No dia em que se filiou ao PSB, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa alimentou as especulações de que seria candidato a presidente da República, mas sempre desconversou sobre o projeto. Os próprios líderes do PSB que há alguns dias conversaram com ele saíram intrigados: Barbosa foi evasivo demais para quem poderia ser a novidade da eleição. Na mais recente pesquisa do Datafolha, o ex-ministro chegou a ter 10% das intenções de voto, um fenômeno para quem nunca concorreu a nada nem disse que seria candidato. A candidatura acabou hoje com um breve comunicado pelo Twitter.
Barbosa gastou pouco mais da metade dos 280 caracteres a que tem direito em cada post. No seu perfil no Twitter escreveu apenas: "Está decidido. Após várias semanas de muita reflexão, finalmente cheguei a uma conclusão. Não pretendo ser candidato a Presidente da República. Decisão estritamente pessoal".
Como a viúva Porcina da novela Roque Santeiro, Joaquim Barbosa é o candidato "que foi sem nunca ter sido". Cedo compreendeu que a candidatura não era para ele. O ministro Gilmar Mendes, que conhece o ex-colega muito bem e as entranhas da política melhor ainda, alertou que Barbosa teria muita dificuldade para conversar com os políticos. Não é da natureza dele a concertação que as relações com o Congresso exigem.
Ao tempo em que foi relator do mensalão e tornou-se o juiz mais popular antes de Sergio Moro, Barbosa mostrava-se impaciente com os colegas que contrariavam seus votos ou se excediam no plenário do Supremo. Era ríspido com advogados. Sofria de dores nas costas que muitas vezes o obrigavam a sair do plenário para descansar. Em outras, passava parte da sessão em pé. Como fazer campanha em um país de dimensões continentais, com viagens extenuantes, com esse perfil? Como enfrentar debates em que a retórica muitas vezes se sobrepõe à realidade? E, sendo eleito, como governar um país em que para ter maioria no Congresso é preciso fazer tantas concessões? Como lidar coma complexidade do cargo, sem jamais ter tido uma experiência administrativa?
Tudo isso e mais um pouco deve ter pesado na decisão "estritamente pessoal" de não ser candidato. O ministro já vinha sendo alvo de baixarias nas redes sociais. Se entrasse de cabeça na campanha, teria de lidar com as fake news, com o preconceito, com as picuinhas que cercam uma campanha.
O mesmo Gilmar Mendes, com aquela sinceridade que tanto choca quanto irrita, tem a sua versão para a expressão gaúcha "ovelha não é para mato". Em junho de 2017, disse que juízes não têm perfil para o Executivo:
— Já trocamos políticos que buscam votos pelos militares. Alguém pode imaginar que pode fazer uma república de promotores ou de juízes. Creio que ficarão também decepcionados com o resultado. Até como gestores, nós juízes e promotores, não somos lá muito bons. Se fôssemos administrar o deserto do Saara, faltaria areia em pouco tempo.
Quem ganha com a saída de Joaquim Barbosa de um jogo em que ainda não tinha entrado em campo? Em primeiro lugar, o candidato que conseguir convencer o eleitor de que é honesto. Em segundo lugar, ganha Geraldo Alckmin (PSDB), principal candidato a conquistar o apoio do PSB, que não tem outro nome de peso para o lugar de Barbosa. O PSB herdou de Alckmin o governo de São Paulo, por ter indicado Márcio França como vice em 2014.
Ganharia o que fosse outsider, mas neste caso não resta um. Todos os que estão no páreo agora têm fortes vínculos com a política, mesmo que alguns tentem se apresentar como criaturas vindas de outro mundo. Jair Bolsonaro, do PSL? É deputado federal desde 1991. Flávio Rocha, do PRB? O dono das Lojas Riachuelo já foi deputado federal de uma nota só, o imposto único. Henrique Meirelles, do PMDB? Foi presidente do Banco Central no governo Lula, ministro da Fazenda de Michel Temer. Renunciou ao um mandato de deputado federal por Goiás para presidir o Banco Central. Todos os outros vêm da política, o que não é nenhum demérito: os partidos, goste-se ou não, são a porta de entrada para os mandatos eletivos. Experiência administrativa deveria ser credencial para quem aspira a um cargo da relevância da Presidência da República.