O Senado Federal está prestes a votar uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que isenta de responsabilidade prefeitos e governadores que não cumpriram o percentual mínimo de gastos com educação em 2020. O texto principal está acompanhado de uma emenda apresentada pelo gaúcho Lasier Martins (Podemos), que estende o perdão para 2021, como se fosse a coisa mais normal do mundo descumprir a Constituição.
A votação está prevista para terça-feira (24), que será uma espécie de Dia D para mostrar se os senadores estão a serviço da educação ou dos prefeitos e governadores que negligenciaram o ensino em 2020 e estão negligenciando neste ano, que ainda não começou em boa parte das escolas públicas.
O que passou, passou, dirão gestores que tentam escapar dos apontamentos dos Tribunais de Contas. Argumentarão, como os senadores, que foi um ano atípico, as crianças ficaram fora das salas de aula, a arrecadação caiu e os gastos com saúde foram inflados pela pandemia. É fato que as crianças não frequentaram as salas de aula, mas o que não se gastou nas escolas deveria ter sido usado para oferecer condições de ensino remoto, seja com a aquisição de equipamentos, seja com o treinamento de professores.
O que se viu foi uma espécie de desídia coletiva, salvo honrosas exceções, com as crianças que não tinham smartphone, computador ou internet de banda larga. Aprofundou-se o fosso que separa a escola pública da escola privada. A estimativa do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) é de que 5,1 milhões de crianças ficaram sem acesso à educação durante o ano passado.
É verdade que a arrecadação caiu, mas Estados e municípios receberam compensação do governo federal pelas perdas decorrentes da pandemia, no período mais crítico da redução das atividades econômicas.
E 2021? Por que dar a prefeitos e governadores a moleza de não precisar aplicar os percentuais constitucionais neste ano? O recado é claro: educação não é prioridade. Ou, parafraseando o ministro Milton Ribeiro, os parlamentares acham que educação "não é para todos".
Os senadores ainda têm tempo de refletir sobre o que querem para o país. Se concluírem que em 2021 os prefeitos e governadores devem ficar isentos de aplicar em educação o que a Constituição manda, que pelo menos tenham a decência de nunca mais fazer campanha política dizendo que o assunto é prioridade.
Aliás
A PEC começou a tramitar no Senado em maio, por iniciativa do senador Marcos Rogério (DEM-RR), e contou com adesão de outros 25 senadores. Dentre eles, os gaúchos Lasier Martins e Luis Carlos Heinze (PP).