A reação do ex-presidente Lula à denúncia do Ministério Público Federal, que o acusa de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, foi idêntica à de quando a Polícia Federal bateu em seu apartamento e o levou para depor no Aeroporto de Congonhas. Reapareceu o velho Lula de guerra, falando mais de uma hora de improviso, apresentando-se como vítima de perseguição política. Reapareceu a jararaca, que os procuradores do MPF feriram, mas não aniquilaram. Reapareceu o Lula mitômano, que se julga acima do bem e do mal, a pessoa mais honesta do Brasil:
– Eu estou falando como cidadão indignado. Eu tenho história pública conhecida. Só ganha de mim, aqui no Brasil, Jesus Cristo.
Chamado de grande general do esquema de corrupção na Petrobras e de maestro de uma orquestra concatenada para saquear os cofres públicos, Lula apelou para frases de efeito e ganhou as manchetes com uma em particular:
– Provem uma corrupção minha que irei a pé para ser preso, como as pessoas vão a pé até Aparecida para pagar pecados.
Leia mais:
"Provem corrupção minha e eu irei a pé à prisão", diz Lula
"Só ganha de mim no Brasil Jesus Cristo"; veja as frases
Planalto avalia que denúncia contra Lula deve enfraquecer protestos
Esse Lula bravateiro, que disse não estar preocupado com a denúncia e acenou com a candidatura a presidente em 2018, dividiu o palco com outro Lula, o homem abatido que ele, sem sucesso, tentou esconder. O Lula personagem desqualificou a denúncia dos procuradores, aproveitando-se dos furos que o Brasil discute desde a tarde de terça-feira. O Lula real chorou, dizendo-se injustiçado. A voz falhou em alguns momentos, mas ele convocou os militantes para irem às ruas em sua defesa, mostrou a camisa vermelha e beijou o símbolo do PT. E retirou-se estrategicamente, sem responder a perguntas dos jornalistas.
Em vez de entrevista, foi um discurso com ataques à mídia, aos procuradores e aos conservadores. Um pronunciamento em alguns momentos sem nexo, visto que Lula repetiu a cantilena de que está pagando por ter tirado milhares de brasileiros da miséria, por ter feito uma política internacional altiva, por ter feito o Brasil mudar de patamar aos olhos do mundo. Se assim fosse, Lula não teria sido reeleito. Ele conquistou o segundo mandato apesar do mensalão. Quatro anos depois, elegeu a estreante Dilma Rousseff presidente da República. Elite de faísca atrasada essa, que só resolveu punir Lula tanto tempo depois de ter promovido os avanços sociais de que, com razão, ele se orgulha.
No discurso, interrompido por aplausos de gargalhadas diante de algumas das suas tiradas, Lula esqueceu de reconhecer que a corrupção na Petrobras não é uma invenção da mídia. É verdade que não nasceu com o governo dele, mas as investigações (e as confissões dos delatores) já comprovaram que floresceu nos seus dois mandatos e não foi estancada no de Dilma, apesar de ela ter o crédito pela demissão de diretores corruptos.
Lula fez piada com a frase "eu não tenho prova, mas tenho convicção". que viralizou nas redes sociais como se tivesse sido dita por Deltan Dallagnol, quando na verdade foi a junção de duas expressões pronunciadas em diferentes momentos da apresentação da denúncia. A claque petista foi à loucura.