As cenas registradas nas cidades do Rio Grande do Sul por onde passou a caravana do ex-presidente Lula durante a semana são reveladoras de uma forma primitiva de fazer oposição. Já na estreia, em Bagé, produtores rurais munidos de relhos agrediram simpatizantes de Lula e cercaram o ex-presidente, que teve de sair de helicóptero do local onde fez a primeira manifestação. Há farto material fotográfico comprovando agressões que deveriam envergonhar os gaúchos, mas são mostradas como sinal de valentia nas redes sociais dos protagonistas.
Não faltam imagens de militantes identificados com os símbolos do MST com pedras nas mãos, mas a maioria mostra que, desta vez, as agressões partiram do outro lado. Ônibus da caravana foram apedrejados por uma turba ensandecida, como comprovam vídeos feitos por profissionais que cobriram a passagem do ex-presidente pelo Estado.
No último dia, Lula foi impedido de entrar em Passo Fundo por manifestantes que afrontaram a Constituição, impedindo a passagem da caravana e de pessoas que nada tinham a ver com o PT. Radicais puseram fogo em pneus para bloquear a ERS-324, um ato de vandalismo que precisa ser repudiado por quem entende que a violência não pode ser aceita como método de ação política.
A caravana em si foi um equívoco de Lula e dos organizadores, que não avaliaram o tamanho da rejeição ao ex-presidente e ignoraram os alertas de que o ambiente era hostil. Imaginaram que os moradores dos municípios escolhidos sairiam às ruas para agradecer pelas obras dos governos petistas. Fantasiaram com um mundo semelhante ao da bolha em que vivem. Nessa bolha, Lula foi o melhor presidente da história do Brasil, a Lava-Jato nasceu e cresceu para tirá-lo da corrida eleitoral e a corrupção comprovada nas investigações não passa de invenção da mídia golpista em conluio com o Ministério Público.
A realidade foi dura para um líder acostumado ao afago. Embora tenha conseguido reunir milhares de pessoas, em quase todas as cidades visitadas encontrou resistências. A miniatura de gaiola com o boneco inflável do ex-presidente circulou em meio a cartazes agressivos, com expressões do tipo “Lula ladrão, aqui não”, “Lularápio” e outras com palavrões impublicáveis.
A caravana é inoportuna porque Lula está fazendo campanha eleitoral antecipada, o que é proibido por lei. Condenado em segunda instância, está legalmente impedido de concorrer, mas seus discípulos dizem que levarão a candidatura até o fim. A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, acirra os ânimos dizendo que, para prendê-lo, “vai ter de matar gente”. Em meio à caravana, o ex-presidente ganhou um salvo conduto para não ser preso até 4 de abril, mas nem pode comemorar: o repúdio que encontrou pelo caminho roubou-lhe parte das ilusões sobre o tamanho de sua popularidade e mostrou que não é intocável.