De trapalhada em trapalhada, o governo de Jair Bolsonaro vai ganhando destaque no mundo. No mau sentido. Dia após dia, veículos de todos os continentes criticam a postura do presidente brasileiro no enfrentamento ao coronavírus.
Até o Financial Times, espécie de Bíblia dos investidores, fez editorial neste fim de semana alertando para o risco à democracia brasileira. The Economist, The New York Times e The Washington Post, para ficar nos mais influentes, já fizeram críticas duras ao governo brasileiro.
O aliado Donald Trump não só fechou as portas dos Estados Unidos para os brasileiros, apesar de seu país ser o líder isolado em casos e mortes, como criticou a forma como o país lida com o enfrentamento ao coronavírus.
Da negação inicial à tentativa de ocultação de cadáveres passaram-se três meses. Como não se confirmaram as previsões iniciais de seu ex-ministro Osmar Terra, de que morreriam menos brasileiros do que na epidemia de H1N1, Bolsonaro achou por bem esconder os dados oficiais, na tosca ideia de que quem não é visto não é lembrado.
O presidente esqueceu, no entanto, que não é dono da informação e que não estamos em 1972, quando o regime militar tentou esconder um surto de meningite. Jornalistas que viveram esse período contam que a simples menção à palavra meningite era proibida pelos censores que davam plantões nas redações.
Agora, na era da informação instantânea, o Ministério da Saúde imaginou que bastaria segurar a divulgação dos números consolidados para não sair no Jornal Nacional. Errou. O site G1 fez a soma, a informação foi dada na edição normal e os dados oficiais em um plantão no meio da novela Fina Estampa. O governo não se deu por vencido: tirou o site do ar e só voltou (desidratado, sem o total de mortes) depois que a Universidade John Hopkins excluiu o Brasil do seu painel, igualando a maior economia da América Latina à Coreia do Norte.
O Ministério Público Federal deu 72 horas para o ministro interino da Saúde, general Eduardo Pazuello, responder quais fundamentos técnicos embasaram a decisão de excluir os números de mortes da covid-19 no Brasil.
Como se isso fosse pouco, o secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Carlos Wizard, acusou os Estados de falsearem dados sobre óbitos por covid-19 para receber mais recursos federais. E anunciou que o Ministério da Saúde vai fazer uma recontagem, ignorando que o verdadeiro problema do Brasil é a subnotificação, já que o aumento das mortes por síndrome respiratória aguda é bem superior ao de casos de covid-19. Como disse o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, “os cemitérios não mentem”.
A acusação leviana foi respondida no sábado de manhã com uma nota dura dos secretários estaduais de Saúde, dizendo que “a tentativa autoritária, insensível, desumana e antiética de dar invisibilidade aos mortos pela Covid-19, não prosperará”.
“Não somos mercadores da morte”, dizem os secretários na nota.
ALIÁS
O melhor caminho para resolver o impasse em torno dos números de casos e mortes por coronavírus é os tribunais de Contas, que têm estrutura qualificada em todos os Estados, assumirem a responsabilidade pela contagem e o TCU divulgar as estatísticas de forma transparente.