No dia em que o Brasil ultrapassa, pelos dados oficiais, a barreira das 200 mil mortes causadas pelo coronavírus (na prática esse número já tinha sido atingido, mas faltava atualizar os dados), temos, enfim, boas notícias. Dois ícones da ciência brasileira, a Fiocruz, no Rio de Janeiro, e o Instituto Butantan, em São Paulo, estão no aquecimento para começar a produzir as vacinas para a covid-19. E o Brasil tem, enfim, um plano organizado de vacinação da população.
Faltam detalhes? Faltam. Ainda não se sabe em que dia começa a vacinação, mas, como os primeiros receberão doses importadas da Índia e da China, é certo que será ainda em janeiro e que começará por quem está na linha de frente do combate ao coronavírus e pelos idosos que vivem em casas geriátricas, no Rio Grande do Sul. Nem poderia ser diferente. No mundo inteiro, os primeiros a se imunizar são os profissionais da saúde e os velhinhos e velhinhas.
O plano do governo de Jair Bolsonaro, apresentado pelo ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, não tem margem para a disputa entre Estados — e esta é uma boa notícia. A distribuição será feita ao mesmo tempo, conforme o tamanho da população. Não há risco de o Rio Grande do Sul ou o Rio Grande do Norte ficarem para o fim da fila porque o Butantan fica em São Paulo e a Fiocruz no Rio.
Esse esquema de distribuição, correto do ponto de vista federativo, não tira o mérito do governador de São Paulo, João Doria, de ter corrido a fechar um acordo com a Sinovac para produção da CoronaVac no Butantan. Doria desafiou a campanha difamatória movida por integrantes do governo federal e seus aliados contra a “vacina chinesa” e investiu para que o Butantan estivesse no seleto grupo dos produtores do imunizante. O Brasil é privilegiado por ter duas instituições com larga experiência na produção de vacinas participando desse esforço global para livrar a Humanidade de um vírus que já matou mais de 200 mil no país e segue lotando as UTIs.
Se o Brasil investisse mais em ciência, poderia estar ainda mais à frente. Poderia ter desenvolvido uma vacina própria. Pesquisadores altamente qualificados, que dedicam a vida à ciência, não faltam. O que falta é investimento e visão de longo prazo. Quantos desses pesquisadores abandonaram o país nos últimos anos por falta de apoio e foram brilhar em universidades do Primeiro Mundo? Quantos estão emprestando sua capacidade a hospitais de outros continentes e ajudando a pesquisar técnicas para salvar vidas enquanto a vacina não chega? Que essa tragédia sirva de alerta para a necessidade de valorizar o conhecimento e tratar os cientistas como heróis e dar-lhes condições de levar adiante não apenas pesquisas na área da saúde, mas de todos campos do conhecimento.