A divulgação do contracheque do presidente do Tribunal de Justiça, Carlos Eduardo Duro, que em março recebeu, líquidos, R$ 104 mil, graças a 54 dias de férias não gozadas pagos em dinheiro, reacendeu um debate antigo: é ou não privilégio injustificável ter dois meses de férias, mais o recesso de 15 dias?
Neste espaço, os dois meses e meio de descanso foram criticados incontáveis vezes, pelo entendimento de que se trata, sim de um privilégio injustificável.
A sugestão de que o benefício deveria ser revisto foi contestada por magistrados, individualmente, e pela presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), Vera Deboni, como representante da classe.
“O período de 60 dias não é um 'privilégio injustificável' da magistratura gaúcha, mas uma simetria com todos os magistrados brasileiros estabelecida pelo artigo 66 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman). Situação, aliás, idêntica aos integrantes do Ministério Público", diz a nota enviada à coluna (leia a íntegra abaixo).
De fato, é um benefício a que todos os juízes têm direito — e que foi estendido a outras carreiras jurídicas — mas não deixa de ser privilégio. O argumento de que se trata de um trabalho estressante não convence ninguém fora da bolha em que vivem os agraciados por esses 75 dias de folga remunerada, sendo 60 com adicional de um terço do salário.
Há dezenas de outras atividades até mais estressantes que só têm os 30 dias de descanso dos mortais. Piloto de avião, policial que trabalha na rua, médico intensivista, caixa de banco, motorista de ambulância, entre tantos.
A presidente de Ajuris alega que “ao contrário de outras categorias do setor público e também da área privada, os magistrados não recebem hora extra ou banco de horas por conta da extensão da jornada diária de trabalho, o que é muito comum. Também não recebem adicional noturno ou o pagamento pelos plantões de final de semana e feriado, em um regime de trabalho de 24 horas por dia, todos os dias da semana, sempre envolvidos em resolver questões do dia a dia do cidadão, como conflitos na saúde e na infância ou na contenção da violência doméstica”.
Vera registra ainda que os magistrados não têm Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e só podem se aposentar com, no mínimo, 35 anos de trabalho. O FGTS, convém lembrar, é uma compensação paga aos trabalhadores do setor privado, porque estes não têm estabilidade no emprego e podem ser demitidos a qualquer tempo.
Na contramão da presidente da Ajuris, o juiz Alex Custódio, da 8ª Vara da Fazenda Pública, opina que um mês é suficiente, até porque todos têm direito ao recesso de final de ano, que na virada de 2019 para 2020 será de 22 dias (20 de dezembro a 10 de janeiro).
Aliás
Jornalistas também têm um privilégio indefensável que deveria ser revisto: a jornada de trabalho de cinco horas, fruto de uma lei do tempo da ditadura, aprovada com o argumento de que se trata de uma profissão estressante.
Confira a íntegra da nota da Ajuris.
"Rosane, em relação a teu comentário sobre a questão dos dois meses de férias dos magistrados publicado na edição de hoje (14/10) de Zero Hora, é importante esclarecer: O período de 60 dias não é um “privilégio injustificável” da magistratura gaúcha, mas uma simetria com todos os magistrados brasileiros estabelecida pelo artigo 66 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman). Situação, aliás, idêntica aos integrantes do Ministério Público.
Ao contrário de outras categorias do setor público e também da área privada, os magistrados não recebem hora-extra ou banco de horas por conta da extensão da jornada diária de trabalho, o que é muito comum. Também não recebem adicional noturno ou o pagamento pelos plantões de final de semana e feriado, em um regime de trabalho de 24 horas por dia, todos os dias da semana, sempre envolvidos em resolver questões do dia a dia do cidadão, como conflitos na saúde e na infância ou na contenção da violência doméstica.
Também os magistrados não têm Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS) e só podem se aposentar com, no mínimo, 35 anos de serviço. Importante registrar que na noite de domingo, em entrevista à TV Bandeirantes, o presidente da Assembleia Legislativa, deputado Luís Augusto Lara, reconheceu o esforço que o Poder Judiciário gaúcho vem fazendo em solidariedade à crise nas finanças do Estado. Lara lembrou que, ainda no governo Germano Rigotto e com continuação em governos posteriores, o Executivo usou recursos dos depósitos judiciais para equilibrar suas finanças.
Outro fato importante a destacar é que em recente entrevista ao jornal Correio do Povo, o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Carlos Eduardo Duro, fez um relato da gestão dos recursos próprios no TJRS para reaparelhar o Judiciário. Esses recursos próprios, até agosto, estavam próximos dos R$ 560 milhões.Por fim, é importante salientar que por 11 anos consecutivos, o trabalho da magistratura do Rio Grande do Sul é reconhecido como o mais eficiente do Brasil, tanto juridiscional quanto administrativamente, com base em pesquisa realizada anualmente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Considero importante esses esclarecimentos junto à opinião pública. Ao final do programa Atualidades de hoje, na Rádio Gaúcha, anunciaste que amanhã voltará ao assunto. Assim, peço a gentileza que também registre esses observações para que o ouvinte tenha condições de estar informado por completo.Muito obrigada.
Vera Lúcia Deboni - presidente da AJURIS"