Para não correr o risco de ver o processo de impeachment emperrar na Justiça, a comissão da Câmara decidiu que não aceitará adendos à proposta original. Isso significa que nem a delação premiada de Delcídio Amaral, nem as escutas telefônicas do ex-presidente Lula entrarão no relatório que será votado nos próximos dias. Oficialmente, Dilma será julgada apenas pelas manobras fiscais conhecidas por "pedaladas", o que em outra circunstância jamais seria motivo de cassação de um presidente eleito pelo voto popular.
Como o impeachment é um processo político e não jurídico, na prática, Dilma será julgada por "tudo o que está aí" e que leva multidões às ruas para protestar contra seu governo. Responderá pela crise econômica e suas consequências. Por todos os erros dos dois governos de Lula e do seu primeiro mandato. Por Pasadena. Pela corrupção histórica na Petrobras. Pelas mentiras e pelas doações da campanha eleitoral de 2014, que deveriam ser tratadas na Justiça Eleitoral. Pela articulação para garantir foro privilegiado a Lula. Pelas escutas que flagraram Lula dizendo palavrões. Pelo sítio de Atibaia e pelo triplex do Guarujá que a Polícia Federal considera patrimônio oculto de Lula. Sim, a Câmara vai fazer um julgamento retroativo de Lula e aplicar a pena em Dilma, que, afinal, é criação dele.
As pedaladas são o pretexto legal para embasar juridicamente o pedido de impeachment. Há juristas de renome que consideram as manobras fiscais crime de responsabilidade clássico, passível de perda de mandato. Há juristas igualmente respeitados que discordam e lembram que Dilma não inaugurou as pedaladas e consideram golpismo afastar a presidente só porque o governo é muito ruim.
Se o requerimento em discussão é inconsistente, a Ordem dos Advogados do Brasil, que aprovou uma moção de apoio à investigação, poderia apresentar outro, com todos os fatos novos surgidos depois da aceitação do pedido dos juristas Miguel Reale Jr., Helio Bicudo e Janaína Paschoal. Mas os adversários do governo têm pressa e não querem recomeçar do zero e perder o impulso das manifestações de rua.