Se as atrocidades denunciadas por ex-médicos da Prevent Senior não tivessem ligação com o governo federal, seriam apenas um caso para a polícia, o Ministério Público e a Justiça — e os conselhos que, em nome da defesa da autonomia, abriram a porteira para a prescrição de medicamentos de ineficácia comprovada. Como há conexões com o Ministério da Saúde e o Palácio do Planalto, a operadora de saúde virou alvo da CPI da Covid e o escândalo ganhou proporções nacionais.
Há fortes indícios de crime contra a humanidade, a partir dos depoimentos de médicos de que eram obrigados a receitar um kit de drogas sem eficácia, em nome de uma questão política: vender ao país a falsa ideia de que não era preciso adotar medidas restritivas à circulação de pessoas, como fizeram as principais nações do mundo. Pacientes morreram em todos os hospitais, porque o vírus é letal mesmo, mas, na rede Prevent Senior, havia método para vender ilusões.
— A esperança chamava-se cloroquina — disse a advogada Bruna Morato na CPI.
De acordo com a advogada, a Prevent Senior fez um pacto com o governo federal para validar o tratamento com o chamado kit covid e, assim, evitar o lockdown no país. A operadora seria o "benchmark" do gabinete paralelo que tinha Nise Yamaguchi e Paulo Zanotto entre seus expoentes.
Na mesma época em que o plano de saúde adotou esse protocolo, o presidente Jair Bolsonaro circulava com uma caixinha de hidroxicloroquina na mão, feito garoto propaganda do laboratório. Bolsonaro até apagou os vídeos em que alardeava as propriedades do remédio contra a covid-19, mas nunca deixou de defendê-lo, como fez no discurso na ONU, sem citar o nome.
O depoimento da advogada, que falou em nome de um grupo de médicos que montaram o dossiê escabroso sobre as práticas que dizem ter sido obrigados a adotar, é chocante. Os médicos não aparecem por medo de retaliação, e a própria Bruna disse estar temerosa de virar alvo.
O depoimento de Bruna e dos médicos que ela representa ganha veracidade quando se volta no tempo para assistir ao vídeo de uma live do empresário Luciano Hang, dono da Havan (veja abaixo), do dia 21 de janeiro deste ano. Hang aparece de camiseta verde, com a frase “O Brasil que queremos só depende de nós”, escrita em amarelo. O empresário fala direto do Hospital Sancta Maggiore, onde ele, a mulher e a mãe estavam internados com covid.
No vídeo, Hang explica por que levou a mãe para um hospital da rede Prevent Senior, quando ela testou positivo em 31 de dezembro de 2020. Conta que participa de um grupo “com médicos, cientistas, infectologistas e empresários” e que consultou a médica Ellen Brandão para saber que hospital ela recomendava para internar a mãe.
“Luciano, venha para a Prevent Senior que é o hospital que tem procolo para a covid”, teria recomendado Ellen. Ainda de acordo com o vídeo de Hang, a mãe, dona Regina, de 82 anos e com várias comorbidades, teria chegado ao hospital com 95% dos pulmões comprometidos.
No dia do vídeo, graças ao “tratamento”, já estaria com apenas 25% de comprometimento da função respiratória, "dia a dia melhorando”, mas ainda na UTI. Duas semanas depois, dona Regina morreu. Sabe-se agora, pelo prontuário, que ela foi tratada com cloroquina e outras drogas do kit covid, além de aplicações de ozônio pelo reto.
Na live, Hang , que é alinhadíssimo ao Palácio do Planalto, contou que testou positivo, mas nunca teve sintomas, graças ao “tratamento preventivo” que fez antes de a mãe ser internada. Exibiu vários cartazes com palavras previamente impressas: gratidão, emoção, a vida é uma só, união pelo Brasil. Citou os médicos Nise Yamaguchi, Ricardo Zimmermann e Francisco Cardoso, todos adeptos do tratamento precoce.
— Prefiro pecar pelo excesso — diz Hang, referindo-se ao coquetel de medicamentos ineficazes que tomou e recomendou.
Assista ao vídeo publicado por Luciano Hang:
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