A contabilidade de hoje diz que a oposição ainda não tem os 342 votos necessários para aprovar a abertura do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Senado. Isso significa que Dilma pode respirar aliviada? De jeito nenhum. É nesta reta final que a pressão aumenta e que cada detalhe pode ser decisivo para a aprovação do afastamento.
As delações premiadas do ex-presidente da Andrade Gutierrez Otávio Marques de Azevedo e de Flávio Barra, ex-executivo da empresa, homologadas ontem pelo ministro Teori Zavascki, adicionam novos ingredientes no caldeirão da crise. Azevedo disse que as doações da empresa para as campanhas de Dilma, em 2010 e 2014, foram feitas dentro da lei, mas eram dinheiro de propina.
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Ainda que o candidato não tenha como saber se o dinheiro é sujo ou limpo, ou que as doações para os adversários tenham saído do mesmo cofre, quem está no paredão é Dilma. O conteúdo das delações não integra o processo de impeachment, mas uma confissão de pagamento milionário de propina e de direcionamento de licitação na Usina de Belo Monte têm poder de influenciar os indecisos.
Para efeito legal, Dilma será julgada apenas e tão somente pelas pedaladas fiscais, que o relator Jovair Arantes (PTB-GO) considera crime de responsabilidade. Além do vazamento das delações, aliados do Planalto temem que seja desencadeada uma nova fase da Operação Lava-Jato.
Dilma também precisa se preocupar com detalhes que podem decidir o jogo.O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, confirmou que a votação será no dia 17 de abril, um domingo. A Câmara, que em geral só trabalha de terça a quinta-feira, tem feito sessões diárias, por orientação de Cunha, para acelerar o processo. Marcar a votação para um domingo tem por objetivo estimular as manifestações de rua e a concentração da torcida em torno do Congresso. Como os partidários do governo disputarão território com os manifestantes favoráveis ao impeachment, é real o risco de confronto.
Outro detalhe capaz de fazer diferença é a ordem em que os deputados serão chamados para votar. Questionado sobre como faria, Cunha disse que só vai anunciar as regras na hora da votação. Foi o que Ibsen Pinheiro fez em 1992, no impeachment de Fernando Collor. É o próprio Ibsen quem conta:
– Tomei uma decisão que não passaria no Judiciário, que é como se chamariam os deputados para votação. O regimento interno dizia que a votação nominal seria com base no mapa, de baixo pra cima, do Rio Grande do Sul até o Amapá, ou de cima para baixo. Quem queria derrubar o Collor queria votação de baixo pra cima, sairia ganhando. E o Collor e seus aliados queriam do Norte para o Sul. Eu decidi algo que só o secretário-geral ficou sabendo. E anunciei apenas na hora da votação que seria em ordem alfabética.
Desta vez, é provável que Cunha anuncie a votação por bancada, de Sul para Norte, já que a maior oposição a Dilma se concentra nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste.