Observador da cena política brasileira à distância, já que está morando em Miami há um ano, o ex-governador Antônio Britto está retomando a vida de jornalista depois de 35 anos de dedicação à política, à administração de empresas e instituições e, ultimamente, à família. Estimulado pelo filho Pedro, 17 anos, um dos trigêmeos nascidos no ano de sua última disputa eleitoral, Britto resolveu virar blogueiro. O primeiro texto publicado no Blog do Britto (blogdobrittocombr.com) trata das manifestações deste domingo e do dia 15 de maio.
Ao anunciar a decisão de ter um blog, Britto escreveu um texto que revela bem o seu estilo:
"Comunico minha rendição. E uma traição. Cinquenta e cinco anos depois de passar tardes datilografando a-s-d-f-g como parte do curso para dominar maquinas de escrever e dai trabalhar em jornal e dai..., bem agora sou blogueiro. Confesso, por dever de justiça, que a façanha tem apoio de terceiros, a começar pelo Pedro, meu filho.
Descobri, observando, que blog é coisa de gente ou muito jovem ou, meu caso, muito velha que passa a ouvir com frequência: 'Por que não fazes um blog, não divides experiências?'.
Garanto para alívio geral: o blog tem como regra única uma proibição. Não sou assunto dele até pela expectativa de conseguir manter por perto ao menos uns dez amigos...
Também não e um blog para dividir certezas. A vida me fez perder a maioria delas e passar a enfrentar, diariamente, ainda mais com o que ocorre no Brasil, o necessário ainda que sofrido exercício das dúvidas, cada vez mais dúvidas."
Quando se mudou para Miami, no final de maio do ano passado, Britto já cogitava a possibilidade de manter um blog, mas dizia que seu plano imediato era ser motorista e cozinheiro da família, que se mudou antes para os Estados Unidos. No Brasil, seu último trabalho foi como presidente da Interfarma, onde atuou por nove anos.
O primeiro texto do novo blog tem como título uma pergunta: "Qual a manifestação verdadeira?". Confira a íntegra:
"Em menos de duas semanas, nas manifestações de ontem e de 15 de maio, brasileiros foram às ruas, geralmente nas mesmas cidades. Não eram multidões incontáveis, como em junho de 2013, mas com forca mais que suficiente para serem reconhecidas, analisadas e ouvidas. Nas duas, não houve violência e os mais radicais pareceram estar contidos. Nas duas, muitas das palavras de ordem eram vizinhas do bom senso, especialmente a defesa do combate à corrupção, apoio à educação, reforma da previdência.
Qual das duas reflete o Brasil real?
Para tristeza de bolsonaristas e antibolsonaristas, a resposta correta é: o Brasil é feito pela soma das duas. E, ainda, pelos que não estavam em nenhuma das duas.
E aí, exatamente aí, está o defeito de ambas: pensam que, isoladas ou sozinhas, são o Brasil.
Na verdade, somos o que houver de comum às duas. Deveríamos ser o que nos une e não a tentativa autoritária, à direita ou à esquerda, de negar o direito ou a oportunidade aos que pensam diferente.
Nosso problema não é a existência de manifestações diferentes. E a incompetência atual, de estabelecer algum caminho que identifique o que há comum entre elas."