O jornalista Bruno Pancot colabora com a colunista Rosane de Oliveira, titular deste espaço
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) começou a pagar, em junho, o bônus por excesso de processos a juízes e desembargadores. A gratificação pode chegar a um terço do salário do magistrado, desde que não ultrapasse o teto constitucional de R$ 39,2 mil, que corresponde à remuneração de ministro do Supremo Tribunal Federal.
No mês passado, o Judiciário gaúcho gastou o montante de R$ 6,5 milhões no pagamento do bônus. Receberam o benefício 548 juízes do primeiro grau e 119 desembargadores. Os números representam, respectivamente, 70% dos juízes e 85% dos desembargadores da corte.
Como a remuneração dos magistrados não pode ultrapassar os vencimentos de um ministro do STF, na prática, uma parte do valor que seria pago acabou estornado para os cofres do Judiciário. Em média, cada juiz em nível inicial de carreira agraciado com o bônus recebeu R$ 8.617,32 adicionais pelo excesso de trabalho, em junho. Na outra ponta, os desembargadores, que possuem salários mais próximos ao teto, receberam R$ 3.831,10, na média, em razão do limite constitucional.
O benefício foi recomendado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ainda em 2020 e ratificado pelo Órgão Especial do TJ-RS em janeiro de 2022, mas ainda não havia sido efetivamente adotado. Primeiro, em razão da instabilidade provocada pela pandemia. Segundo, porque o tribunal dependia de ajustes técnicos para efetuar os pagamentos. Faltavam detalhes relativos à organização da folha de pagamento, sob responsabilidade da Procergs.
O segundo vice-presidente do TJ-RS, desembargador Antonio Vinicius Amaro da Silveira, explica que faltam cerca de 150 juízes no tribunal, o que provoca uma sobrecarga sobre os magistrados que estão na ativa. O desembargador avalia que a gratificação é uma forma de aumentar a produtividade e tornar mais ágil o julgamento dos processos.
— Essa gratificação é de cunho temporário, não é um acréscimo permanente porque vai depender da distribuição sazonal dos processos. Então, haverá momentos em que a gratificação não será paga, na medida em que consigamos padronizar o número de magistrados nas comarcas e nos juizados, porque hoje estamos com carência muito grande — diz o desembargador.
Em maio, o desembargador afirmou a GZH que o Judiciário gaúcho era um dos únicos tribunais do Brasil que ainda não havia iniciado o pagamento do bônus. O gatilho usado para indicar se um juiz tem direito ao benefício é o acúmulo de 1,2 mil processos cíveis ou 800 processos na área criminal.
O TJ-RS estima que o gasto anual com a gratificação chegará a cerca de R$ 68 milhões. O valor corresponde a pouco mais de 1% do orçamento do Judiciário.
Novo estuda contestar pagamento
Membro da Frente Parlamentar de Combate aos Privilégios na Assembleia Legislativa, deputado Fábio Ostermann (Novo), afirma que a gratificação pelo excesso de processos é um "aumento disfarçado de salário para membros do Judiciário". O parlamentar reclama que o bônus não passou pelo crivo da Assembleia e estuda ingressar com uma ação judicial para anular a resolução do TJ-RS que autorizou o benefício.
— Na prática, essa gratificação por acúmulo de processos é um privilégio autoconcedido, bancado pelo pagador de impostos, e que somente acaba servindo para engordar os contracheques da elite do funcionalismo — diz Ostermann.
À coluna, o vice-presidente do TJ-RS responde que o pagamento do bônus está baseado em leis federais e no entendimento do CNJ e do STF de que, se um magistrado no Brasil recebe um benefício, essa gratificação deve ser estendida a todo o Judiciário.
— É o direito que o deputado tem de fazer o questionamento, é democrático. Está no âmbito da instituição do Parlamento. O Poder Judiciário avalia todas as circunstâncias, avalia a conveniência e a oportunidade para efetuar ou não o pagamento — afirma.
Ministério Público também começa a pagar bônus
O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) também começou a pagar, em junho, o bônus por acúmulo de trabalho a promotores e procuradores. A medida é apoiada em regulamentação do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que autorizou o pagamento.
Conforme o MP-RS, o benefício "remedia a falta de procuradores de Justiça e de promotores de Justiça, que precisariam ser nomeados em várias Comarcas onde há cargos vagos". Segundo a instituição, 259 cargos estão desocupados atualmente.
Ainda não há informações sobre os valores e o número de promotores e procuradores beneficiados.
Confira a nota enviada à coluna pelo MP-RS:
O MPRS, seguindo regulamentação do CNMP, implementou o pagamento para os cargos onde há efetivamente acúmulo de trabalho. A medida remedia a falta de procuradores de Justiça e de promotores de Justiça, que precisariam ser nomeados em várias comarcas onde há cargos vagos, permitindo adequação do orçamento às necessidades da instituição para atendimento das demandas que crescem em complexidade e quantidade. Atualmente, há 259 cargos vagos. Somente no interior, são 170 cargos de promotores de Justiça não providos neste momento.