Volto à terra em que nasci depois de um ano de ausência motivada primeiro pela eleição, depois por um tratamento de saúde que exigiu foco e recolhimento. É curiosa a sensação de “estar em casa”, mesmo quando a nossa casa já é outra há quase meio século, na cidade em que escolhemos viver. Minha mãe tinha o costume de enterrar o umbigo dos filhos perto da casa em que nascemos, porque rezava a lenda que assim nenhum esqueceria das suas raízes e não se desligaria da família. Não tem explicação científica, mas funcionou: todos temos essa ligação com a terra onde nascemos, embora cada um tenha procurado expandir seus horizontes.
Na casa atual, nunca vivi. Eu já estudava fora quando o resto da família se mudou para a cidade ainda distrito de Espumoso. Sou sempre visita, mas não é a casa física que dá a sensação de pertencimento. Cada objeto é repleto de lembranças, a presença do pai e de seus ensinamentos paira no ar como uma nuvem de saudade, os vizinhos ainda são os mesmos e nos enchem de carinho. Em que outro lugar você volta depois de um ano e ganha da amiga Fátima um pão de milho recém-saído do forno?
Nossa aldeia, como dizia Tolstoi, é universal. Mesmo que seja uma cidade pequena, tem todos os elementos dos quais é feita a literatura. Aqui ouço tantas histórias que, se escrevesse contos aleatórios, é provável que alguém neles se reconhecesse, como no filme argentino O Cidadão Ilustre. É a preocupação com o risco de que se confunda ficção com realidade que me impede de escrever uma novela.
Sempre que venho, volto com o cérebro repleto dessa paisagem que talvez não tenha nada de singular, mas para mim é única. Agora o trigo está crescendo e não há na paleta de cores nenhum verde que a este se compare. Não há dourado que se assemelhe ao do trigo maduro.