Para quem jura não ter contas no Exterior, o placar de 11 a zero na sessão do Supremo Tribunal Federal que o tornou réu em um segundo inquérito é o golpe de misericórdia na pretensão de Eduardo Cunha de retornar à Câmara dos Deputados. No mesmo dia, ele sofreu duas derrotas avassaladoras: além de abrir a segunda ação penal contra ele, desta vez pelo recebimento de propina em contas secretas na Suíça, o presidente afastado da Câmara fracassou na tentativa de impedir que sua mulher, Claudia Cruz, e a filha, Danielle, sejam julgadas em Curitiba pelo juiz Sergio Moro.
Neste segundo processo, Cunha responderá pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e falsidade ideológica com fins eleitorais. Além do risco de condenação, a unanimidade dos ministros em acatar a tese do procurador Rodrigo Janot, de que Cunha era dono das contas, do patrimônio e do dinheiro localizado na Suíça, enfraquece a defesa do deputado na Câmara. Os colegas julgam se ele feriu o decoro parlamentar quando disse, na CPI da Petrobras, que não tinha contas no Exterior.
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A explicação de que o dinheiro não era dele, mas de um truste, não conseguiu convencer nenhum dos ministros. Logo, será difícil que convença a maioria dos deputados que decidirão pela absolvição ou pela perda do mandato. Depois da derrota no Conselho de Ética, Cunha perdeu apoio e hoje é uma alma penada rondando o prédio do Congresso, onde está impedido de entrar por decisão judicial.
No julgamento do presidente afastado, o ministro Luís Roberto Barroso produziu uma síntese do que é o jogo de faz de conta na política brasileira, especialmente quando o assunto é financiamento de campanhas:
– Há um fenômeno estranho que acontece no Brasil, em que pessoas se surpreendem com aquilo que já sabiam. Ou alguém imaginava que os partidos disputavam a indicação de diretores de empresas estatais para fazerem coisa boa? Isso faz parte de uma rotina brasileira há muito tempo e o propósito era esse mesmo, de desviar recursos. É triste, mas a denúncia demonstra como isso funcionava de maneira cabal, penosa e dolorosa.
Com Eduardo Cunha praticamente fora de combate, as atenções se voltam para os delatores que detêm informações sobre o funcionamento da máquina de propina instalada na Odebrecht. Cálculos modestos indicam que Marcelo Odebrecht e executivos da empresa podem comprometer uma centena de políticos de diferentes partidos, incluindo a presidente afastada Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, por conta dos pagamentos feitos pela empresa ao marqueteiro João Santana, que cuidou das últimas três campanhas presidenciais do PT.
O esquema a que Barroso se refere não poupou nem o falecido Eduardo Campos. As investigações da Operação Turbulência concluíram que as campanhas dele receberam dinheiro de propina em 2010 e 2014 e que até o avião no qual morreu no acidente de 13 de agosto de 2014 fazia parte do esquema ilegal de financiamento de campanhas.