco dos réus - disse a deputada.
O presidente da Câmara, Arthur Lira, disse que indicará uma mulher moderada como relatora do projeto, mas a questão crucial não é essa. Se os deputados querem evitar o aborto após 22 semanas, porque a partir desse tempo a ciência já permite que em UTI neonatal um recém-nascido sobreviva, deve trabalhar para que o procedimento autorizado por lei seja feito na rede pública tão logo a vítima ou sua família apresente o pedido.
O que ocorre hoje é que muitas vezes a burocracia, a patrulha de vizinhos conservadores ou a orientação religiosa de quem tem de autorizar o aborto legal impedem a realização do procedimento nas primeiras semanas de gestação. São incontáveis os casos de crianças estupradas que, mesmo com risco de vida, são obrigadas a ter o bebê, porque a família não conhece os seus direitos ou não tem um advogado para procurar a Justiça.
Os deputados e senadores que não querem o aborto em casos de estupro são os mesmos que pouco ou nada fazem para aumentar a pena dos estupradores. São os mesmos que fazem discursos contra a orientação sexual nas escolas, que poderia salvar muitas crianças da agressão de parentes e vizinhos. Por desinformação, muitas não sabem o que fazer quando são abusadas sistematicamente por pessoas da família.
Saiba quem são os autores do projeto 1904/2024:
Sóstenes Cavalcante - PL/RJ
Evair Vieira de Melo - PP/ES
Delegado Paulo Bilynskyj - PL/SP
Gilvan da Federal - PL/ES
Filipe Martins - PL/TO
Dr. Luiz Ovando - PP/MS
Bibo Nunes - PL/RS
Mario Frias - PL/SP
Delegado Palumbo - MDB/SP
Ely Santos - Republicanos/SP
Simone Marquetto - MDB/SP
Cristiane Lopes - União/RO
Renilce Nicodemos - MDB/PA
Abilio Brunini - PL/MT
Franciane Bayer - Republicanos/RS
Carla Zambelli - PL/SP
Dr. Frederico - PRD/MG
Greyce Elias - Avante/MG
Delegado Ramagem - PL/RJ
Bia Kicis - PL/DF
Dayany Bittencourt - UNIÃO/CE
Lêda Borges - PSDB/GO
Junio Amaral - PL/MG
Coronel Fernanda - PL/MT
Pastor Eurico - PL/PE
Capitão Alden - PL/BA
Cezinha de Madureira - PSD/SP
Eduardo Bolsonaro - PL/SP
Pezenti - MDB/SC
Julia Zanatta - PL/SC
Nikolas Ferreira - PL/MG
Eli Borges - PL/TO
Fred Linhares - Republicanos/DF