Senhor governador José Ivo Sartori, esta é uma carta aberta que, sem autorização da família, escrevo-lhe pelos filhos de Cristine Fonseca Fagundes. Esses dois órfãos são símbolo da violência que tomou conta do Rio Grande do Sul e nos transformou em reféns. Porto Alegre me dói nesta noite de agosto, ao ler a notícia de mais uma vida ceifada pela banalização do crime.
Não faz nem duas semanas, choramos a morte da jovem médica Graziela Müller Lerias, uma mulher que estudou para salvar vidas e foi morta por ladrões de carro. A Polícia Civil fez um trabalho rápido. Identificou e prendeu os assassinos da doutora Graziela e deu uma explicação singela para o fato de ter sido a escolhida dos ladrões nessa loteria às avessas: era mulher.
Os ladrões não escolheram Graziela pela marca do carro, um Citroen C-3. Abordaram-na por ser mulher. Graziela tinha 32 anos e estava com uma irmã. Cristine tinha 44 anos e foi ao colégio Dom Bosco, bairro Higienópolis, em um Honda Fit, buscar o filho. Com ela estava a filha adolescente, testemunha da tragédia que ficará gravada na memória feito tatuagem.
Graziela levou um tiro porque o carro estava com as portas trancadas. Cristine, porque, aparentemente, se atrapalhou na hora de tirar o cinto de segurança.
Leia mais
"Era uma batalhadora", diz irmão de mulher morta ao buscar filho em escola
RS tem maior crescimento de homicídios com arma do Sul e do Sudeste
Modelo de segurança no RS está falido
Governador Sartori, não é possível que o senhor se conforme com as estatísticas que apontam o aumento dos latrocínios e até se confunda, dizendo que diminuíram, porque o balanço dos últimos meses apontou redução no roubo de carros. A Lei dos Desmanches foi um avanço, a Operação Avante vem obtendo bons resultados, mas os homicídios e os assaltos a mão armada se multiplicam.
Não é possível que integrantes do seu governo acreditem que a sensação de insegurança seja provocada "pela mídia", que começa o dia falando dos crimes da noite. Faça alguma coisa, governador, para que outras mães possam continuar levando e buscando seus filhos na escola.
Porto Alegre hoje é um porto triste. Mas não é só a Capital. Pequenas cidades já não têm a presença da Brigada Militar. Estão jogadas à própria sorte. Se um crime ocorrer, terão de chamar a patrulha do município vizinho.
Quantas Grazielas, quantas Cristines, quantas Marias terão de morrer para que seu governo se convença de que o Estado vai mal nesta área? Não é por acaso que, nas pesquisas, a segurança figura entre as maiores preocupações dos eleitores das cidades pequenas, médias e grandes.
Senhores juízes, deputados, membros do Ministério Público. Pelos filhos de Cristine, unam-se para ver o que cada poder tem a oferecer para melhorar a segurança. Os senhores que recebem auxílio-moradia deR$ 4,5 mil e salário na faixa dos R$ 30 mil bem que poderiam abrir mão dessa benesse e doar o valor para um fundo destinado à construção de presídios. Os senhores sabem que a falência do sistema prisional está na origem da violência que transformou o Rio Grande do Sul num pedaço de Bagdá.