Três dias antes da leitura do relatório da reforma da Previdência na Câmara e uma semana depois de o governo ter admitido a possibilidade de desidratar mais o texto para angariar apoio, o presidente Michel Temer conseguiu encontrar uma cova para uma PEC que nem havia nascido, mas que já estava morta. Na madrugada de sexta-feira, decidiu que decretaria intervenção na segurança pública do Rio de Janeiro. Professor de Direito Constitucional, Temer sabe que nenhuma emenda à Constituição poderia ser publicada enquanto o decreto vigorasse, até dezembro de 2018. Deu a entender que, se tiver votos para a proposta, revogará a própria medida.
Desfigurada, a reforma já não tinha o mesmo apoio do mercado. No Congresso, não havia os 308 votos necessários. Com a derrota iminente, o presidente reagiu, mirando em um setor carente de atenção nacional: o da segurança pública. Propôs uma intervenção necessária no caos do Rio de Janeiro, atitude vista com simpatia até por parlamentares que costumam votar contra o governo. Para a população exposta à violência, principalmente a fluminense, o decreto de intervenção foi recebido com certo alívio. O governador Luiz Fernando Pezão levantou as mãos para o céu em agradecimento.
O enterro de uma reforma impopular como a da Previdência e o decreto salvacionista têm relação com a pretensão eleitoral de Michel Temer. Embora negue que será candidato e que deseja ser lembrado como “alguém que reformulou o país”, o presidente está sendo convencido por marqueteiros e por aliados que ficarão sem emprego em 2019 de que ninguém melhor que o próprio para defender seu legado e as medidas econômicas colocadas em prática desde 2016.
Temer será bem sucedido se as mortes de inocentes e de policiais militares recuarem. Se os arrastões, tiroteios e furtos que assustaram turistas e cariocas na zona sul do Rio também cessarem. Mesmo assim, caso decida concorrer em 2018, terá de driblar todo o escândalo de corrupção em que foi protagonista. Será um trabalho árduo tentar reverter a impopularidade de uma figura que chegou a ter apenas 5% de aprovação popular.