A falta de estabilidade nas regras do jogo explica em boa parte o descrédito da política no Brasil. Discute-se agora o fim da reeleição, instituto criado no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, para que ele pudesse disputar o segundo mandato em 1998. A aprovação foi cercada de denúncias de compra de votos, mas os que eram contra usufruíram da mudança e não tentaram revogar.
Como a classe política não soube lidar com a reeleição de forma republicana, o senso comum sugere que se acabe com a reeleição, o que não terminará com os problemas do presidencialismo de coalizão, verdadeira origem da orgia que desencanta o eleitor.
De prefeito a presidente, a reeleição pode ser boa ou ruim, dependendo da forma como o governante se comporta em relação ao uso da máquina. Regras mais rígidas (ou simplesmente mais claras) poderiam evitar os desvios de conduta que desmoralizam a reeleição.
A proposta agora é acabar com a reeleição, esticando os mandatos para cinco ou seis anos. Resolve o problema da má gestão, da corrupção, da incompetência? Não resolve, mas tem adeptos por diferentes razões — da verdadeira crença na evolução do sistema democrático aos interesses pessoais de potenciais candidatos.
Com a possibilidade de reeleição, um mau presidente, governador ou prefeito pode ser substituído ao final de quatro anos. Se o mandato for de cinco ou seis anos, serão mais 365 ou 730 longos dias. E por que não dar aos bons a possibilidade de continuar por mais quatro anos, se esse for o desejo do eleitor? Há no mundo boas e más experiências de reeleição. Por que não aperfeiçoar as regras em vez de jogar a criança fora com a água do banho?
É provável que, se Fernando Henrique não tivesse condições de disputar a reeleição, o Plano Real, que enfrentou uma séria crise no início de 1999, tivesse naufragado pelas mãos do sucessor. Os quatro anos adicionais deram tempo a FHC de consolidar o Real, que enfrentava críticas do PT. Quando Lula chegou ao poder, em 2003, teve de se render ao sucesso do plano que livrou o país da hiperinflação.
Aliás
Quando Tancredo Neves foi eleito, seu mandato deveria ser de quatro anos. O vice José Sarney assumiu e, depois de muita discussão, o Congresso aprovou o mandato de cinco anos, com eleição direta apenas em 1989. Fernando Collor tomou posse em 1990 e caiu em 1992. Desde que a reeleição foi instituída, só Jair Bolsonaro não se reelegeu.