Por motivos óbvios, o sonho de qualquer candidato que lidera as pesquisas de intenção de voto é ganhar no primeiro turno. Não poderia ser diferente com Jair Bolsonaro, que segundo o Ibope divulgado ontem à noite tem 32% e livra nove pontos de vantagem sobre Fernando Haddad (23%). Os números mostram que não é impossível a eleição terminar no primeiro turno, mas o mais provável é uma disputa entre Bolsonaro e Haddad. O terceiro colocado, Ciro Gomes, tem 10%, e o quarto, Geraldo Alckmin, 7%.
Pela polarização mostrada nas pesquisas, nem parece que temos 13 opções para escolher em 7 de outubro. A final será no dia 28, o que significa três semanas de entrevistas, debates e propaganda eleitoral com tempos iguais.
O que os brasileiros que defendem a antecipação do segundo turno para domingo estão fazendo é privar o país de uma debate mais profundo sobre as propostas dos candidatos que têm chances de governar o país. Nem Bolsonaro nem Haddad mostraram até agora o que farão. O plano de governo do candidato do PSL é uma carta de intenções de 81 páginas, que não detalha como vai, por exemplo, cumprir a promessa de baixar a carga tributária, nem se detém na reforma da Previdência. Com Haddad, que condensou suas propostas em 62 páginas, ocorre o mesmo: os ingredientes estão ali, mas o modo de fazer não está explicado.
Planos de governo escritos para cumprir a exigência da legislação eleitoral costumam ser rasos mesmo. É nas entrevistas e nos debates que se pode questionar os candidatos sobre os temas mais espinhosos. Isso não ocorreu no primeiro turno com Bolsonaro e Haddad, em parte pelas circunstâncias que envolveram as duas candidaturas. O primeiro foi vítima de um atentado no dia 6 de setembro e passou três semanas no hospital. O segundo só foi confirmado candidato em 11 de setembro. Os dois deram algumas entrevistas mais longas, mas não se enfrentaram em nenhum debate. Nem se enfrentarão no primeiro turno, porque Bolsonaro apresentou um atestado médico e não estará na Rede Globo hoje à noite.
O segundo turno é a chance de os candidatos traduzirem o que está nos planos de governo. Bolsonaro terá a chance de explicar a proposta de criação de uma carteira de trabalho “verde e amarela”, na qual os contratos individuais prevalecerão sobre a CLT. O plano diz que os trabalhadores poderão escolher qual carteira usar. Não deixa claro, porém, se as empresas podem se recusar a empregar detentores de carteira azul.
Haddad, se for o outro nome do segundo turno, será confrontado com fatos e dados que não combinam com sua promessa de um Brasil “feliz de novo”. Terá de detalhar, por exemplo, o que vai fazer, se eleito, para que não se repitam os escândalos de corrupção que levaram para a cadeia vários líderes do PT, incluindo seu criador, o ex-presidente Lula. A volta ao passado inclui a revogação de medidas como a regra do teto de gastos e a reforma trabalhista, sem esclarecer o que será feito para equilibrar as contas.
Para iluminar as zonas de sombra é que serve o segundo turno.