Das gravações de Sérgio Machado, feitas em março e divulgadas agora, a presidente afastada Dilma Rousseff sai relativamente preservada – dela, quase todos os personagens falam mal. Os diálogos mostram que Dilma se queimou porque não compactuou com a articulação que estava sendo montada "para salvar todo mundo", incluindo o ex-presidente Lula. Porque se recusou a renunciar ou a pedir uma licença (a alternativa suave) como sugeria a cúpula do PMDB, acabou afastada pelo impeachment.
As gravações mostram de onde saíam as especulações sobre a renúncia iminente ou a possibilidade de uma licença médica, incontáveis vezes desmentidas pelo ex-deputado Carlos Araújo, ex-marido de Dilma e uma das poucas pessoas em quem ela confia. A renúncia facilitaria a estratégia de "passar uma borracha no passado" e adotar com os investigados na Lava-Jato a lógica da anistia negociada nos estertores do regime militar.
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Num dos trechos, Renan diz:
– A melhor solução para ela é um acordo que a turma topa. Não com ela. A negociação é fazer o parlamentarismo e fazer o plebiscito, se o Supremo permitir, daqui a três anos.
Não está claro como "a turma" faria, nesse acordão, para isolar o juiz Sergio Moro, os aguerridos procuradores do Ministério Público Federal, os delegados da Polícia Federal e os agentes da Receita, que integram a força-tarefa da Lava-Jato. Os personagens das gravações apenas registram a necessidade de incluir os ministros do Supremo no pacto.
As gravações do ex-presidente da Transpetro são didáticas. Ele conduz a conversa, dá corda a seus interlocutores, fala mal do procurador Rodrigo Janot. E os faz confessarem o medo de que a Lava-Jato possa fazer ruir seus castelos.
Renan se incrimina menos do que Romero Jucá – talvez porque seja mais ladino, talvez porque Machado tenha dirigido a gravação de forma a não desgastar demais o padrinho político. Mesmo cauteloso, faz revelações. Confirma que era conselheiro de Dilma e do ex-presidente Lula. Dá as pistas de como nasceu o semiparlamentarismo e como funcionaria. Reforça a ideia de que Lula na Casa Civil seria um primeiro-ministro. Renan também entrega que Dilma procurou donos de veículos de comunicação (Globo e Folha) para reclamar da cobertura.
Na gravação do ex-presidente José Sarney, o trecho mais bombástico é também um dos mais óbvios. Ele diz que a delação premiada da Odebrecht é uma metralhadora calibre .100. Óbvio, porque a empreiteira sabe para quem doou e em que condições. Bombástico, porque seria a única com quem Dilma teria tratado diretamente de doações de campanha.
Com a homologação da delação premiada, o próximo passo será o levantamento do sigilo. Aí, se saberá se existem outros áudios (a informação extraoficial é de que são pelo menos quatro horas de gravação) e o que o delator registrou em cada um dos anexos que servem de roteiro para os investigadores. Machado, como todos os delatores, já mostrou que não têm escrúpulos.