O edifício de 24 andares que desabou em São Paulo é uma síntese das mazelas do país – da falta de política habitacional ao descaso com o patrimônio público, passando pela demagogia política que usa os pobres como massa de manobra. A tragédia anunciada ocorreu na capital paulista, mas pode se repetir em outras cidades brasileiras, em que milhares de pessoas ocupam prédios invadidos sem condições mínimas de segurança.
Em Porto Alegre, quem saberia dizer quantas pessoas hoje vivem em condições subumanas? Quantos prédios públicos estão abandonados, sem manutenção, ocupados por famílias que os invadiram, não por opção mas por falta de acesso a uma moradia digna? Quantos outros tiveram acesso a programas como o Minha Casa Minha Vida, mas foram expulsos por traficantes que mandam em áreas conflagradas? Quantos passaram adiante a casa ou o apartamento conseguido em um programa social, quebrando as regras do contrato, e foram viver em ocupações irregulares? Quantos caíram no conto dos espertalhões que comandam a indústria das invasões em busca de benefícios políticos ou financeiros?
Em São Paulo, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo divulgou nota, ontem, em que critica o poder público, “em todas as esferas”, pelo descaso em relação ao quadro urbanístico das cidades brasileiras e pela ausência de políticas nacionais de habitação.
O alerta dos arquitetos de São Paulo vale para todos os Estados. Lá, um edifício que já foi considerado joia da arquitetura modernista caiu no abandono pelo descaso do poder público. Tinha sido tombado pelo patrimônio histórico em 1992, por ser considerado “bem de interesse histórico, arquitetônico e paisagístico”. As sucessivas ocupações irregulares – informais ou organizadas por movimentos políticos – foram degradando o prédio até restar o esqueleto que veio abaixo na madrugada de 1º de maio.
O prefeito de São Paulo, Bruno Covas, disse que a cidade tem 70 prédios em situação de risco. E em Porto Alegre, prefeito Nelson Marchezan? Seus fiscais saberiam dizer quantos são? Os bombeiros saberiam? E em Caxias, prefeito Daniel Guerra? Em Pelotas, prefeita Paula Mascarenhas? Em Canoas, prefeito Luiz Carlos Busato? Em Santa Maria, prefeito Jorge Pozzobom?
Desde 2002, a União era dona do prédio que desabou. Foi usado pela Polícia Federal e pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), mas em determinado momento o governo entendeu que não servia mais. Tentou vendê-lo e, sem sucesso, fechou as portas e parou de fazer a manutenção. Estava criado o cenário da tragédia.
A situação é mais comum do que se imagina. O controle do patrimônio é falho. No Rio Grande do Sul, sucessivos governos tentam fazer o inventário dos imóveis para vender os que não servem, mas o processo é lento e burocrático. Há prédios caindo aos pedaços, outros alugados a preços simbólicos, outros tantos ocupados irregularmente.