Se havia alguma dúvida de que os desembargadores João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Victor Laus trabalharam em sintonia na preparação de seus votos, o resultado do julgamento encarregou-se de desfazer.
Os desembargadores entraram para a História como um trio duro e afinado que não só referendou a condenação imposta ao ex-presidente Lula pelo juiz Sergio Moro, como concordou no aumento da pena, de nove anos e seis meses de prisão para 12 anos e um mês, a serem cumpridos, inicialmente, em regime fechado.
A unanimidade reduz o espaço para recursos e para contestações. Com palavras diferentes, o trio seguiu a mesma linha de argumentação nos votos, mesclando sustentação jurídica com observações políticas. Até para justificar a celeridade no julgamento a argumentação seguiu a mesma linha, com invocações à meta 4 do Conselho Nacional de Justiça, que manda priorizar os processo que envolvem corrupção e improbidade administrativa.
Na condição de relator, Gebran confirmou a fama de juiz rigoroso. A 8ª Turma manteve a tradição de aumentar a pena no julgamento da maioria dos recursos.
Gebran escreveu um voto de 430 páginas, o dobro do tamanho da sentença de Moro, construído a partir de uma visão ampla da Lava-Jato, remontando o quebra-cabeça da operação com depoimentos de dezenas de testemunhas para reforçar sua tese de que Lula é culpado dos crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro. Seu voto não envolveu apenas o recurso de Lula, mas de outros réus condenados no mesmo processo, como o ex-executivo da OAS Leo Pinheiro, condenado por corrupção ativa a pena de 10 anos e oito meses, em regime semiaberto.
Na fase final do voto, Gebran citou trecho de um desabafo do ministro Luis Roberto Barroso sobre a corrupção no Brasil. No dia 19 de dezembro do ano passado, em um embate com o ministro Gilmar Mendes, durante julgamento de recursos de políticos do PMDB, Barroso afirmou:
– Nós vivemos uma tragédia brasileira, a tragédia da corrupção que se espraiou de alto a baixo, sem cerimônia (...) E aí não faz diferença se foi pro bolso ou se foi pra campanha, porque o problema não é pra onde vai, o problema é de onde vem. É a cultura de desonestidade que se cria de alto a baixo, com maus exemplos, em que todo mundo quer levar vantagem, todo mundo quer passar os outros pra trás, todo mundo quer conseguir o seu.
Crime e castigo
Sorteado para representar o Ministério Público Federal no julgamento do recurso do ex-presidente Lula, o procurador Maurício Gerum recorreu ao russo Dostoiévski, autor de Crime e Castigo, para expressar sua convicção de que o réu é culpado e de que não deve receber tratamento diferenciado por ser um líder popular, como se fosse um homem de bronze.
“O verdadeiro soberano, ao qual tudo é permitido, bombardeia Toulon, assola Paris, esquece o seu exército no Egito, aniquila meio milhão de soldados na retirada de Moscou e livra-se de dificuldades com um trocadilho em Vilna; e, no entanto, depois de morto constroem-se altares para ele, e assim tudo é permitido. Não, esses seres, pelo visto, não são feitos de carne e osso, mas de bronze”, diz o trecho citado.
Gerum completou, de sua autoria:
– Em uma República, todos os homens são de carne.
Nasce um criminalista
A exposição na defesa do ex-presidente Lula jogou luzes sobre a figura de Cristiano Zanin, até então um advogado pouco conhecido fora de São Paulo.
Desde que o recurso de Lula chegou ao TRF4, Zanin é presença frequente na ponte aérea Porto Alegre-São Paulo. Mesmo com suas teses rejeitadas pelo TRF4, ganhou o respeito de outros advogados.
– É um rapaz inteligentíssimo, estudioso, com uma memória privilegiada – elogia Jader Marques, um dos criminalistas mais disputados do Rio Grande do Sul.
O problema de Zanin foi pegar uma causa perdida.