A lista das autoridades espionadas por agentes da Agência Brasileira de Inteligência, no que se convencionou chamar de “Abin paralela” pode ser considerado um Watergate à brasileira. Não que o escândalo tenha sido descoberto pela imprensa, mas por envolver o então presidente da República em um caso de espionagem de adversários. Há mais diferenças do que semelhanças com o escândalo que derrubou Richard Nixon, mas na essência o que se tem é o uso de uma instituição pública para xeretar a vida de quem, por alguma razão, preocupava Bolsonaro e aos filhos.
A investigação ainda não terminou, mas no fim de semana o jornalista Túlio Amâncio, da Band, revelou uma primeira lista de autoridades que teriam sido alvo da Abin paralela. A relação inclui aliados que perderam a confiança da família e foram defenestrados, ministros do Supremo Tribunal Federal, adversários políticos, como o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia e, sabe-se lá por qual motivo, o delegado e a promotora que em determinado momento estiveram à frente das investigações sobre a morte da vereadora Marielle Franco.
A pena para Richard Nixon pela participação no Watergate foi a morte política. O então presidente dos Estados Unidos teve de renunciar ao mandato e entrou para a história como protagonista do maior escândalo de espionagem da política americana.
Bolsonaro já terminou o mandato e está inelegível por outros delitos. Qual será a punição para o caso se ficar provado que estava por dentro dos atos ilegais praticados na Abin ao tempo em que a agência era chefiada pelo delegado Alexandre Ramagem, homem da confiança dele e dos filhos? Não é crível que um pedido do vereador Carlos Bolsonaro tivesse força suficiente para mobilizar as engrenagens da Abin em um roteiro que só não pode ser tratado como comédia porque se trata de crime.
Agora se entende por que o general Santos Cruz saiu do governo com tantas críticas a Bolsonaro. Agora as indiretas de Abraham Weintraub (outro espionado) fazem sentido. À margem da Constituição, a Abin espionou os ministros Alexandre de Moraes, Luis Roberto Barroso e Gilmar Mendes, do STF, membros da CPI da covid e até personagens de escassa relevância, como Joice Hasselmann e Alexandre Frota, dois bolsonaristas fanáticos que caíram em desgraça e são inimigos da família. Os ex-governadores João Doria (PSDB-SP), Rodrigo Garcia (MDB-SP) e Camilo Santana (PT-CE) também estão na lista.
ALIÁS
Na retomada dos trabalhos do Congresso, a Abin paralela e as suspeitas que recaem sobre a família Bolsonaro serão temas obrigatórios. Porque as conclusões preliminares da investigação mostram que houve desrespeito ao Legislativo, o Executivo e o Judiciário.